
Pense num professor bunitinho... (Foto: Claudinei Cordiolli)
Mais uma vez venho aos meus leitores informar que meu trabalho continua reconhecido, inclusive pelos colegas da área. No começo do ano recebi uma solicitação da Jornalista Heloisa Valente para um rápido perfil na publicação Jornalista & Cia, voltado aos profissionais da área. É um veículo virtual, desenvolvido e enviado em PDF aos jornalistas, especialmente do setor de carros, motos, caminhões etc.
E mais uma vez, agradeço as empresas que me apoiaram em 2010 e lembro aquelas que ainda não pensaram a respeito (tem decisões que levam meses mesmo...) que elas continuam perdendo os retornos espontâneos que obtive até o momento.
A entrevista abaixo foi publicada na primeira semana de janeiro, com estas fotos que aparecem aqui.

Durante o curso de reciclagem para jornalistas (Foto:Caio Mattos)
Um carro inesquecível
O primeiro zero km a gente nunca esquece e foi um Ford Belina II de 1978. Com ele eu viajei muito para correr de kart no interior de SP.
Um momento automotivo que marcou sua vida
Foi minha corrida em Interlagos, com um VW Gol 1.6 que surrupiei da minha mãe sem ela saber, preparei e fui correr uma prova de Aspirantes do falecido jornalista Expedito Marazzi. Cheguei em quarto lugar e fiquei louco de felicidade.
Onde iniciou suas atividades nessa área?
Eu virei jornalista por mero acaso. Tinha 17 anos e corria de kart em Interlagos. Um dia conheci o jornalista Wagner Gonzalez (que trabalhava no Estado de São Paulo) e comecei a me interessar por jornalismo esportivo. Depois ganhei um equipamento fotográfico e fiz fotos do GP Brasil de F-1 em 1978. Mostrei para o Reginaldo Leme que me contratou para ser fotógrafo dele no jornal de automobilismo chamado AutoMotor. Hoje tenho a honra de voltar a trabalhar com o Reginaldo para editar o anuário AutoMotor Esporte.
Em 1981 o editor da Revista Duas Rodas pediu uma matéria e acabei contratado até ser editor da revista por 6 anos. Fui editor de quase todas as revistas de motos do Brasil e algumas de carro também. São 25 anos escrevendo sobre carros, motos e corridas...
O que mais o impressiona na imprensa automotiva?
Hoje em dia eu diria que é a nova geração, que está mais interessada na informação e menos no festival de jabás que as montadoras oferecem. Os jornalistas mais velhos ainda são muito deslumbrados com mimos como viagens internacionais, hospedagens em resorts, presentinhos e carros novos disponíveis quando precisam. Os mais jovens chegaram com outra cabeça graças a nova velocidade de processamento da notícia trazida pela Internet.
Um profissional da imprensa automotiva para homenagear o segmento
Tem dois, na verdade, que são meus exemplos de profissionais: Fernando Calmom e Bob Sharp; eles sempre souberam conduzir a carreira independente de forma brilhante.
Livro de cabeceira
Putz, o meu claro: "O Mundo É Uma Roda", que lancei em 2006 e já estou preparando o segundo volume!

(Meu livro de cabeceira...)
Time de coração
Não sou muito ligado em futebol, mas admito que fico feliz quando o Corinthians ganha do Palmeiras!
O que mais gosta de fazer nos momentos de descanso?
Nada! kkk, na verdade não tem sobrado muito tempo pra descanso porque tenho um curso de pilotagem de motos (SpeedMaster) que ocupa 24 horas por dia do meu tempo. Para me dedicar ao curso já tentei abandonar o jornalismo duas vezes, mas o problema é o que o jornalismo não me abandona! Neste momento escrevo para vários sites e revistas como free-lancer. Não tenho tempo livre...
Algum hobby especial?
Sim, sou escalador, montanhista e me dedico boa parte dos finais de semana a subir montanhas!

