Segunda-feira, 27 de Junho de 2011

Eu tenho um sonho

 (Se tiver com o documento em ordem este carro fumacento pode rodar)

 

Eu tenho um sonho

 

O pastor e ativista político americano Martin Luther King Jr era um poeta. Suas frases e discursos são até hoje repetidas e usadas como referência em várias situações. O mais famoso de seus discursos começava dizendo “Eu tenho um sonho” e prosseguia relatando como seria o ideal de um país sem a perseguição racial que os Estados Unidos promoviam nos anos 50.

 

Pois eu também tenho um sonho. Sonho com o dia em que minha cidade será administrada por pessoas que pensam no interesse maior da coletividade e não no poder. Pessoas contratadas pela competência técnica e não por um concurso que mede a capacidade de decorar a tabela periódica e os afluentes do rio Amazonas. Sonho com o enxugamento na administração pública e contratação de profissionais efetivamente competentes e não parasitas que vêem no emprego público uma forma de trabalhar pouco e sempre.

 

Sonho com a transparência da administração pública e a extinção eterna da corrupção. Com a certeza de que cada centavo compulsivamente doado à administração sob os eufemismos de imposto, taxa, contribuição compulsória etc chegue efetivamente à população.

 

Mas acima de tudo, sonho com o dia que o gerenciamento do trânsito seja feito por pessoas especialistas, juristas, gerenciadores com a mais rara qualidade humana: a sensatez. Neste país ao contrário uma folha de papel, ou a falta dela, tem mais peso do que qualquer item de segurança do veículo. Se um motorista, ou motociclista, distraído ou esquecido mesmo, deixar de pagar uma taxa pode ter o veículo apreendido, guinchado e retido em um pátio, mesmo em perfeitas condições de uso, com todos os itens de segurança e impecável. Enquanto um carro, ou moto, com documentação em ordem, mas caindo aos pedaços pode rodar livremente. A arrecadação tem mais importância para o Estado do que a segurança do cidadão.

 

Só para não ficar nos exemplos brasileiros (que já sabemos ser ao revés do mundo), pesquisando outros países constatei que nos Estados Unidos, se o cidadão esqueceu de pagar alguma taxa e o policial o flagrar, pode pagar diretamente ao oficial, que no carro tem uma dessas máquinas portáteis que transmitem dados por telefonia celular, igual à de qualquer botequim. Eu mesmo fui multado, em 1999, e paguei a multa pelo cartão de crédito diretamente ao policial (ultrapassei em faixa contínua).

 

Na Inglaterra, se o cidadão for pego com a documentação irregular, tem três dias de prazo para se apresentar diante de um delegado de trânsito com os papéis em ordem. E ai do sujeito se não aparecer. Em nenhum destes países o veículo é retido, porque nestes lugares esquisitos o Estado entende que a propriedade do veículo não pode ser questionada ou retirada se estiver pago! No Brasil o direito à propriedade está garantida pela Constituição, desde que as taxas da propriedade estejam em dia! A propriedade é tua, mas o direito ao uso é pode ser confiscado pelo Estado.

 

Ah, mas ao adquirir a propriedade, por um valor muito acima ao do mercado mundial, é sempre justificado pelo comércio como resultado do excesso de tributação. Cerca de 35% do preço dos carros, motos e caminhões já são  resultado de impostos em cascatas. Mesmo assim se não pagar as taxas anuais o cidadão perde o direito de usar o veículo. É a farra do poder público sobre o direito à propriedade. Concordo que os veículos com mais de cinco anos de uso sejam fiscalizados, mas em carros semi-novos, com menos de 10.000 km rodados esta fiscalização de emissões de poluentes tem o desagradável e poluído cheiro de propina oficial, tipo: “passa cinquentinha aqui que eu libero seu carro zero quilômetro pra rodar pela cidade”. Durma-se com uma esculhambação dessas!

 

Outro sonho é ver juristas, especialistas em direitos civis, questionarem se esse DPVAT é legal. Na minha ingenuidade política e fiscal acho que  deveria ser atrelado à pessoa física e não a um bem inanimado. Veículos não saem sozinhos por aí, precisam ser dirigidos e quem dirige que é responsável pelos acidentes. Portanto, nada mais natural que o seguro obrigatório fosse atrelado a um CPF ou prontuário de CNH. Veja a situação de quem tem mais de um veículo, por exemplo, ninguém dirige dois carros ao mesmo tempo. Qual o sentido de um veículo parado ser submetido ao pagamento de seguro compulsório? Ele pode sair sozinho e atropelar alguém?

 

Parece que tudo no Brasil é feito para tirar o máximo possível de dinheiro do contribuinte. Se alguém tem um carro, uma moto e um scooter, por exemplo, precisa pagar seguro obrigatório de três veículos, mas só usa um de cada vez. Não tem o menor sentido! É o mesmo princípio do sistema Sem Parar dos pedágios já questionado antes. Não faz sentido ser fixado a um número de placa, mas deve ser direito de um motorista! Mas o Estado precisa garantir o retorno do investimento feito pelas empresas privadas que administram os pedágios. Uma pessoa paga três taxas de administração para ter direito aos transponder, mesmo que só use um carro de cada vez. E mesmo que usasse dois, ambos pagariam o pedágio do mesmo jeito!

 

 

(Mas se este carro zero km estiver sem o licenciamento ou sem a inspeção veicular será recolhido ao pátio...)

