Terça-feira, 27 de Julho de 2010

Marmelada so sugo

Tudo começou aqui...

 

Não sei o que me deixou mais indignado: se a manobra da Ferrari para Fernando Alonso vencer o GP da Alemanha de 2010 ou a reação dos meus colegas jornalistas. Os brasileiros, claro, porque os jornalistas espanhóis e italianos se fregaram niente pelo episódio. Fiz questão de olhar a capa dos principais jornais europeus na segunda-feira por meio daquele ótimo site Today’s Front Page. Lá na Espanha campeão mundial de futebol,a principal notícia foi a vitória de um ciclista espanhol na Tour de France, espécie de Copa do Mundo de ciclismo. Nos jornais italianos a única observação triste foi a multa de US$ 100.000 imposta à “rossa”. Ou seja, a choradeira foi brasileira mesmo, como se nunca na história deste País um brasileiro não tivesse sido beneficiado por jogo de equipe!

 

Acompanho F1 desde antes do Emerson Fittipaldi. Mas naquela época as notícias vinham com três meses de atraso por meio das revistas Quatro Rodas e Auto Esporte. Lembro que os meus desenhos de F1 na infância eram dos carros de Jochen Rindt ou Jackie Stewart. Quando o Emerson ganhou da primeira corrida de F1 em 1970 a notícia foi muito discreta em alguns jornais.

 

Em 1977 comecei a trabalhar meio sem querer como fotógrafo e com ajuda dos padrinhos Ronaldo e Reginaldo Leme passei a trabalhar em todos os GPs Brasil de F1 até 1989, quando a era das câmeras digitais caríssimas interromperam meu futuro na fotografia. Mesmo assim foram 12 anos acompanhando de perto a principal categoria do automobilismo mundial. Mas antes disso assisti das arquibancadas todos os GPs Brasil desde 1972.

 

Peguei a fase dos carros ainda com suspensão e pouco down force. Era de arrepiar ver Ronnie Peterson fazer a curva do Laranjinha de lado com a Tyrrell de seis rodas.  Ou o Emerson Fittipaldi mergulhar na curva 1 de pé cravado na McLaren. Coisa de macho alpha triboliano (com 3 bolas no saco!). Profissionalmente cheguei na F1 na era dos carros com grande pressão aerodinâmica, além de uma maior ainda pressão econômica por parte dos patrocinadores. Os carros não derrapavam mais e grudavam no chão que nem autorama. Mas ainda era bem romântica e os pilotos ganhavam pouco, comparado com hoje!

 

Quem está chiando com esse lance do Alonso e Massa não conhece a história da F1 ou está defendendo o ufanismo num ambiente no qual a única bandeira a ser defendida é a da vantagem econômica. Em 2010 o campeonato mundial de pilotos de F1 fez exatos 60 anos. Nos primórdios já havia o espírito de corporativismo nacionalista ao usar cores dos países na pintura dos carros. Os ingleses eram verdes, franceses azuis, italianos vermelhos etc. Ou seja, a equipe sempre foi mais importante do que a pessoa que arriscava o pescoço lá dentro. No período pós-guerra as nações européias viviam uma depressão moral gigantesca quem não resolveria nem colocando Lexotan na comida. Por isso era tão importante enfatizar a glória dos países e não de uma pessoa.

 

E quem conhece a história da F1 pré-oficial ainda vai se assustar com algumas presepadas do tipo: o carro do primeiro piloto quebrava e a equipe mandava o segundo piloto parar no Box para dar seu carro ao bonitão primeiro-piloto. E ai de quem reclamasse!

 

No finalzinho da década de 60 o genial Colin Chapman inovou ao mandar uma banana ao patriotismo e pintou seu Lotus de vermelho e dourado, cores da marca de cigarros Gold Leaf (folha dourada) e ainda mudou o nome da equipe para “Gold Leaf Team Lotus”. Pronto, neste dia acabou de vez a ingenuidade da F1 porque abriu um leque de interesses econômicos irreversíveis. Deste momento em diante vencer corridas não dava prestígio apenas ao piloto, ao país ou a uma marca de carro, mas fazia vender mais cigarro! E como se fumava naquela época!

 

Emerson no Lotus 72

 

Se é segundo é porque não é primeiro!

Dãããã, nada mais óbvio, só para os jornalistas brasileiros essa lógica tão cartesiana parece complexa demais. Então deixa eu refrescar a memória dos colegas de Lisarb. O Emerson Fittipaldi só ganhou sua primeira corrida na F1 em 1970 porque o primeiro piloto da equipe, meu ídolo Jochen Rindt tinha morrido e deixou um Lotus 72 novinho, com a revolucionária frente em cunha, acertadinho pronto pro brasileiro sentar e acelerar. Porque se Rindt não tivesse dado a castimbada no treino do GP da Itália, em Monza, Emerson teria corrido com o velho Lotus 49C de 1969 em forma de charuto com rodas e esperaria muito tempo para ser primeiro piloto.

 

Primeiros e segundos pilotos existem em qualquer modalidade desde a época jurássica do automobilismo. Não me perguntem o porquê, mas no motociclismo essa coisa de primeiro piloto nunca existiu, ou se existia eles têm uma forma muito estranha de camaradagem porque os pilotos de uma mesma equipe disputavam e disputam até hoje a vitória como se fosse briga de foice no elevador.

 

Voltando à F1, a mesma equipe Lotus foi acusada de ingenuidade em 1973 quando deu liberdade a seus dois pilotos Emerson Fittipaldi e Ronnie Peterson de se estapearem à vontade dentro das pistas. No final do ano Emerson reclamou barbaridade porque Peterson teria “roubado” pontos preciosos que impediram o brasileiro de papar o bi-campeonato. Sorte do Jackie Stewart que ganhou o terceiro título mundial.

 

Com jeito de quem aprendeu a lição, Chapman decidiu botar ordem no galinheiro e em 1978 convidou o ítalo-americano Mario Andretti para pilotar o moderníssimo carro asa. Mario aceitou com a condição de Peterson (de novo) se mantivesse como segundo piloto e jamais o ultrapassasse. Apesar de ser visivelmente mais rápido, Peterson teve de aceitar o papel de segundão e escoltou Andretti em várias vitórias que culminaram com o título do americano. Peterson não teve tempo de ver a promessa de ser primeiro piloto ser cumprida, porque morreu no GP de Monza do mesmo ano depois de uma porrada geral na largada.

 

A história da F1 mostra muitos mais casos de equipes nas quais havia uma determinação contratual de primeiro e segundo piloto do que equipes que liberaram a briga entre seus contratados. Os brasileiros não gostam de lembrar de certas coisas, mas nossos grandes pilotos como Emerson, Piquet e Senna vetaram vários companheiros de equipe e exigiram que a equipe trabalhasse só para eles. Mesmo assim houve brigas homéricas entre Piquet e Mansell na Williams e a famosa pancadaria verbal e efetiva entre Senna e Prost, além da já citada Emerson x Peterson. Mas os jornalistas brasileiros não escreviam textos indignados sobre o favorecimento aos pilotos da pátria amada. É mais ou menos assim: o Luis Fabiano pode ajeitar a bola com o braço para fazer o gol do Brasil, o Ayrton Senna pode vetar a contratação do Martin Brundle, mas o Alonso não pode exigir ser primeiro piloto... e ainda escrevem páginas e mais páginas evocando a falta de ética na F1, até citando o episódio de Rubens Barrichello em 2002!

 

Se tudo isso acontecia em uma época que as cifras de patrocínio eram ainda comedidas, imagine hoje, com a avalanche de dólares que cada equipe recebe por cada centímetro quadrado de publicidade em seus carros! Podem ter certeza que o salário do Alonso é beeeeeeeem maior do que o do Felipe, porque o brasileiro só foi campeão mundial por 20 segundos em 2008. Alonso foi campeão mundial duas vezes, levou um contêiner de dinheiro do banco espanhol Santander à Ferrari e por isso ele é o primeiro piloto e ponto final! É pra ele ser campeão mundial e Felipe terá de trabalhar para isso ou pedir demissão e correr na Lotus, Hispania ou Virgin, qual você acha a opção mais sensata?

 

Também não entendo a indignação dos torcedores brasileiros, pessoas que na vida corporativa são obrigadas a engolir sapos muito mais gordos, espinhosos e peludos do que correr na Ferrari e ganhar milhões de dólares por isso! Inclusive os colegas jornalistas! Quantas vezes um editor não foi lá e mexeu no texto a ponto de mudar até a opinião final e teve de aceitar ou procurar outra empresa? No mundo corporativo quantas vezes um gerente vai pro sacrifício em nome da empresa? Quem acompanha minha série de artigos “vida corrida” sabe que uma equipe de F1 em nada se diferencia de uma empresa ou exército. É um por todos e todos pela equipe!

 

Quem não gosta de ver este tipo de jogo de equipe tem a opção de mudar de modalidade. Na MotoGP, por exemplo, as equipes deixam seus pilotos literalmente se engalfinharem dentro da pista a ponto de formar duas equipes separadas dentro do mesmo time. Na MotoGP já se viu até uma moto da equipe correr com uma marca de pneu e a outra moto usar outra marca por pura exigência dos pilotos e se o patrocinador ficar ofendido que vá procurar outra equipe! Alguém consegue imaginar o Valentino Rossi deixando o Jorge Lorenzo vencer só pra ajudar a equipe? Nem por todo dinheiro do mundo!

 

Os jornalistas brasileiros precisam enfiar uma coisa na cabeça: Fórmula 1, GP2, Fórmula Fiat, Stock-Cars, F-Truck, motovelocidade, MotoCross e qualquer competição motorizada não é esporte. É negócio, business, sempre foi assim desde que Colin Chapman colou o adesivo Gold Leaf e cobriu o verde da Inglaterra com o vermelho e dourado da Gold Leaf. Se Fórmula 1 fosse esporte já deveria estar nas Olimpíadas! Esporte é uma atividade HUMANA, realizado por pessoas. O máximo que se permite de mecanização é a bicicleta e o barco à vela, porque não têm motor. Existe alguma modalidade olímpica movida a motor? Tá bom, tem o hipismo, mas sem cavaleiro o cavalo não participa!

 

Tenho vergonha quando vejo jornalistas-torcedores defendendo um piloto só porque traz no passaporte a nacionalidade brasileira, independentemente de resultados. Esse nacionalismo fora de moda atrapalha quem assiste uma competição pelo puro prazer de ver a DISPUTA, sem torcer especificamente para piloto ou equipe. Caso os jornalistas não saibam, existe gente que gosta de futebol sem torcer pra time nenhum! Eu vejo corrida de carro e moto pela emoção das disputas e tem mais gente que pensa assim no mundo. A F1 não vai perder um torcedor por causa de marmelada. Nada foi pior do que a presepada da Renault no GP de Cingapura de 2008, envolvendo um BRASILEIRO e a categoria resistiu, sem perder audiência por causa disso.

 

Se alguém ainda não percebeu isso, recomendo procurar uma atividade menos estressante do que o jornalismo. Ah, por favor, parem com essa bobagem de boicotar os patrocinadores e a própria Ferrari. Até parece que alguém deixará de comprar uma Ferrari F 360 Modena só porque “tiraram” a vitória de Felipe Massa na Alemanha!