Nas horas de folga eu subo pelas paredes (foto: Andre Berezoski)
Tipo de música que mais aprecia
Rock, sempre! Deixo meu computador sintonizado numa rádio romena que tem excelente playlist (www.radio3net.ro) tem zilhões de opções de rock.
Na televisão, qual programa predileto?
Telejornais e... corridas! Sou viciado no canal Speed
Quais os jornais e revistas de que mais gosta?
Há muito tempo abandonei os jornais por um site chamado Today's Front Page, de onde se pode acessar os principais jornais do mundo (versão digitalizada). As revistas que mais leio são do setor: Revista Motociclismo, a nova Rider's, mas recebo via internet revista Cycle World e Climbing (de escalada)

Durante um dia duro de trabalho (Foto: Café)
Um sonho por realizar
Conseguir patrocínio para fazer o meu curso de pilotagem crescer em nível nacional. Hoje tenho apoio da Honda, Pirelli e SBK, mas ainda falta uma injeção grande de verba para decolar.

(Passados 22 anos o trânsito só piorou! Foto: Luna Bartlewski)
Em março de 2008 a água bateu na minha bunda! Descobri que o jornalismo especializado não poderia mais me sustentar. Parte em função de uma safra de novos profissionais da área, que provocou a natural queda na remuneração da mão de obra – a velha lei da oferta & procura -, parte pela insaciável sede de lucro das empresas de comunicação que não têm o menor escrúpulo na hora de decidir entre manter um bom profissional ou contratar dois novos formandos pela metade do salário.
Surgiu então a oportunidade de editar uma revista de interesse geral, com uma remuneração digna, em uma empresa de grande porte. Talvez eu tenha me precipitado em fazer um desabafo contra o jornalismo especializado, mas foi resultado de 27 anos de um grande nó entalado na garganta. Ou mesmo pelos inúmeros projetos que tentei realizar junto às empresas e associações do setor. Todos solenemente recusados, ignorados ou rechaçados.
Bom, como você viu, a minha participação na nova revista teve vida curta. Não vou entrar em detalhes desta frustrada operação (ainda), mas aqui estou de volta ao mundo das motos (de onde não devia ter saído).
Neste rápido entra-sai alguns leitores se manifestaram em vários fóruns, especialmente no Orkut. Fiquei tão surpreso quanto assustado ao ver meu nome citado por todo este Brasil (e até no Exterior). A cada vez que digitava meu nome no Google achava um novo debate sobre minhas decisões. Alguns leitores fizeram defesas tão acaloradas da minha história como jornalista que não foram poucas as vezes que me emocionei às lágrimas, sozinho, no meu escritório-casa imaginando que são estes desconhecidos que me defendem como se fossem mais irmão. Outros me chutaram de um jeito avassalador, com ofensas que nem imaginei que existiam!
Várias vezes eu quis entrar nestes fóruns para agradecer e/ou me defender, mas achei melhor ficar quieto porque o tempo é o melhor juiz. Não acredito no julgamento dos homens (atualmente nem me interessa), mas ficou aquela sensação de “Mas quem são esses caras que me criticam? Conhecem meu trabalho? Desde quando?”. A maioria dos meus leitores só me conhece da fase pós-Motonline, que qualifico como a minha melhor fase profissional pela liberdade que o Harada sempre me deu ao escrever, às vezes até contrário à opinião dele e do Durval.
Poucos conhecem o meu trabalho desde os primórdios do jornalismo especializado. Inclusive os empresários que negaram apoio aos meus projetos. Por isso, hoje, sexta-feira chuvosa, achei e decidi publicar um artigo que escrevi em julho de 1986. Foi escrito 22 (VINTE E DOIS) anos atrás. Época que o motociclismo era embrionário no Brasil. Meu primeiro artigo sobre motociclismo foi publicado em 1981 (ainda vou achá-lo). Gostaria que você olhasse esse artigo, que escrevi sem entrevistar ninguém, apenas com base na MINHA experiência de motociclista e me ajudasse a entender como alguém que contribuiu com o mercado, com os motociclistas, com a imprensa e com as empresas não consegue ter UM patrocínio para continuar este trabalho? Se alguém tiver uma teoria a respeito, aceito de coração!