 

Recentemente uma estudante de jornalismo gaúcha provou (ou tentou provar) que a cobrança de pedágio é ilegal por se constituir bitributação. Como no preço da gasolina já está incluído o imposto destinado ao DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte, que cuida da conservação de estradas), o pedágio seria uma cobrança ilegal. Todo mundo sabe, mas parece que esquece ou prefere não lembrar, mas o IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor) é um bonito nome para um velho imposto: a TRU, Taxa Rodoviária Única, lembra disso? A TRU não foi extinta, ela mudou o nome para IPVA! Ou seja, se o IPVA é a ex-TRU rebatizada, então já é uma taxa rodoviária e não poderia existir o pedágio! Para oficializar o escandaloso caso de bitributação, com a volta do pedágio, mudaram o nome do imposto, simples! Portanto, a estudante de jornalismo pode argumentar que se trata de uma tri-tributação! É pouco, para um país que é penta!

 

O Brasil está sendo doado às empresas privadas. DPVAT e rodovias são administradas por empresas privadas. Se a verba que a União deixou de investir na conservação das estradas fosse usada para saúde pública, ensino, segurança, vá lá, seria aceitável esta “privatização” das rodovias. Mas a verba que o Estado deixou de usar nas estradas caiu neste sumidouro de dinheiro chamado erário e sabe-se lá onde foi parar!

 

A inspeção veicular também é gerenciada por uma morosa e descaradamente despreparada empresa privada chamada Controlar que nem sequer dispõe de um telefone 0800 para atender seus “clientes”. Mesmo que o cidadão pague a taxa obrigatória, em dinheiro, à vista, no site da empresa, a liberação para fazer a inspeção demora três dias úteis. Se o veículo estiver apreendido são mais três dias pagando a taxa de “hospedagem”. Ah sim, o seu veículo zero quilômetro apreendido por falta do pagamento de uma taxa de R$ 53,00 será rebocado em um guincho de uma empresa privada, ficará no pátio de uma empresa privada e os preços são totalmente fora da realidade. Da nossa realidade, claro.

 

Eu sonho com o dia em que a palavra do cidadão tiver mais peso do que o reconhecimento da assinatura por um sujeito que nunca te viu na vida. Sonho com o fim desta instituição anacrônica, resquício da monarquia, chamada cartório. Se nunca mais soubéssemos de um caso de falsificação de documento eu seria o primeiro a sair nas ruas empunhando a bandeira pró-cartório. Mas este monumento à burocracia continua emperrando nossas vidas e os carros roubados continuam sendo esquentados, os terrenos continuam sendo grilados e contratos são falsificados diariamente.

 

Mas eu sonho mesmo com o dia que o Brasil voltará a ser um país normal e o peso do Estado deixará de ser um pesadelo na nossa vida!

 

publicado por motite às 21:03
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10 comentários:
De Luciano a 29 de Junho de 2011
Tite ,

Faz bastante tempo que acompanho seu blog, já li várias vezes seu livro e também tenho o seu DVD. Ou seja, sou seu fã! rsrsrsr

Gostaria de te fazer um pedido. Já percebi em outros posts , e pela foto que abre este texto, que você tem uma certa "implicância" com carros antigos. Por favor, não confunda carro velho com carro antigo. Esta diferença existe, e é bem clara.

Carros velhos são essas tranqueiras caindo aos pedaços, com pneus carecas, lanternas quebradas, escape furado, pára-choques caindo, que nós vemos com grande frequência, e que colocam em risco tanto seus passageiros quantos os demais veículos próximos a ele. Normalmente seus motoristas não tem respeito nenhum à legislação de trânsito, e por vezes acumulam multas em valores maiores do que o do próprio carro. Eu concordo plenamente que esses carros tem que ser retirados das nossas ruas, e que ao contrário desta isenção absurda, eles deveriam é pagar o dobro ou o triplo do IPVA de um carro novo.

Carros antigos também são carros com certa idade, mas, ao contrários dos carros velhos, a regra é que eles estejam em bom estado de conservação (isso para não dizer melhor do que muitos semi-novos ), e que normalmente são conduzidos pelos seus donos com todo o cuidado do mundo. Estes carros não são vistos com tanta frequência, principalmente em dias úteis e trânsito pesado, porque geralmente seus donos só os tiram da garagem para passeios de lazer. Certamente já deve ter ocorrido, mas eu nunca ouvi falar de um carro placa preta ter se envolvido em um acidente. O risco real que esses carros oferecem é o de distrair algum outro motorista, aquela famosa virada de pescoço para continuar olhando, e este acabar se envolvendo em algum acidente. Estes são os carros que nós vemos em encontros de carros ANTIGOS (não encontros de tuning , xuning , campeonatos de som automotivo e afins), são os carros de associados aos Veteran Car Club , por exemplo.

Trazendo para o mundo das duas rodas, não fazer esta distinção seria como colocar no mesmo nível Harley Flathead 1950 restaurada e uma CG Today caindo aos pedaços. as diferenças são muito grandes e não podem ser ignoradas.

Eu concordaria completamente com o seu post se a primeira foto, ao invés de ser uma foto de um carro antigo, fosse de uma foto de um carro velho. Me desculpe pela chatice , mas acredito que meu ponto de vista é compartilhado pela maioria dos amantes de carros e motos.

Um grande abraço,

Luciano
De motite a 29 de Junho de 2011
Tem razão, Luciano, vou trocar a foto. Não achei a foto de um carro detomnado pra ilustrar. Mas já achei uma ótima e vou trocar. Vc tem razão!

Eu vendi minha querida Rural 1974, chamada Thuga, porque disseram que a inspeção veicular impediria estes carros de circular em SP. Isso foi em 1995. Eu era muito ingênuo mesmo... podia ter ficado com ela, restaurado e solicitado as placas pretas pra ir nos encontros expor a Thuga!

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