 

Já escrevi centenas de vezes que piloto “bonzinho” não sobrevive. O mundo das corridas só tem lugar para quem tem colhão. Falando nisso, os três últimos grandes escândalos da F1 – espionagem da McLaren em 2007; manipulação do resultado do GP de Cingapura em 2008 pela Renault e manipulação do resultado do GP da Alemanha pela Ferrari em 2010 – tiveram como ator coadjuvante o mesmo piloto: Fernando Alonso! Hay que tener cojones...

 


publicado por motite às 19:27
link | comentar | ver comentários (26) | favorito
Sexta-feira, 11 de Setembro de 2009

Hare babado fortíssimo!

(Papai, me empresta o carro!)

 

Gente! Que babado fortíssimo é esse??? Nelsinho acusa Briatore de armação ilimitada no GP de Pingapura de 2008. Aí Briatore reúne a imprensa pra insinuar que Piquetzinho tinha um relacionamento "estranho" com um senhor inglês de 50 anos! Creeeeeeeeeeeedo, cruuuuuuuuuuuzes! Babado da pior espécie!


Só pra não dizer que não disse: olha, acho que Nelsinho quis jogar caca no ventilador, mas esqueceu de sair da frente. Resultado: respingou nele também!


Esse episódio do Nelsinho lembrou aquele babado do Barrichello no GP da Áustria de 2002, quando deixou Schumacher ganhar a poucos metros da chegada. É tudo uma questão de equipe. A equipe é um microorganismo no qual cada bactéria deve saber seu papel. O mecânico que abastece não pode esquecer de abrir o registro da bomba de gasolina. O engenheiro não pode esquecer uma conta simples e errar o projeto. O piloto não pode enfiar o carro no muro de propósito e causar um mega prejuízo sem que haja um motivo "de força maior".


A rodada do Nelsinho foi típica de quem sobe na zebra e continua acelerando. Se parar de acelerar o carro volta à trajetória, mas percebe-se na imagem que a roda traseira continua patinando como se o acelerador estivesse a pleno. Bom, a telemetria vai esclarecer tudo isso.


Só que o Nelsinhozinho ACEITOU fazer isso. E se ele ACEITOU a regra do jogo devia ter ficado de bico caladinho porque falar um ano depois só pode ser coisa de pessoa machucada por dentro. Ele magoou e decidiu meter a boca no Briatore. Ele quis se dar bem, mas pode se dar mal, porque a reação da Renault foi imediata: o presidente da multinacional francesa, o brasileiro Carlos Ghosn já meteu o sabugo e mandou processar pai, filho, espírito santo e amém!


A família Piquet terá de desembolsar uma notinha preta pra enfrentar a quebra de braço com uma legião de advogados da multinacional francesa loucos pra ganhar uma grana em cima do babado!


Como se não bastasse, Flavio Briatore entrou na justiça comum inglesa pedindo uma indenização por danos morais, calúnia e difamação (como se ele fosse um anjinho barroco).


Não se fala em outra coisa nos bastidores de Monza e ainda vai voar muito mais caca no ventilador. Só acho que Nelsinho perdeu uma enorme chance de ficar quieto, investir no automobilismo europeu ou americano e tentar uma volta à F1 mais tarde.


Automobilismo é um antro de pessoas cheias de más intenções. Desde o kart, o que se aprende é como burlar o regulamento, como trapacear, como levar vantagem em cima dos outros. Nesse cenário de cobra comendo cobra qual chefe de equipe terá coragem de contratar um dedo-duro???


Nelsinho deve aproveitar que é bonitinho e procurar emprego de modelo, de ator em Bollywood, garoto propaganda (se melhorar a voz), porque piloto, depois dessa, só se for como fez a vida inteira: no carro do pai dele!


=    +    =    +


Mais uma buemba no mercado de motos. Meu amigo, Biagio Ferrari acabou de me twittar avisando que as novas motos da Sundown STX e Motard terão seus motores reduzidos de 200 para 125cc para tentar atender os limites de emissões do Promot 3 e, de quebra, melhorar o consumo.


Sinceramente, acho que será a pá de cal na história dessa marca no mercado de motos. Quando todo mundo está aumentando a cc para compensar as perdas pelos limites e emissões, passando de 125 para 150cc, a Sundown resolve ir na contra-mão e rebaixar a cc de suas motos! Afe, tomara que tenha sucesso, mas... duvido!

publicado por motite às 18:34
link | comentar | ver comentários (10) | favorito
Segunda-feira, 31 de Agosto de 2009

Mais uma do Galvão!

(Até o Deus Ayrton Senna já bateu de propósito! Foto:Tite)

 

Durante a narração do GP da Bélgica de F1 (milagrosamente sob sol) Galvão Bueno cometeu mais uma salamada clássica. O comentarista Reginaldo Leme deu uma prova de ter colhões de aço e afirmou: "Há suspeitas de que Flavio Briatore tenha mandado Nelsinho Piquet bater de propósito no GP da Cingapura em 2008 pra facilitar a vida de Alonso".  Logo em seguida Galvão saiu em defesa do brasileirinho Piquet alegando que "nenhum piloto bate de propósito". Pronto! acabou de provar que 35 anos de F1 não lhe ensinaram porríssima nenhuma!


Acho que jornalistas deveriam evoluir nos segmentos especializados como qualquer outro esportista. Deveriam começar cobrindo corridas de kart, depois nas fórmulas de base e só então teria direito à super-licença de jornalista de F1. Assim evitaria uma burrice sem tamanho como essa!


COMO ASSIM, GALVÃO??? Todo final de semana, em alguma pista desse mundo, tem um piloto dando porrada de propósito, KCT!!!