Boa leitura!
Moto:solução no trânsito*
Com o tráfego parado nada melhor do que uma moto. Porém, pilotada com segurança
Numa típica avenida de grande movimento, os automóveis disputam cada centímetro de asfalto na intenção de chegar mais rápido ao seu destino. Alguns ônibus e caminhões ajudam a complicar mais a situação, trafegando fora da faixa destinada a estes veículos. No meio deste caos, um ponto luminoso ziguezagueia entre os carros. Olhando mais de perto, o ponto luminoso se revela o farol de uma moto, driblando o trânsito com tranqüilidade e rapidez.
Mas tranqüilidade em cima de uma moto, no meio do trânsito, depende da forma como o motociclista trafega. O trânsito pesado das grandes cidades guarda perigosas armadilhas onde um motociclista inexperiente pode cair. Quanto mais intenso e longo for o trânsito, maior será a tensão nervosa dos motoristas, que podem cometer pequenos deslizes na condução do automóvel, ônibus ou caminhão.
O motociclista deve ter em mente que existem dois tipos de segurança: a passiva, que recomenda o uso dos equipamentos de segurança (capacete, luvas e botas), e a segurança ativa, que significa uma pilotagem sem erros, obedecendo a sinalização e respeitando os outros veículos e pedestres. Segundo dados levantados pelas fábricas, a segurança ativa é mais importante para o motociclista, uma vez que quem não cai nem bate, não precisa dos equipamentos de segurança. Mas quem é tão sortudo assim que nunca vai encontrar um motorista abrindo a porta inesperadamente no meio do trânsito para ver se o pneu furou.
No meio do Inferno
Muita gente acredita que os motociclistas são privilegiados por se embrenharem no trânsito e sair com mais facilidade, sem sofrer a pressão psicológica que os motoristas sofrem. Mas isto é um engano. Rodar no trânsito com a moto requer uma concentração total, e até mais do que isso, é preciso desenvolver aquele sexto sentido que percebe à distância quando aquele carro 1966 com oito pessoas dentro vai mudar de faixa sem dar o menor sinal.
Este sexto-sentido se obtém com a prática do uso diário da moto. No trânsito parado, por exemplo, forma-se um corredor entre os automóveis que representa uma verdadeira "avenida" para uma moto. Mas no meio desta avenida pode aparecer um pedestre que atravessa por trás de um caminhão ou ônibus, sem estar no campo de visão do motociclista. Aí os dois levam o maior susto, que pode ser muito maior na proporção direta da velocidade em que a moto está e da sua capacidade de frenagem.
Neste corredor existem outras surpresas, como uma antena virada para o lado sem que o motorista perceba e que pode acertar o motociclista. Os espelhos retrovisores dos automóveis estão cada vez mais retro e mais visores. Além da dimensão maior, eles estão nos dois lados dos carros, o que torna um martírio para os proprietários de motos de rua, ou street, desviar daqueles imensos espelhos. Felizes são os proprietários de moto trail, que pela maior altura do guidão podem passar pelos espelhos sem problemas, pelo menos até encontrarem uma perua Kombi pela frente. Para os treieiros a atenção deve ser com largura do guidão, que costuma tocar na carroceria dos caminhões.
Outra observação para rodar no trânsito pesado é com relação ao garupa. Por estar com uma pessoa a mais, a moto às vezes não corresponde ao movimento do piloto, sem falar que o que está sentado atrás fica com os joelhos mais para fora e isto é uma coisa que poucos motociclistas lembram, o que pode custar uma batida na carroceria de algum carro e o fim de uma longa amizade .
No meio do trânsito
De repente o trânsito começa a fluir. Conseguiram empurrar uma betoneira que tinha morrido no meio de um cruzamento e se recusava a pegar. Os carros começam a andar com mais velocidade, mas a avenida continua cheia. Nesta situação os corredores entre os carros já não são uma boa forma de economizar tempo. É chegada a hora da moto ocupar o mesmo espaço de um automóvel no trânsito. O melhor lugar para se posicionar é
no meio da faixa, ocupando o mesmo espaço de um carro, sempre se colocando de forma a ser visto pelos motoristas. O farol aceso, mesmo durante o dia, ajuda bastante na tarefa de ser visto. Os motoristas, fechados em seus automóveis, têm muitos pontos mortos de visão, como as colunas do teto, que escondem completamente uma motocicleta. Daí a importância de rodar sempre atrás e no meio do automóvel.
Nas ultrapassagens o motociclista terá que reduzir a velocidade de aproximação, principalmente porque a moto geralmente está mais veloz que o carro; ultrapassar tendo o cuidado de sinalizar com o pisca e voltar para faixa quando já for possível ver o carro ultrapassado pelo espelho. E importante lembrar que às vezes o motociclista está rodando a horas numa velocidade acima da dos automóveis e a reação do motociclista é mais ágil. Enquanto no automóvel, o motorista está trafegando há muito tempo em baixa velocidade e tende a ser mais lento nas reações. Por exemplo, quando o motorista vai mudar de faixa, geralmente se acostuma com os veículos que estão rodando ao seu lado e esquece de sinalizar, ou olhar pelo espelho retrovisor para ver se entre ele e o carro ao lado está vindo uma motocicleta. Isto é uma tendência natural que até alguns motociclistas quando estão dirigindo carro cometem.
Moto X moto
Outra armadilha que o trânsito pesado esconde são os objetos arremessados das janelas dos carros e ônibus. O pior deles é a ponta de cigarro, que pode desgraçadamente entrar pela abertura do casaco e ficar queimando lentamente o motociclista. Neste momento é preciso ter sangue frio (literalmente) suficiente para encostar a moto no primeiro canteiro ou calçada, sem se desesperar, para finalmente proporcionar um espetáculo de strip-tease aos pedestres até encontrar a ponta de cigarro. Outra surpresa é a lata de refrigerante ou cerveja que pode voar pela janela de um caminhão ou ônibus de torcida de futebol numa quarta-feira à noite. Aí aparece mais uma grande utilização do capacete: escudar a cólera dos torcedores.
Uma conseqüência infeliz do excesso de trânsito nas cidades é a desumanização de alguns motociclistas. Tem gente por aí que não respeita nem aos próprios colegas, costurando no meio dos carros sem lembrar que existem outras motos costurando também. Neste emaranhado de corte-costura é comum ver um motociclista sendo surpreendido por outro saindo por trás de uma Kombi. Primeiro aparece a roda dianteira, depois vem o resto. Como conseqüência, dois pares de olhos arregalados e a lição de que os motociclistas também precisam olhar pelos espelhos e sinalizar em qualquer manobra no trânsito.
Pesquisas realizadas pelas fábricas revelaram um número impressionante de atropelamentos provocados por motociclistas em cima da calçada. Um pouco de respeito com os pedestres não faz mal, principalmente com aqueles que estão saindo sonolentos de suas casas para pegar um ônibus e acabam sendo pegos por uma moto. Já pensaram, naquela senhora saindo da pizzaria carregando uma calabresa e uma mussarela e sofre uma colisão de uma Montesa 360 H6. Os bombeiros vão precisar gastar algumas horas para distinguir o que é motociclista à mussarela do que é Montesa à calabresa.
* O texto foi mantido na sua forma original – publicado originalmente na revista Duas Rodas/agosto de 1986