Moto com visual clássico, mas mecânica moderna: assim é a Triumph Bonneville
Uma moto que já nasceu clássica e que tem uma legião de fãs pelo mundo
Lembro claramente da primeira Triumph clássica que chegou no Brasil. Foi em 1997, quando o representante José de Holanda Cavalcante trouxe a Thunderbird 900, feita a partir do motor da Trident, com três cilindros em linha e alimentada por três carburadores. Logo de cara percebi que era o tipo de moto que já nasceu clássica, com o visual semelhante às motos dos anos 1960 da marca inglesa. A partir dela surgiu ainda a Adventure e a America, com a mesma base mecânica. Gostei logo de cara, foi amor à primeira vista.
Imediatamente elas fizeram muito sucesso e mostrou que o caminho para novos modelos vintage já estava aberto. Porém os mais fiéis ao estilo clássico não curtiram a suspensão traseira monoamortecida nem o enorme radiador. Para eles o ideal seria preservar o máximo possível o estilo clássico.
Um raro modelo Adventure com motor de três cilindros em linha. (Triumph UK)
Foi assim que a Triumph surpreendeu mais uma vez ao apresentar no Salão de Munique, em setembro de 2000, a primeira Bonneville já com o visual que a consagrou no mundo todo. Ela veio com rodas raiadas, suspensão traseira com dois amortecedores, motor de dois cilindros paralelos, de 780cc, arrefecido a ar+óleo (com um discreto radiador escondido), alimentado por dois carburadores e potência de 60 CV.
Foi um sucesso imediato! Pura inspiração para toda uma geração que veio depois, mas que marcou tanto a ponto de nunca mais sair de linha, mesmo com a chegada de novas e sofisticadas versões. O nome Bonneville foi usado pela primeira vez pela Triumph em 1959 e resgatado já na nova fase industrial em 2000.
Esta versão Thunderbird de três cilindros veio pro Brasil, mas só vi uma até hoje! (Triumph UK)
São tantas versões e modelos sob a definição Bonneville que seria impossível descrever todos, porque a partir dela vieram a Thruxton, que é uma versão mais “café-racer”; a Scrambler, uma versão de uso misto on-off road e a Bobber, estilo ainda mais clássico. E tem várias subdivisões como SpeedMaster, Land Speed, Spirit, Newchurch, Union Flag, Naked Lady, Multistripe, Multichequer, Slogan-Paisley, Chequer, Multiswirl, Multi-Roundel, Chevron-Paisley, Live Fast e por aí vai. O cara mais criativo da marca nessa época era quem bolava os nomes!
O curioso da Bonneville é que a partir de 2007/08 ela recebeu injeção eletrônica (ainda se encontram algumas carburadas no Brasil), mas o corpo de injeção é uma cópia fiel de um carburador, com todos os parafusos, cuba, diafragma, tudo falso! Eu mesmo tive de ajoelhar ao lado do falso carburador para escutar o ruído do bico injetor porque não acreditei naquela ilusão. As primeiras Bonneville injetadas da nova era são tão bem disfarçadas que têm afogador e regulagem de marcha lenta, algo que não se vê mais em motores injetados. Mas são injetadas mesmo!
Mais recentemente, vieram as novas gerações Street Twin, Street Cup, na era totalmente eletrônica, com freios ABS e controle de tração, além de motor arrefecido a líquido. Já não trazem mais o "falso" carburador, nem afogador e muito menos regulagem de marcha lenta. E finalmente, a partir de 2018 as versões com motores de 1.200cc.
Esta é a vovó de todas: a primeira Bonneville de 1959. (Triumph UK)
Bonne é Bom
Vou concentrar na Bonneville mais tradicional, nas versões que vieram para o Brasil, a SE e a T100, esta última a mais comum. O modelo SE surgiu para atender o mercado americano, por isso as rodas de liga leve com a dianteira de 17 polegadas, para permitir o uso de pneus radiais sem câmera. Ela permaneceu em linha de 2007 a 2013, mas a importação para o Brasil encerrou em 2008. Portanto temos poucos e raros modelos no Brasil, inclusive o meu!
O pneu pra Bonneville você encontra clicando na foto aí de cima!
O painel é simples, apenas com velocímetro (em milhas) e luzes de advertência. Uma delas, do nível de gasolina, é o calcanhar de Aquiles desse modelo, porque raramente funciona. Já existem mecânicos e eletricistas que conseguem resolver isso, porque é uma pecinha ridícula que vai dentro do tanque de gasolina e não resiste à nossa mistura de alcoolina. Eu consegui resolver isso num especialista bem no meio das “bocas” de São Paulo, o Rochinha, da Velo Rocha. Além de resolver essa doença crônica, ainda alterou os hodômetros de milhas para quilômetros.
Minha Street Twin ganhou até um skate pra combinar, mas teve de ir embora... Envelopada na Second Skin (Tite)
Ela tem o mesmo tanque de gasolina da T100, com capacidade de 16,6 litros, o banco é em dois níveis e os escapamentos são em forma de funil, como nas Street Twin.
A minha escolha pela Bonneville não foi baseada em paixão, mas na razão. Depois de ser vítima de assalto à mão armada CINCO vezes, sendo as duas últimas com requintes de violência, decidi desistir de algumas opções enquanto morar em São Paulo. Qualquer coisa com logotipo BMW é um alvo potencial. Todas as bigtrails (justamente o meu estilo preferido), desde as mais simples até as gigantescas. Motos esportivas (que eu jamais teria pra usar na cidade) também são chave de cadeia. Qualquer moto moderna com motor quatro cilindros (principalmente se tiver escape 4-em-1). As nakeds modernas como Ducati Monster, Kawasaki Z750 ou Z900, Honda CB 1000R, etc.
Restaram as clássicas ou as “diferentonas” como a Ducati Scrambler. Mas eu tenho algumas exigências pessoais: JAMAIS pneu com câmera, passei metade da minha vida desmontando roda no meio do nada, debaixo de chuva; pneu radial, porque é mais seguro; confortável para garupa e que não custasse um rim. Foi então que pesquisando no site moto.com.br achei essa Bonneville SE, com roda de 17”, pneu sem câmera e com apenas 10.000 milhas rodadas. Fechei na hora, mas tinha alguns problemas (por falta de uso e excesso de lavagem) que estou resolvendo aos poucos.
Minha atual Bonneville SE adesivada pela Second Skin Envelopamento; pneus Metzeler radiais sem câmera. (Tite)
A autêntica T100 (e todas as suas versões) surgiu pela primeira vez em 2002, com poucas e importantes diferenças em relação à SE. As tampas laterais do motor são polidas ou cromadas, os escapamentos são mais longos e em forma de tubo. O logotipo do tanque é de metal, com pads de borracha no tanque e o painel tem conta-giros. A diferença mais importante são as rodas raiadas e o aro dianteiro de 19 polegadas que a deixa um pouco mais alta. São dezenas de versões (nem todas vieram para o Brasil), com bancos mais finos e retos, todo tipo de grafismo (inclusive com banco amarelo!!!) até chegarmos na T 100 Black.
Basicamente a T100 manteve a mesma mecânica até os dias de hoje, quando recebeu o mesmo motor arrefecido a líquido da Street Twin.
As versões T100, Scrambler e Thruxton das primeiras Bonneville “a ar” utilizam o mesmo motor, mas com pequenas alterações na defasagem dos pistões e na taxa de compressão que dá uma diferença na potência. Enquanto a T100 tem 66,1 CV a 7.500 RPM, a Thruxton tem 68,1 a 7.400 e a Scrambler tem 58,5 s 6.800 RPM para a mesma cubicagem de 865cc.
Aí você compra uma jaqueta de couro igual do David Backham e descobre que ficou pequena! Sem problema, clica na foto que tem como ajustar.
Como são?
Entre as Bonneville a base é a mesma, só a SE tem as pedaleiras um pouco mais recuadas. As demais tem posição de pilotagem muito clássica, com as pernas pouco dobradas e guidão alto e largo. O motor tem como principal característica o torque já em baixas rotações e câmbio de cinco marchas. Roda com conforto tanto na cidade quanto na estrada. Na cidade o motor transmite um pouco de calor para as pernas do piloto, mas nada como na Scrambler, que atinge todo o lado direito e quase cozinha nossos ovos!
Não é um primor de estabilidade nas curvas, mesmo com os amortecedores traseiros na posição mais “dura”. O garfo dianteiro exige manutenção frequente porque é barulhento no retorno do curso. O óleo das bengalas deve ser trocado pelo menos a cada 20.000 km, ou em dois anos, o que completar primeiro. Esse é outro ponto fraco desses modelos. Na Street Twin isso foi corrigido. As suspensões são firmes e quem busca conforto de rodagem a melhor opção é a Scrambler.
Uma autêntica Bonneville da era de ouro. (Tite)
Também não espere um motor super econômico. Na melhor das hipóteses faz 20 km/litro se tiver tudo bem regulado e controlar o acelerador (o que é bom para uma moto de quase 900cc). As gerações mais novas são mais econômicas. Pra quem gosta de esportividade, a velocidade máxima fica na casa de 180 km/h.
Eu costumo brincar que a Bonneville é uma Honda CB 400 vitaminada, porque até o ronco do escapamento lembra a moto japonesa. E como toda clássica que se preze ela é feita para ser customizada. Saiba que isso não tem fim!
Na minha eu adesivei porque era muito branca. Colei os pads de borracha nas laterais do tanque e instalei um belo para-brisa original da Triumph. Agora falta os escapamentos, mata-cachorro e, talvez, um bagageiro. Na verdade não gosto de bagageiro, mas é muito útil.
Bonneville T100 Black atual. Continua com mesmo visual clássico. (Triumph)
Algumas coisas nesta clássica irritam os usuários acostumados com as motos japonesas modernas, como a ignição colocada na lateral, ao lado do farol, e a trava do guidão na coluna de direção. Tudo isso foi “corrigido” na Street Twin, que considero a melhor das versões.
O que observar?
A exemplo de outras clássicas, como Harley-Davidson, muitos donos de Bonneville rodam pouco e as usam basicamente na estrada. É possível achar motos com mais de 10 anos de uso com baixa quilometragem.
Os pontos a serem observados são: a tal luz indicadora de reserva da gasolina (quase impossível achar uma que esteja funcionando). Vazamento de óleo: os mais frequentes são no estator, no retentor do pinhão e no regulador do tensor da corrente de comando, este último o mais difícil de consertar.
Também verifique os rolamentos da caixa de direção, porque motos que rodam nas vias esburacadas costumar ficar com “calo” nos rolamentos.
E todas as borrachas. Porque muita gente ainda lava a moto com querosene. Isso destrói todas as borrachas e guarnições. Normalmente tem de substituir a maioria.
Os preços
Um modelo com tantas variações e no mercado há tanto tempo pode ter valores bem variáveis. Na versão SE – se alguém encontrar – fica em torno de R$ 21.000 (ela só foi importada até 2008). Na versão T100 os valores variam de R$ 22.500 a R$ 35.000. A Street Twin começa a partir R$ 28.500. E a Scrambler é a mais valorizada de todas com preços a partir de R$ 35.000.
O bom desses modelos é o baixíssimo índice de roubo, o que derruba as cotações de seguro. Não tem uma liquidez tão grande e o número de ofertas de usadas é muito grande.
É uma moto que atende perfeitamente quem busca um modelo de alta cilindrada, mesmo sendo um motociclista iniciante porque é muito fácil e pilotar. Especialmente para as mulheres, porque ela tem apenas 775 mm do banco ao solo e não é tão pesada (205 kg). Também leva passageiro na garupa com conforto e permite instalação de bagageiro e bolsas laterais.
Não chega ser a pilotagem mais emocionante. Lembra muito as motos dos anos 1970, com mais conforto e freios bem melhores. Costumo brincar que em termos de emoção é quase como ir no baile e dançar com a irmã. Mas é um produto versátil que agrada todas as gerações de motociclistas.
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Ficha Técnica
Motor: Dois cilindros paralelos, DOHC e refrigeração a ar+ óleo, 865 cm³
Câmbio: cinco velocidades
Potência máxima: de 58 a 68 cv
Torque máximo 6,9 kgf.m
Suspensão dianteira Garfo telescópico 120 mm de curso
Suspensão traseira: com dois amortecedores, 106 mm de curso
Freio dianteiro a disco
Freio traseiro a disco simples
Pneu dianteiro 100/90 – 19 (pode ter modelos com aro 18 e 17”)
Pneu traseiro 130/80 - 17
Comprimento total 2.230 mm
Largura total 740 mm
Entre-eixos 1.500 mm
Altura do assento 775 mm
Peso (seco) 205 kg
Tanque de combustível 16,6 l
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
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