Só quem nunca gravitou no meio poderia dar um depoimento tão imbecil como esse. Vou lembrar algumas porradas propositais só na Fórmula 1. No GP do Japão de 1989, narrado pelo Muy Bueno Galvão, Alain Prost não teve a menor cerimônio em jogar o carro pra cima de Ayrton Senna. Ou alguém nesse mundo de meu Deus acha que foi uma batida casual???


GP do Japão de 1990. Ayrton Senna largou mal, viu que Alain Prost faria a primeira curva na frente e não teve dúvida: abaixou a cabeça e acertou o francês à meia nau! Alguns anos depois o Ayrton mesmo declarou que bateu de propósito e de forma a quebrar tudo!


GP da Austrália de 1994. Depois de tocar no muro de Adelaide, Schumacher percebe que Damon Hill está se aproximando e irá vencer a corrida. O alemão não teve dúvida: jogou a Benetton em cima da Williams de Hill e garantiu o título mundial matematicamente.


GP da Espanha de 1997. Já na Ferrari Schumacher começa a ter problemas no carro quando percebe a aproximação de Jacques Villeneuve. Não teve dúvida: meteu a Ferrari na lateral da Williams. Só que não adiantou porque perdeu o título.


GP de Mônaco de 2006. Depois de fazer a sua volta rápida, Michael Schumacher percebeu que Alonso poderia roubar-lhe a pole position, então numa curva de lenta ele simplesmente estacionou a Ferrari no meio da pista, simulando uma batida. Dançou porque foi punido e largou em último.


Tá bom, Galvão, ou quer mais???

tags: ,
publicado por motite às 21:56
link | comentar | ver comentários (31) | favorito
Segunda-feira, 24 de Agosto de 2009

Valeu, Rubens!

(Abração pra vc também!)

 

Foi emocionante a vitória de Rubens Barrichello no GP da Europa. Dessa vez não teve erro, nem dele, nem da equipe, pelo menos da Brawn! Quem pisou na bola foi a McLaren que esqueceu os pneus na de trocar os... pneus! Básico!

 

Por mais que eu tenha criticado publicamente o Rubens Barrichello, lá no íntimo sempre torci pelo sucesso dele. Nunca deixei de elogiá-lo como piloto, só não gostava de algumas atitudes do Rubens pessoa. Deixando de lado o jornalista e escrevendo como torcedor e fanático por automobilismo desde criança, queria muito que ele se desse bem. O Rubens Barrichello foi o primeiro piloto que acompanhei já como jornalista de perto desde o surgimento, nas corridas de kart. Inclusive trabalhei na assessoria de imprensa dele na época da F-Opel, F-3 e F-3000.

 

Nas poucas ocasiões que ainda encontro com ele em eventos de imprensa faz questão de me cumprimentar pelo nome de batismo “Geraldo” e acrescenta: “o cara das motos!”. Por isso eu torço por ele, mesmo que largue em 14º e termine em 8º lugar. Torço para que ele não perca a vontade nem se machuque. Coisa de tio. Só não gostava quando ele desandava a criticar o carro, a equipe, o companheiro de equipe, etc. Reclamar demais é feio, é mais bonito esperar cinco anos e voltar a vencer em outra equipe!

 

Na véspera da corrida, sábado, fui escalar e tocamos no assunto F1. Foi quando um amigo questionou: “mas o Rubinho é bom mesmo?” E respondi:

 

- Ele é ótimo, só que passou pela experiência de sempre estar no lugar certo, mas na hora errada!

 

A passagem dele pela Ferrari foi ofuscada porque tinha um gênio da espécie que canalizava todas as atenções para ele. Agora na Brawn não pensem que ele acelera menos que Button, só que teve de brigar para receber atenção contra um inglês em uma equipe inglesa. Pô, qualquer pessoa que conhece corrida sabe que existem privilégios; é tão natural quanto respirar. Se a equipe se chamasse Marrom e fosse genuinamente brasileira adivinha quem estaria recebendo todas as atenções?

 

Foi ótimo ver Rubens vencer a 10ª (+1)* corrida da carreira e ser a 100ª(+1) brasileira na F1. Mas não sou louco de colocá-lo como favorito pelo título, porque muita água vai passar pelo radiador ainda. Vou continuar torcendo por ele, apenas como torcedor, mais nada.

 

À tarde foi a vez de assistir à etapa de Sonoma da F-Indy. Gente, o que é essa categoria? Ou melhor: o que é essa falta de categoria? Parece corrida de F-Ford entre estreantes e novatos. O nível técnico dos pilotos está muito baixo. Os caras rodam sem parar, só conseguem ultrapassar pelo método full-contact, batendo roda com roda e aquela pista californiana me lembrou o autódromo de Caruaru! Um pastelão com cheiro de metanol!

 

* Toda vez que citarem o número de vitórias de Rubens Barrichello na F1, acrescentem mais uma: aquela vergonhosa corrida na Áustria em 2002 que ele liderou de ponta a ponta e foi obrigado a deixar Schumacher passar quase na linha de chegada. Ele ganhou aquela corrida, só quem não acredita nisso é a cúpula da Ferrari.

publicado por motite às 04:57
link | comentar | ver comentários (14) | favorito
Sábado, 25 de Julho de 2009

Cala a boca, Galvão!

(Galvão, se expressando em linguagem de sinais)

 

 

Bem, amigos da Rede Globo! O que mais precisa acontecer para que o Galvão Bueno seja banido das transmissões da Fórmula 1??? Será preciso que o homem descubra vida em Marte? Será necessário Jesus Cristo renascer (de novo!) e ter uma reunião na Globo? Que um meteoro caia na Terra iniciando uma nova era de seres mutantes e mudos?

 

Meu Deus, esse cara é um poço de ignorância e preconceito. O discurso que fez no treino de sábado do GP da Hungria, criticando a presença de Jaime Al... alguer... sei lá, esse espanhol de 19 anos, foi tão preconceituoso que deveria ser enquadrado na Lei Afonso Arinos!

 

Quer dizer, seu Galvão, que para ter direito a pilotar um F1 é preciso ter um histórico no automobilismo de base? Com classificações decentes? Então me explique quais caminhos levaram Pedro Paulo Diniz à F1? E o Ricardo Rosset? O que esses caras fizeram de brilhante antes de sentar no cockpit de um F1??? Dois pilotos medíocres que chegaram à F1 por pura pressão econômica.

 

Galvão afirma que Jaime não tem quilometragem com carro de F1. Ok, mas no primeiro treino oficial o espanhol ficou apenas a dois décimos de segundo de seu experiente companheiro de equipe, Sebastien Buemi. O final do treino estava em uma esperada 20ª e última posição, a meio segundo do experiente Robert Kubica e 1s3 do companheiro Buemi, absolutamente normal para um estreante.

 

(Jaime Alguersuari, vc precisa de um apelido, rápido!)

 

A afirmação do Galvão é típica de quem nunca colocou a bunda em um veículo de corrida e só conhece o mundo das competições do lado de fora. Quem tem a experiência do lado de DENTRO das competições sabe que um bom piloto não precisa mais do que meia hora a bordo de um carro de corrida para achar os limites, seja ele um GP2, um Fórmula 3 ou um Fórmula 1. O que o senil Bueno não sabe – porque é burro e geneticamente mal qualificado – é que os carros de F1 hoje em dia são infinitamente mais fáceis de pilotar do que nos anos 90, quando tinha alavanca de câmbio e tudo era mecânico. Hoje o F1 é a concretização de um vídeo game e jovens de 19 anos passaram várias horas por dia praticando nos simuladores de última geração.

 

Não vai demorar para que a F1 seja invadida por perebentos jovens de 19 a 20 anos, pilotando com a mesma sede dos trintões oxidados, mas por um salário bem menor. Não esqueça, Galvão, que F1 é business e dinheiro move as principais decisões da categoria.

 

A cada transmissão o Galvão se torna mais entojado e asqueroso. Defende o Nelson Piquetzinho como se ele fosse um novo Schumacher, um novo Senna! O cara é só um piloto tão, ou mais, lento que o jovem Jaime! E eu acho que Briatore só não mostrou o cartão vermelho pro brazuquinha porque deve ter uma multa contratual gigantesca. Briatore detesta gastar dinheiro!

 

Como eu adoraria ver o Jaime enfiar tempo nos mais velhos, experientes e curriculares pilotos da atual F1 só pra calar a boca desse gagá. O mais: o Jaime não parou o treino porque rodou, como afirmou o preconceituoso cronista, mas porque o carro dele QUEBROU, porra!!! Acho que o Galvão transmite de dentro de um sarcófago e não vê a mesma tela que eu vejo! Vou torcer muito para que o Jaime cale a boca desse decrépito. Fuerza Jaime!!!

 

E na pancada do Massa? Pow, na primeira vez que apareceu a porrada pela câmara on-board comentei com minha sonolenta esposa: “o Massa apagou antes de bater!”, é só ter um MÍNIMO de experiência em corrida pra ver que o cara pregou nos pneus inconsciente! Achei que ele tinha vomitado no capacete, que, acredite, é normal em pistas como Hungaroring e Mônaco. Eu mesmo já passei por isso, de moto, em Interlagos, nos anos 80, correndo no circuito antigo. Na freada da Curva 3 gorfei no capacete e passei reto o ponto de freada que nem um cometa até parar a 1 cm do guard-rail! Mas o Galvão insistia em buscar outra explicação... que não existia! Felizmente tem o Burti ali, pra salvar a gente.

 

A Rede Globo precisa urgente achar alguém para substituir essa múmia e deixá-lo babar ovo nas transmissões de futebol e outros esportes. Ele quase morre quando um brasileiro consegue ficar entre os três primeiros colocados até em campeonato mundial de palitinho. O Galvão adora comentar que está a 30 anos acompanhando a F1. Posso afirmar, sem qualquer sombra de dúvida, que para nós, que gostamos de F1, foram 30 anos perdidos!

 

tags: ,
publicado por motite às 20:41
link | comentar | ver comentários (33) | favorito
Sexta-feira, 1 de Maio de 2009

Simples folha de papel

 

Ayrton e Nina. Foto: Tite

Aquele primeiro de maio
É a primeira vez que escrevo sobre esse assunto: minha convivência com Ayton Senna. Na verdade a convivência foi bem pequena e reservada, porque os dois eram extremamente tímidos e vivíamos em lados opostos da cidade. Eu só via o Ayrton em dias de treinos e corridas no kartódromo de Interlagos, o que representava pelo menos uma vez por semana.
Quando comecei a freqüentar o kartódromo, em 1975, Ayrton já era praticamente um veterano. Já tinha vários títulos e todo mundo ali sabia que ele era um fenômeno na pilotagem e no acerto do equipamento. Só não era – nem nunca foi – muito paciente.
A primeira vez que vi Ayrton pilotando foi inesquecível. Assim que cheguei ao kartódromo, meu amigo Nelsinho Freire, que por um tremendo azar corria na mesma categoria do Ayrton, me levou na curva da balança e falou: “Olha o 42 fazendo essa curva!”. O 42 era o Ayrton! Ele veio na reta, meteu o pé no freio, travou a traseira e veio controlando a derrapagem até o meio da curva. Depois fincou o pé no acelerador e entrou na reta dos boxes. Olhei estarrecido pro meu amigo e perguntei:
- C*****, Nelsinho, eu também quero fazer isso. Você sabe derrapar assim???
- Mais ou menos, às vezes dá certo ...
Esse sentimento de resignação era comum em toda geração que correu na fase Ayrton: muito piloto ali podia até ser mais rápido do que ele; alguns tinham o mesmo estilo de pilotagem, como Chico Serra, mas só o Ayrton fazia isso com tanta naturalidade que parecia estar brincando de carrinho no tapete da sala.
Um ano depois era minha vez de sentar num kart e brigar horas seguidas para aprender a derrapar daquela forma. Em algumas curvas de algumas pistas eu até conseguia derrapar daquela maneira, mas em todas as curvas de todas as pistas só mesmo Ayrton conseguia. (Um parêntese: ele era conhecido como “Beco” entre os amigos daquela época, mas nunca consegui chamá-lo por esse apelido...).
Minhas conversas com Ayrton foram poucas, sempre sobre assuntos relacionados aos karts e às corridas, eventualmente falávamos de moto, autorama, mas sempre tinha corrida no meio. Uma vez estávamos tomando um lanche no domingo, esperando a largada das nossas categorias, quando as motos largaram no autódromo de Interlagos. Corremos pra subir no muro e ver as motos passando, saindo da Curva 2. Depois que as motos passaram o Ayrton olhou pra mim e comentou:
- Putz, tenho maior vontade de correr de moto!
Quem diria! Dez anos depois era eu quem estava passando naquela curva com uma moto de corrida...
 
Brother
Eu fico doente quando leio comentários de jornalistas que apareceram muito tempo depois e escrevem verdadeiras cretinices sobre o comportamento do Ayrton. Ignorância, falta de documentação, mas sobretudo inveja alimentam muito desses comentários. Falar que Ayrton só ganhava porque era “filhinho de papai” e tinha uma montanha de equipamento é um atestado da mais alta inveja. Se existia alguém que podia ser chamado de “filhinho de papai” era Mário Sérgio de Carvalho Filho, ninguém menos que o filho do fabricante de karts Mini. Ele tinha um estilo maravilhoso de pilotar e contava com uma fábrica inteira à disposição. Com um estilo mais redondo e cerebral, era o único que fazia frente ao Ayrton. As corridas se resumiam ao seguinte: “quem vai ganhar, Mário Sérgio ou Ayrton?”
Se existe alguém neste planeta que pode dar o melhor depoimento do que foi Ayrton nesta época, sem dúvida, chama-se Mário Sérgio de Carvalho Filho.
A família do Ayrton tinha grana sim. Mais do que da maioria, mas menos do que muitos do que estavam ali! Tinha filhos de industriais, políticos, altos executivos de multinacionais, milionários tradicionais e outras categorias do topo da pirâmide e que nunca se tornaram piloto de carro. O pai do Ayrton era um comerciante que se deu bem porque abriu uma loja de material de construção em um bairro nobre que estava em plena expansão. E, ao contrário da maioria dos pais daquela época – inclusive os meus – não deixava Ayrton dirigir sem carteira de habilitação. Eu ia para a pista com meu próprio carro. Aos 17 anos! Sem habilitação!!! Para viajar pelo interior de São Paulo contava com meu primo Irineu, um ano mais velho e já habilitado. O Ayrton rodava pela cidade porque tinha um motorista.
Eu era mais “filhinho de papai” do que ele!
Duas cenas me marcaram nesta época. A primeira quando eu estava quebrando a cabeça para acertar meu kart, desesperado, tentando tudo e nada funcionava. Pedi pro Ayrton dar uma volta. Nem precisou, em meia volta ele descobriu que tinha quebrado um parafuso de sustentação do eixo. Essa ajuda iria se repetir em outra ocasião. Ele fazia isso várias vezes, com os novatos. Era o nosso grande irmão, no bom sentido.
A segunda cena foi numa pista do interior. O Ayrton estava sentado em volta de uma pilha de pneus, com uma fita métrica na mão, medindo o perímetro de todos eles. Olhei aquilo e perguntei:
- Mas que c*** você está fazendo?
- Escolhendo os pneus!!! Essa pista só tem curva para direita, os pneus do lado esquerdo vão gastar antes, por isso precisam ter mais borracha.
Voltei pro meu box, olhei pro único jogo de pneu que dispunha e sentei resignado, esperando a largada...
 

capakart.jpg

Minha carreira no kart foi muito curta, mas me prmitiu conhecer um gênio.

