Terça-feira, 20 de Janeiro de 2015

Vida corrida- a última corrida - parte 2

pega.jpg

Largada: o 10 é Gian Calabrese; eu sou o 14; o Leandro Panadés é o 21

 

Se você não leu a primeira parte da série "Vida Corrida", primeiro clique aqui, senão não vai entender nada...

 

With a little help from my friends

A doença da gasolina entrou nas minhas veias muito cedo. Para ser sincero acho que já nasci com ela. A primeira paixão foi por carros. Começou pelas miniaturas Matchbox, depois autorama até que meu pai comprou o primeiro carro da família, um Gordini II, em 1966. Naquela época carro era um luxo e eu fiquei alucinado quando vi aquela coisa linda entrando na garagem no bairro do Brooklin.Foi amor à primeira vista.

No dia seguinte de manhã minha mãe foi me acordar e eu não estava na cama. Ela procurou pela casa toda e quando já estava se desesperando ouviu meu pai gritar da garagem:

- Por que esse menino está dormindo dentro do carro?

O menino era eu e lembro de ter acordado de madrugada, passado a mão no cobertor e me enfiado no banco de trás do Gordini para dormir sentindo o cheirinho de carro novo. Para a gerações mais novas isso parece loucura, porque já nasceram praticamente dentro de um carro, mas naqueles anos 60 carro era adoração para a criançada.

Logo em seguida meu irmão mais velho comprou a primeira revista Quatro Rodas da minha vida e então descobri uma nova paixão: corridas! Antes mesmo de o Emerson chegar à Fórmula 1 eu já sabia tudo. Desenhava Porsche, Ferrari e Alfa-Romeo no meu caderno de escola. Sabia a vida do Jackie Stewart e Graham Hill de cor. Mas a glória foi assistir a primeira corrida de carro ao vivo. Quando escutei os carros passando pela reta de Interlagos tinha decidido, aos 8 anos de idade, que eu seria piloto de corrida. Nem sabia como, mas eu precisava daquilo da mesma forma que precisamos de oxigênio. Nunca, nem nos meus sonhos mais infantis, poderia imaginar chegar à última etapa de um campeonato brasileiro de motovelocidade em primeiro lugar, naquele mesmo Interlagos que tremi ao ver pela primeira vez, 30 anos antes.

A decisão de parar de correr já estava tomada desde a metade da temporada de 1999. Não esperava que seria o líder da categoria, por isso teria de ir até o fim, afinal não é sempre que se disputa um título, com quase 40 anos e uma experiência bem tosca como piloto.

Frente aos meus concorrentes minhas dificuldades eram de todo tipo: começando física, porque apesar de ter sido adotado por uma dos melhores fisiologistas do Brasil, o José Rubens D'Elia e chegar a 11% de gordura, meus adversários era bem mais jovens, resistentes e elásticos.

Além disso, como jornalista e editor eu só conseguia treinar no sábado, véspera da corrida. Dois treinos de meia hora para acertar a moto, desvendar a pista e deixar tudo certo para a largada.

Para essa última etapa todos estavam surpresos em me ver liderando o Brasileiro e aconteceu algo mágico: surgiram ajudas de todos os lados. A começar pela Honda, na figura do Wilson Yasuda, que me ligou dizendo:

- Passa lá na oficina amanhã e pega um motor reserva, já está na caixa te esperando!

Em mais de 22 anos como piloto eu jamais tive um motor reserva. Isso foi incrível! Me senti um piloto de ponta, desses com patrocínios milionários, afinal eu tinha um motor reserva!

Moto_Interlagos_1999.jpg

 Moto de 125cc, motor dois tempos de 50 CV, 60 kg e muito difícil de pilotar, exigia muito treino

Depois outra ligação surpresa, dessa vez do Aurélio, tio do Alexandre Barros, um dos caras que mais entende de corrida de qualquer coisa motorizada que já conheci na vida. Ele simplesmente disse:

- Se você não treinar durante a semana vai levar um pau! Tem muito piloto que vai fazer só essa etapa, eles vão te atrapalhar. Vamos treinar, eu cuido de você!

Mal pude acreditar, eu teria um dos melhores coaches do mercado e sem precisar pagar! Combinamos de treinar no meio da semana, dia de treino livre, quando correm todas as motos juntas e misturadas. Era um tal de moto 1000cc quatro tempos me passando que nem um míssil e depois eu passando os caras todos no miolo que nem uma barata nervosa.

O Aurélio foi o primeiro cara que vi dividir a pista em trechos, cronometrar e montar a volta ideal. Funciona assim: divide-se a pista em três ou quatro partes. O piloto dá algumas voltas, o treinador pega os melhores tempos de cada trecho e monta o que seria uma volta perfeita. Os bons pilotos conseguem a volta real a apenas um ou dois décimos de segundo do que seria a volta ideal. Eu estava quase um segundo mais lento do que a minha volta ideal, uma eternidade...

pega_Interlagos.jpg

Vaaaaaai: no primeiro ano na ctageoria, em 1997, eu nem conseguia me entender com a moto

Pacientemente o Aurélio sentou comigo e analisou curva a curva de Interlagos, falando onde eu deveria frear, soltar o freio, acelerar, deitar a moto, levantar etc etc e mais etc.

Voltei pra pista e meu tempo ficou a menos de um décimo de segundo da volta ideal. Neste dia eu baixei meu tempo de volta em quase dois segundos, o que é uma eternidade em se tratando de uma moto tão competitiva. Se a tomada de tempo fosse naquela tarde eu largaria na primeira fila!

Mas não foi. A tomada de tempo foi no sábado e algo muito ruim aconteceu logo no primeiro treino livre.

publicado por motite às 14:43
link | comentar | favorito

.mais sobre mim


. ver perfil

. seguir perfil

. 14 seguidores

.Procura aqui

.Maio 2023

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

.Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

.posts recentes

. Muito além do portão

. Rita Lee e eu!

. Curso Abtrans de pilotage...

. Yamaha DT 180 a água? Iss...

. O que é aventura pra você...

. O bom ficou melhor: nova ...

. Troca-troca: A Harley da ...

. De Manaus para o mundo

. Gordura boa: Como é passe...

. Outros 500: como são as n...

.arquivos

. Maio 2023

. Janeiro 2023

. Novembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Julho 2019

. Junho 2019

. Março 2019

. Junho 2018

. Abril 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Março 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds