(Parece balinhas de goma, mas não é!)
Quando se trata de pilotagem, a principal regra que ensino no curso SpeedMaster de Pilotagem é “Não basta ver, é preciso pré-ver”. A previsão é a capacidade de ver antes. Mas não se trata de mágica, nem telepatia, é apenas uma capacidade que se adquire com a experiência. Entrar em uma curva cega a 160 km/h, por exemplo, é uma demonstração de tremenda incapacidade de prever uma situação inesperada. Ou, em outras palavras, é uma enorme burrice!
Normalmente não gosto de jogar confete na minha cabeça, mas enquanto fico mantendo uma postura “low profile” com relação à minha especialização, vejo pessoas que chegaram agora no mercado de motos posando de “especialistas”. Então, aqui vai um texto auto-promocional, mas que deveria se chamar de moto-promocional!
Em 2000 eu era redator colaborador da revista Auto Esporte, na época que considero a melhor fase desta revista. Ao meu lado eu tinha profissionais de extrema competência e elevado conhecimento técnico. Bob Sharp, Caio Moraes, Eduardo Dória, Luca Bassani, Rodolpho Siqueira, Fabrício Samaha e outros jornalistas do primeiro escalão. Foi em uma reunião de pauta com algum colega gripado (provavelmente eu mesmo) que surgiu a idéia de fazer um artigo sobre a atuação dos remédios nos motoristas. Fui escalado para produzir o artigo e fui pesquisar na Abramet – Associação Brasileira de Acidentes e Medicina de Tráfego – o que existia a esse respeito. O resultado foi surpreendente, porque os remédios são muito mais perigosos do que normalmente pensamos. Sobretudo no Brasil, onde a prática da auto-medicação é recorrente entre grande parte da população.
Para minha surpresa, em abril de 2009 a Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária – sugeriu que os remédios recebessem a advertência no rótulo: “Remédio, se tomar não dirija”. Será que minha bola de cristal era tão eficiente assim? Não, claro, porque senão já teria acertado as seis dezenas da Mega Sena. Na verdade essa determinação da Anvisa é uma tendência mundial. Só que nós previmos isso nove anos atrás!
Alguém aí quer se consultar comigo? Eu leio mão, faça amarração de amor, tarô, vidência, etc. Ah, pagamento adiantado!
Leia a íntegra da matéria sobre remédios, publicada em 2000. E depois o artigo da colega Fernanda Aranda, da Agência Estado, publicada em abril de 2009.
Santo remédio
Torcicolo, dor de dente, joanete, cefaléia, espinhela caída, tosse, calvície, herpes, broxismo. Todo mundo fica doente e sabe muito bem qual remédio tomar. Além dos remédios caseiros, a base de chás, farmacopéias milagrosas e simpatias, os doentes recorrem aos medicamentos vendidos em qualquer lugar, como se fossem chicletes. Uma das manias nacionais é a auto-medicação. É um tal de tomar remédio sem consultar especialistas, mesmo quando o medicamento pode provocar reações adversas que vão desde a perda da acuidade visual, até a tontura e a sonolência. Pior, muitos dos remédios comprados aleatoriamente até em supermercados contém substâncias que interferem no sistema nervoso central, podendo ser causadores de acidentes no trânsito.
Segundos dados da Abramet – Associação Brasileira de Acidentes e Medicina de Tráfego –, em um artigo de autoria da especialista em Medicina de Tráfego, Dra. Ilham Taha, dois terços dos acidentes são provocados por falha humana, e o uso indiscriminado de medicamentos podem ser contribuintes para aumentar esta estatística. Entre as drogas lícitas mais usadas estão os antihistamínicos (para alergia), antiinflamatórios, analgésicos, antiasmáticos, antigripais, antiespasmódicos e antitussígenos.
Os antigripais, por exemplo, contêm antihistamínicos, analgésicos, sedativos de tosse, vasopressores, estimulantes, entre outros, que podem provocar como efeitos colaterais a sonolência ou sedação.Os vasopressores, presentes na maioria dos antigripais, podem ter o cloridrato de fenilpropalonamina, cujos efeitos colaterais podem variar entre ansiedade, tremor, excitabilidade, insônia ou arritmia. Já os antihistamínicos (anti alérgicos) que contêm cinarizina, tomado em larga escala, podem provocar a sedação (sonolência e depressão). Em compensação, os antihistamínicos com cetirizina não apresentam efeitos neurodepressores.
Alguém pode estar se perguntando: mas como saber se o meu remédio tem estes elementos? Muito simples, atualmente todos os remédios são obrigados a exibir no rótulo o nome genérico (princípio ativo) abaixo do nome comercial. Por exemplo, o antiemético (remédio para enjôo) Dramin, tem como nome genérico Dimenidrato, que causa sonolência e depressão do sistema nervoso central. Não espere que o balconista vá entender nomes como Cetoprofeno, Naproxeno, Paracetamol, Benzodiazepínico, Diclofenaco ou Piroxicam, mas nomes como Anador, Naldecon, Feldene, Dorflex, Tylenol são bem conhecidos e consumidos como se fossem balinhas de goma.
Além destes medicamentos conhecidos, com efeitos colaterais explicados na bula, existem ainda os remédios com componentes antipsicóticos ou hipnóticos, que são totalmente contra-indicados para quem está dirigindo. Para estes casos o ideal seria um acompanhamento médico, com orientação no sentido de contra-indicar o uso de veículos pelo menos no início do tratamento, quando o organismo ainda está se acostumando com a droga.
Falando em droga, os especialistas fazem questão de lembrar que muitos remédios têm seus efeitos potencializados quando misturados com álcool. Mas não vá pensar que isto significa que vai sarar mais depressa se tomar xarope com uísque. Na verdade os efeitos colaterais é que são potencializados. A sonolência pode ficar ainda mais sonolenta e a depressão mais depressiva. Como regra de vida, motociclistas e motoristas deveriam antes de tudo acabar com esta bagunça da auto-medicação (ou moto-medicação). Os remédios, por mais inócuos que pareçam, trazem efeitos que podem agravar uma situação já crítica. Um motociclista com histórico de apnéia do sono, por exemplo (aqueles que não conseguem dormir por problemas respiratórios), já sofrem de sonolência naturalmente. Quando sob medicamento, podem ficar ainda pior e maissszzzzzzzzzzz perigosozzzzz.
Remédio terá ""se tomar, não dirija"
Mudança em rótulos deve valer em dezembro; governo fará campanha na TV e empresa, panfletagem em pedágio
Por: Fernanda Aranda, Ag. Estado. 18/4/2009
O governo federal deu o primeiro passo para a entrada em vigor de uma "lei seca" para medicamentos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quer que todas as embalagens de remédios que provoquem sonolência ou efeito sedativo (analgésicos, antialérgicos, antibióticos e psicotrópicos) venham com a mensagem de alerta "se tomar, não dirija". A proposta de restrição, que por ora não prevê nenhuma multa, tem o objetivo de reduzir acidentes.
Para entrar em vigor, o projeto passará por um processo de consulta pública até o dia 11. "Vamos receber sugestões da indústria, dos consumidores e da comunidade médica. Depois, quando o texto estiver consolidado, passará pela diretoria colegiada da Anvisa", afirma a gerente-geral de Medicamentos, Nur Shuquiara, que até dezembro pretende publicar a mudança das embalagens.
A medida de alertar os riscos ao volante atende às reivindicações de dois ministros do País: o da Saúde, José Gomes Temporão; e o das Cidades, Márcio Fortes. Ambos já afirmaram ser necessária uma proposta mais incisiva de restrição à direção para quem estiver sujeito aos efeitos de medicamentos. Fortes levanta uma bandeira pessoal na causa. Seu filho morreu aos 23 anos em um acidente de carro no Rio, em 2004. Análises mostraram que a tragédia foi influenciada pela ingestão de altas doses de antibióticos - para contornar uma dor de dente - durante a semana.
"Antes de pensarmos em uma lei, precisamos fazer uma campanha de conscientização porque ainda é muito pouco conhecido o impacto que os remédios podem acarretar na direção", afirma Fortes, que é responsável pelo Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN), que dita as regras viárias. "Por isso, já planejamos que as próximas propagandas na televisão serão sobre isso", afirmou o ministro. Os custos das campanhas publicitárias serão pagos pelos R$ 120 milhões disponíveis por ano de recursos que vêm de multas e do seguro obrigatório (DPVAT).
Ainda não existem estudos científicos que comprovem a relação entre acidentes automobilísticos e uso de remédios. Mas o que sustenta a proposta do governo são três fatores principais: as 35 mil mortes anuais no trânsito brasileiro; o hábito da automedicação, praticado por 40% da população, o que aumenta o desconhecimento dos efeitos na direção; além do aumento na idade dos motoristas (os condutores com mais de 60 anos na capital paulista representavam 8,2% do total em 2003 e hoje já somam 9,8%). Nessa faixa etária, normalmente se precisa tomar mais remédios ao mesmo tempo. "O uso agregado de várias drogas pode potencializar os efeitos na direção", observa Fortes.
A Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) já se posicionou de forma favorável à proposta e defende que os profissionais médicos de todas especialidades orientem os pacientes sobre os riscos. A General Motors também já está envolvida e organizou uma panfletagem, que deve ser feita em pedágios, para alertar os motoristas.