 
15 anos depois
Bom, a trajetória do Ayrton é conhecida do mundo inteiro. Só lamentei não ter pego o endereço dele quando foi pra Inglaterra, pois eu teria escrito e certamente ele teria respondido. Mas... sempre a timidez f**** minha vida!
Quando Ayrton foi bi-campeão mundial, em 1990, (ou quando foi tri-campeão, em 1991, admito que não lembro), ele fez uma super festa na fazenda de Tatuí, interior de SP. Nesta época eu era colaborador do jornal Shopping News e o assessor de imprensa do Ayrton, meu amigo Roberto Ferreira, me mandou duas credenciais. Uma delas era para Livio Oricchio, que abriu mão do convite. Olhei pra minha filha, Nina, então com 5 (ou seis) anos, peguei meu velho Opala Coupé 1981 e lá fomos pra Tatuí.
A festa era tão suntuosa, grandiosa e fabulosa que os seguranças olharam muito desconfiados pra aquele Opala e não fizeram a menor cerimônia em revistar o carro todo, inclusive no porta-malas!
Não lembro muitos detalhes da festa: tinha uma dupla sertaneja cantando, várias tendas enormes, muitas celebridades na época pré-Caras e uma corrida de kart na qual Bruno Senna foi o vencedor. Eu estava animadíssimo porque comentaram que teria uma corrida de kart para jornalistas e eu era o papa-tudo destas corridas. Mas foi alarme falso.
E também lembro de uma cena engraçadíssima que virou lenda na família. Todo mundo ganhou um kit composto de boné, camiseta e credenciais. E todo mundo pedia pro Ayrton autografar na camiseta. A Nina olhou aquilo, sem entender muito bem o que se passava e perguntou:
- Por que aquele homem fica rabiscando a camiseta de todo mundo?
A explicação não a convenceu muito. Quando estava lá, zanzando o Ayrton me reconheceu, olhou pra Nina, com jaleco de “press” e fez algum comentário sobre a “menor jornalista do evento”. Foi quando ele a pegou pela mão para tirar uma foto. A Nina se escondeu atrás de mim e não queria de jeito nenhum. E eu:
- Vai, Nina, hehe, vai do lado do tio Ayrton, vamos fazer uma foto. Ele é piloto de Fórmula 1...
E praticamente empurrei a Nina, que fez maior cara de desconfiada, mas foi. A foto é esta que ilustra este artigo, mas repare como ela está toda torta, querendo fugir dali.
Feita a foto, perguntei:
- Mas Nina, por que você não queria tirar uma foto do lado do Ayrton???
- Porque eu não queria que ele rabiscasse minha camiseta!
Tive um ataque de riso que devem ter considerado como uma espécie de incontrolável histeria fanática... Abracei minha filha e fomos comer churrasco. (Sim, nessa fase a Nina ainda não era vegetariana, mas já olhava pra salada com mais volúpia do que pra lingüiça).
Na hora de ir embora, sem me dar conta de que estava presenciando um evento histórico, foi a vez da vergonha. Um engarrafamento na saída da fazenda fez o velho Opala ferver! E lá fui eu, com uma leiteira na mão, atrás de uma torneira, deixando o segurança de vigia porque a Nina dormia tranqüila no banco de trás.
Na manhã da segunda-feira, 2 de maio de 1994, na inocente tentativa de falar alguma coisa que diminuísse minha tristeza, Nina me telefonou e comentou:
- Agora aquela foto deve valer uma grana!
Só consegui responder:
- Eu preferia que ela continuasse valendo apenas como uma simples folha de papel.
 

 

publicado por motite às 17:47
link | comentar | ver comentários (23) | favorito
Quarta-feira, 23 de Julho de 2008

O melhor piloto de todos os tempos

 

(seria ele o melhor piloto de F1 de todos os tempos? Na foto Ayrton está segurando minha filha mais nova, a Nina - banguela. Foto@ Tite)

 

 

O melhor piloto do mundo

 

Quando eu era adolescente, costumava gastar o dinheiro da mesada em duas manias: carrinhos Matchbox e revistas estrangeiras de automobilismo e motociclismo. Foi assim que aprendi meia dúzia de frases em inglês e francês e aprimorei o italiano. Mais que isso, passei a admirar alguns jornalistas especializados, sobretudo os das revistas Motoring News e Grand Prix International (a gringa). Naquela época o Brasil já tinha um campeão mundial de F1, Emerson Fittipaldi, mas as revistas brasileiras davam notícias apenas da F1 e eu queria saber tudo.

Em um anuário "O Ano do Automóvel", versão brasileira (infelizmente efêmera) do "Automobile Year" que circula até hoje, tinha um artigo que me chamou a atenção na época, mas que tinha esquecido completamente até recentemente. O título era "Dragster to Paradise". Era assinado pelo jornalista francês Johnny Rives, com um texto saboroso e sempre surpreendente. Infelizmente joguei o anuário fora, mas o tema da narrativa era "o melhor piloto de F1".

Eram tempos de Jackie Stewart, Emerson Fittipaldi, Jacky Ickx, Ronnie Peterson, Niki Lauda e sua turma. Época em que um campeão conquistava título na última etapa, com 5 ou 6 vitórias no ano. Tempos em que os carros quebravam que nem desfile de DKW. Uma época tão legal que eu lembro praticamente de cada corrida que via pela TV e ouvia pela Jovem Pan.

Johnny Rives escreveu um texto mais ou menos assim:
 
"Numa noite dessas, fui dormir pensando qual seria o melhor piloto de F1 de todos os tempos. Sim, porque não consigo mais agüentar esses jornalistas comentando sobre a genialidade de Jim Clark, a frieza de Juan Manuel Fangio, comparados com os atuais Stewart, Fittipaldi, Peterson, Lauda ou Ickx. São épocas diferentes, carros diferentes, mas sempre aparece alguém para instigar e ficar falando que um foi ou é melhor que outro.

Durante a noite acho que morri. Ou sonhei, não sei. Mas subitamente me vi diante de Deus. Isso mesmo, Ele, em ectoplasma e osso! Quando me vi face a face com Deus, nem quis saber se estava morto ou não, só uma coisa me ocorreu. Ele certamente sabe tudo, afinal é onisciente! Então só Ele pode me responder essa pergunta que me persegue há décadas. Não tive dúvidas e assim que me vi diante Dele perguntei:

- Senhor, já que sabes tudo, me responda, qual é o melhor piloto de F1 de todos os tempos?

Deus me olhou de forma estranha. Acho que normalmente as pessoas perguntariam outra coisa numa situação dessas, como qual a minha missão na Terra, qual o mistério da fé e da paixão etc. Mas Ele nem pestanejou e respondeu:

- É Hans Strudel!

- Quem? Nunca ouvi falar dele! Em qual categoria ele corre? Já ganhou alguma corrida?

- Não, ele é austríaco, mora em Zirl, é lenhador e nunca correu de carro!

- Mas, er... não estou entendendo!

- Ele é o melhor piloto de F1 de todos os tempos, só que não sabe disso, porque não se interessa por corridas de carro.

- Desculpe, mas continuo não entendendo...

- Strudel tem todas as qualidades humanas e físicas para ser o melhor piloto de F1 de todos os tempos. Tem uma visão fantástica, é habilidoso com as mãos, tem a maior rapidez de reflexos de todos os seres humanos, tem a maior capacidade cerebral para ser piloto. Só que ele não sabe disso e passa seus dias cortando lenha! Se tivesse a chance de correr de F1 seria o melhor de todos.

Acho que acordei. Ou ressuscitei, não sei. Mas logo em seguida estava em meu quarto, pensando nisso. E uma luz se abriu sobre essa discussão sobre o melhor piloto de todos os tempos. Isso não existe. Não existe o melhor em qualquer coisa de todos os tempos. O que podemos qualificar e dimensionar é qual o melhor piloto de determinada categoria naquele momento. É estupidez querer comparar esportistas de épocas diferentes. Isso é perda de tempo".

Bom, isso é o pouco que lembro daquele texto. Note que foi escrito antes de Prost, Piquet, Senna, Alonso e Schumacher. Logo, mais que um texto, é realmente uma visão! E é a MINHA versão, pois não me lembro bem dos detalhes.

Sempre vejo essa discussão tola sobre quem é ou foi o melhor piloto de todos os tempos. Isso não tem o menor cabimento, mas parece que a humanidade é movida por esse afã de revelar quem é melhor. A meu ver, isso é uma caretice sem tamanho. Cada esportista bem sucedido tem seu valor, dentro de um contexto e de sua época. Qualquer coisa que extrapole a contemporaneidade é uma bobagem sem tamanho. Como bem disse o meu amigo Marcus Zamponi: "Essa disputa entre Senna e Schumacher posso resumir da seguinte forma: Senna FOI o melhor piloto de F1, Schumacher É o melhor piloto de F1". Nada mais genial.

Além de calar essa discussão estéril, esse texto do jornalista francês serve pra abrir os olhos de todo mundo para o risco de cometer a bobagem de comparar pilotos de épocas diferentes. Lembro que uma das situações mais constrangedoras que presenciei no jornalismo foi justamente a tentativa de comparar pilotos de épocas distintas. Em uma festa de entrega do prêmio Capacete de Ouro, a jornalista diretora do evento, ao lado de Rubens Barrichello cometeu a gafe de colocar Rubinho em um patamar acima de Gilles Villeneuve só porque o piloto brasileiro tinha maior número de vitórias. Na hora me virei para o Zampa, sempre ao meu lado e cochichei:

- Porra, alguém precisa avisá-la que Villeneuve morreu!
 
A comparação só não foi mais constrangedora do que o texto que o jornalista diretor de redação da revista Racing cometeu ao impor um artigo ridículo na revista, no qual ele promovia uma corrida hipotética, organizada nos céus, entre os melhores pilotos de todos os tempos. O texto (chatíssimo do começo ao fim) resumia um campeonato entre pilotos como Fangio, Clark, Prost, Senna, Piquet, Schumacher etc e o campeão, claro, foi Senna. Essa tortura saiu na capa da Racing e ainda teve continuação em uma segunda edição.

Assim que vi a capa da Racing lembrei do texto do Rives, que li na adolescência. Se o jornalista leu aquele artigo, fez mal ao reescrevê-lo daquela forma insossa e desrespeitosa com a memória de outros pilotos. Se não leu, foi uma coincidência que serviu apenas para submeter os leitores de Racing àquela barbaridade. Sei de fontes seguras que as cartas criticando o artigo foram sumariamente censuradas. Mas as (poucas) elogiosas foram publicadas. Coisas da imprensa.

Voltando ao artigo original do jornalista francês, aquele texto me abriu a mente para esse fato de que não existe O melhor. Existe uma conjunção de fatos que levam a um resultado positivo. Nada filosófico, mas vou exemplificar. Quando eu mantinha meu curso SpeedMaster de pilotagem, recebi um aluno chamado Marcelo Mistrorigo, então com mais de 30 anos. Ele tinha ganhado uma moto esportiva em uma rifa e decidiu fazer o curso para aprender a pilotá-la. Logo nas primeiras aulas percebi que o cara tinha algo de especial. Ao final do curso de dois dias ele estava pilotando muito rápido. Algum tempo depois treinamos juntos em Interlagos e ele foi mais rápido que eu! Mais tarde se inscreveu para correr de 600 Supersport e um ano depois foi o campeão brasileiro de Motovelocidade naquela categoria. Tudo por causa de uma rifa!

Por isso eu pergunto: e se o Milton Silva, pai do Ayrton, nunca tivesse construído um kart para o filho de quatro anos? Se o pai de Michael Schumacher tivesse feito um campo de futebol, ao invés de uma pista de kart indoor? Não haveria essa discussão tola sobre qual o melhor piloto de F1 de todos os tempos.

 

 

publicado por motite às 21:15
link | comentar | ver comentários (6) | favorito

.mais sobre mim


. ver perfil

. seguir perfil

. 14 seguidores

.Procura aqui

.Fevereiro 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
22
23
24
25
26
27
28
29

.Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

.posts recentes

. Marmelada so sugo

. Hare babado fortíssimo!

. Mais uma do Galvão!

. Valeu, Rubens!

. Cala a boca, Galvão!

. Simples folha de papel

. O melhor piloto de todos ...

.arquivos

. Fevereiro 2024

. Janeiro 2024

. Dezembro 2023

. Novembro 2023

. Outubro 2023

. Julho 2023

. Maio 2023

. Janeiro 2023

. Novembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Julho 2019

. Junho 2019

. Março 2019

. Junho 2018

. Abril 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Março 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds