Segunda-feira, 23 de Junho de 2008

Questão de peso

Suzuki GSX-R 750: leve, mas cara!

Fuçando nos meus arquivos achei uma matéria técnica que nunca foi publicada e decidi postar aqui pra dividir apenas com meus amigos especiais...

Questão de peso

 A tecnologia conseguiu reduzir tanto o peso das motos que a pergunta mais freqüente é: onde vamos chegar?
 
O peso sempre foi uma questão muito discutida em motos desde os primórdios da industrialização. A equação é muito simples: quanto menos massa tiver o veículo menor será a força necessária para movimentá-lo. A partir dessa simples constatação as fábricas desenvolvem projetos que consigam estabelecer uma correta sincronia entre peso, resistência e preço, sim porque materiais leves muitas vezes significam materiais caros.
 
Tudo começa nessa questão essencial: resistência! A moto se caracteriza por ser um veículo que sofre diversas ações externas de alta intensidade. Basta imaginar um motociclista de 120 kg montado no banco para acreditar na necessidade de uma boa dose de resistência. Para complicar ele ainda leva a namorada de 80 kg na garupa! Depois imagine esses 200 kg em movimento passando por buracos, fazendo curvas e freando. Toda essa massa se deslocando provocará na moto as mais diferentes torções, começando pelas rodas e terminando na espuma do banco! Para dimensionar e projetar uma moto a fábrica precisa levar tudo isso em conta.
 
No começo da industrialização acreditava-se que resistência estava associada à dureza e isso levava à imagens de materiais grossos, duros e... pesados! Algo como um sino de Igreja. A Igreja inteira podia desmoronar em um terremoto, mas o sino ficava lá, inteiro! Sabia-se que o ferro e o aço eram os materiais mais resistentes para construir um veículo como a moto, sujeito a tantas solicitações. Talvez isso explique uma das razões de as primeiras motos de grande cilindrada como 500 ou 1.000 cc terem desempenho limitado. Eram praticamente feitas de ferro!
 
(antigamente, as motos eram praticamente de ferro)
 
A pesquisa com novos materiais trouxe inicialmente as ligas metálicas combinadas, ou a chamada liga-leve. A primeira grande descoberta para reduzir peso foi o alumínio, material leve, de alta resistência às torções, mas baixa resistência impactos. Mas quando misturado a outros metais como magnésio e mesmo aço consegue combinar as três exigências mais elementares: resistência à torção, ao impacto e ao calor!
 
Cristal
O resultado das pesquisas com materiais considerados nobres evoluiu tanto que chegou até nos mais sintéticos como o plástico. Feito a partir de matéria prima sintética o plástico entrou pra valer nas motos a partir do final dos anos 70. No começo era considerado caro por exigir ferramentas de produção sofisticadas, mas a popularização do plástico levou à grande escala e conseqüentemente ao baixo preço. Hoje as motos são feitas basicamente de plástico e ligas leves. O aço entra raramente em peças sujeitas à forte ação do calor, ou passíveis de torções, como o quadro. Quando misturado com ligas nobres como cromo e molibdênio, forma o aço-cromo-molibdênio, com grande capacidade de resistência às torções, mas maleável.
 
O maior desafio da indústria atual é conciliar resistência com elasticidade. As motos esportivas como a Suzuki GSX-R 750 têm quadro de alumínio feito para resistir às severas solicitações de curvas, frenagens e acelerações. Basta imaginar que uma das poucas peças que sem mantém nas motos que disputam o mundial de Superbike e Supersport é o quadro. Ele é o mesmo que equipa as motos esportivas vendidas ao público.
 
Para conseguir segurar a barra de tanto esforço o quadro precisa ser “duro” (além de leve). Mas existe um limite para essa dureza. Veja o cristal: é um material extremamente duro, mas que se quebra facilmente quando submetido a um impacto. O quadro de moto precisa oferecer a resistência, mas ao mesmo tempo precisa ser capaz de permitir alguma leve capacidade de torção para não quebrar ao meio quando a moto cair de leve, por exemplo. Naquelas cenas assustadoras de quedas em corridas é comum ver a moto se dividir em várias partes, porque ela ficou tão dura que se quebra como um cristal.
 
Peso, massa e gravidade
De acordo com a engenharia quando se fala em movimento não devemos usar a expressão peso, mas sim massa. Como já foi possível perceber o peso (ou massa) da moto em movimento tem vital importância porque, ao contrário do automóvel, o componente humano tem um fator determinante. Um piloto de 85 kg montado em uma moto de 170 kg representa 50% da massa do veículo. Já num automóvel de 900 kg o mesmo motorista representa apenas 10% da massa. Por causa dessa imensa diferença as motos são projetadas levando em conta a posição do ser humano em relação à máquina.
 
Nas motos esportivas, tanto de velocidade quanto de cross e enduro as massas precisam ficar concentradas na parte dianteira para dar aderência à roda dianteira. Em competição, seja no asfalto ou na terra, tudo que um piloto precisa é ter a frente colada no chão e com muita precisão. Já a traseira pode (e às vezes deve) derrapar porque é fácil de corrigir. Ao observar uma moto fora-de-estrada nota-se que em algumas o banco chega quase ao guidão! O piloto pode literalmente sentar em cima do tanque de gasolina! A idéia é aumentar o deslocamento de massa para a roda que conta com maior capacidade de frenagem (por isso essas motos têm freios maiores e mais potentes na frente). As motos esportivas têm uma distribuição com 51% de peso no eixo dianteiro e 49% no traseiro.
 
(motocross tem peso concentrado na dianteira)
 
Outra preocupação nas motos esportivas é rebaixar o centro de gravidade. Quanto mais próximo do solo o piloto se posicionar mais baixo será o centro de gravidade. Mas então como explicar que as motos esportivas estão cada vez mais altas? Algumas chegam a mais de 80 cm de altura do banco ao solo! A resposta está na dinâmica da pilotagem. Ao deslocar o banco e as pedaleiras para cima as motos esportivas conseguem inclinar mais nas curvas pois elimina a possibilidade de raspar as pedaleiras no asfalto. E quanto mais o piloto inclina, mais perto ele fica do solo e... quanto mais perto do solo mais baixo será o centro de gravidade. Em suma, as motos esportivas foram projetadas para serem estáveis nas CURVAS! Uma moto estilo racing tem a estabilidade em reta muito frágil, aliás ela é toda feita para fazer curvas!
 
Já nas motos touring (estradeiras), que rodam essencialmente em retas e privilegiam o conforto, a distribuição de pesos é neutra, ou seja, metade pra cada lado. Nessas motos o piloto fica praticamente no centro. Já em uma moto custom, o piloto fica praticamente sentado na suspensão traseira. Percebe-se que a distribuição de peso está concentrada da metade para trás. Por isso os freios traseiros são maiores do que nas motos esportivas.
 
Essa diferença na distribuição de massa tem um papel fundamental na pilotagem. Quem monta em motos esportivas precisa saber que terá de concentrar a frenagem nos freios dianteiros. Já quem roda com motos touring pode distribuir mais força no freio traseiro, dividindo em 50% para cada roda e os usuários de motos custom podem jogar mais responsabilidade para o freio traseiro que a moto pára de forma mais equilibrada, principalmente se tiver com garupa e mais as malas laterais que concentram ainda mais massa na traseira.
 
(moto custom tem peso mais concentrado na traseira)
 
O preço da leveza
Depois e quebrarem a cabeça reduzindo ao máximo o peso da estrutura, as fábricas também passaram a investir na redução do peso do motor. O motor representa uma bela porcentagem da massa total das motos e trabalhar com materiais mais leves, sobretudo nas peças móveis, ainda significa aumentar a rotação e a potência. Quanto menos massa o motor tiver de girar, mais alta pode chegar a rotação e o resultado é melhora da potência e redução do consumo. Só para ter uma idéia de como pode ser um trabalho de reengenharia de um motor, a BMW conseguiu reduzir 30 kg do motor da mais recente versão da R 1200 GS! O resultado é uma moto mais fácil de pilotar, com menos vibração, maior potência e menor consumo! Tirar 5 gramas de um pistão já representa uma grande diferença, principalmente se o motor tiver 4 pistões!
 
O que explica uma moto 250 cc ser mais pesada do que uma outra de 750cc? Está condicionado ao custo. O aço (ou ferro) é a matéria prima mais abundante na natureza e sua extração é relativamente fácil e barata. O ideal seria fazer uma moto 100% de alumínio e plástico, mas o custo seria assustador! A equação custo/benefício determina o uso de materiais menos caros e mais pesados. Algumas soluções intermediárias podem ser adotadas como na Honda Twister 250 que tem chassi tubular de aço, mas a balança traseira de alumínio.
 
Claro que existem motos de 250 cc muito leves, mas quem vai querer pagar em uma 250 quase o mesmo preço de uma 600? Como se vê, tudo é uma questão de peso: seja do material ou da mala de dinheiro!
 
Quando o peso é bom!
Já que todo mundo concorda que as motos precisam ser leves, como explicar motos de mais de 300 kg? Aí entra em cena uma teoria da física conhecido como MRU – Movimento Retilíneo Uniforme. Todo corpo em movimento tende a se manter em movimento quanto maior for a velocidade e a massa. É a primeira lei de Newton: a inércia! As motos touring e custom precisam de estabilidade e conforto em reta. Por isso o piloto fica posicionado bem baixo, perto do solo, rebaixando o centro de gravidade quando a moto está “em pé”. Nesses casos não há uma preocupação tão grande com a redução de peso, pois não é tão determinante no desempenho.
 
Algumas vezes para privilegiar o conforto é preciso adicionar peso. Quanto maiores – e mais pesados - forem os contrapesos do virabrequim menor será a vibração transmitida pelo motor. Por isso quando se fala em massas e pesos toda equação se concentra no objetivo do projeto. Motos rápidas precisam ser leves; motos confortáveis podem ser mais gordinhas.

 

 

publicado por motite às 02:30
link | comentar | favorito
19 comentários:
De Rogério Miron a 23 de Junho de 2008
... Tite, excelente matéria.. ! Agradeço por tê-la postado aqui. Como havia dito, sou estudante de engenharia e adoro essas coisas. Fiz prova sobre um assunto semelhante semana passada. Permita-me completar dizendo que a resistência do ar é brutal em altas velocidades e é muito importante leva-la em consideração nas esportivas. Cálculos demonstram que: para se dobrar a velocidade final de um veículo, deve-se aumentar a potência 8 vezes. E que a velocidade final não depende da massa, mas a aceleração sim. Mais uma - a força de atrito não depende da área de contato, ou seja, um pneu mais largo melhora a estabilidade, mas não aumenta a capacidade de fazer curvas fechadas. Legal de mais né.. !!?. Desculpe-me Tite. Empolguei.. hehehe.
De motite a 23 de Junho de 2008
Então Nishi e Roger, agora vcs entendem porque eu prefiro sair ods meios convencionais. Muitos anos atrás eu escrevi que a massa não interfere na velocidade final e que pneu mais largo não melhora a estabilidade. Sabe o que aconteceu?

Vários "especialistas" escreveram dizendo que eu era loko, burro, ignorante, não entendia nada e que massa altera a velocidade final sim, senão as motos de corrida seriam pesadas.

Os burros não sabem que corrida não se ganha com maior velocidade, mas com melhor aceleração, seja positiva ou negativa. Quem acelera mais cedo e freia mais tarde ganha corrida. Pra conseguir irro é preciso ser leve!!!

Prefiro ter poucos (e ótimos) leitores a continuar escrevendo pra uma massa de semianalfabetos!

Ah sim, sobre a área frontal, sabe porque a Ducati deu um vareio nas motos japonesas, mesmo usando um chassi tacanho e um motor de 5 décadas atrás??? Porque ela é fina como uma flecha, ela ganha na menor resistência aerodinâmica. Pra melhorar o Caseu Stoner tem 1,55m!!!

Comentar post

.mais sobre mim


. ver perfil

. seguir perfil

. 14 seguidores

.Procura aqui

.Setembro 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30

.Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

.posts recentes

. A pequena grande Triumph:...

. Prostatite final – Amor e...

. Prostatite parte 10: a vo...

. Prostatite 9: uma separaç...

. Prostatite parte 8 - A f...

. Prostatite parte 7: Começ...

. Prostatite parte 6: a hor...

. Prostatite 5: Sex and the...

. Prostatite 4: você tem me...

. Prostatite 3: então, qual...

.arquivos

. Setembro 2024

. Junho 2024

. Fevereiro 2024

. Janeiro 2024

. Dezembro 2023

. Novembro 2023

. Outubro 2023

. Julho 2023

. Maio 2023

. Janeiro 2023

. Novembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Julho 2019

. Junho 2019

. Março 2019

. Junho 2018

. Abril 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Março 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds