Moto + skate: dupla perfeita para fugir dos problemas!
Uma avalanche de erros que destruíram uma história
Consigo lembrar com exatidão e riqueza de detalhes os dois dias mais tristes da minha vida. O primeiro foi em 1992, quando levei minhas filhas para o aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, SP, para embarcarem para a Alemanha. Mas não era a turismo. Era uma viagem só de ida, sem previsão de retorno.
Foi uma separação totalmente equivocada. Não deveria nunca ter acontecido, mas eu era jovem, inexperiente, arrogante e... cereja do bolo, teimoso! Na época os mais velhos tentaram me convencer de todo jeito a manter a união, a família em primeiro lugar e todas as frases clichês do mundo. Mas eu era teimoso e fui em frente com a separação. O que considero hoje como o maior erro de toda a minha vida.
A mãe delas, com dupla cidadania, conseguiu um bom emprego na Alemanha e partiu com as meninas. Não era uma ameaça, nem uma possibilidade, era real e eu estava no portão de embarque da ala internacional, entregando duas crianças muito amadas para uma possível viagem sem volta.
Para não piorar ainda mais o clima me mantive firme, otimista e bem humorado até elas virarem o corredor em direção ao raio-x. Lembro da carinha delas, agarradas a seus bichos de pelúcia, sem derramar uma lágrima. Quando elas sumiram atrás do labirinto de filas fui correndo pro banheiro, me tranquei num cubículo e desandei a chorar copiosamente como nunca tinha chorado na vida. Chorava e questionava se tinha realmente tomado a decisão correta.
O segundo dia mais triste foi recente. Bem recente. Em setembro de 2023 para ser mais exato, uma quinta-feira. Foi o dia que vi Maria embarcar com nossos cachorros e boa parte de nossas vidas, em direção ao Nordeste em uma mudança de endereço e de vida. Com ajuda do meu grande amigo Café, dono e motorista de uma enorme van, ela embarcou tudo, entrou na cabine e aquela van saiu da frente do portão. Fiquei esperando virar a esquina e entrei em casa.
Lá dentro um enorme vazio. Ainda tinha móveis, vasos, objetos, utensílios de cozinha, roupa no varal, sofá, TV, quadros (alguns pintados por ela), mas o que mais eu via ali dentro era um enorme vazio. E veio de novo o choro copioso, seguido novamente da mesma pergunta que me persegue: será que tomei a decisão certa?
Este é o grande dilema das decisões: nunca saberemos se foi a certa ou errada porque não existem duas vidas paralelas.
A dança das rodinhas
Quando percebi que minha vida não seria mais a mesma, que teria de sublimar o sexo e que minha união estava caminhando a passos largos rumo a um abismo, me refugiei na única coisa que me dava prazer: skate!
A forma como o skate entrou na minha vida foi totalmente aleatória, como quase tudo na minha história. Depois de engordar quase 10 quilos por pura preguiça de fazer atividades físicas, achei que era hora de me mexer. Bem nesse momento uma amiga jornalista de mudança para Manaus anunciou um skate à venda.
– É isso – pensei – skate pode ser divertido! Liguei, fui até ela e saí com um skate amarrado na moto.
A última vez que tinha andado de skate tinha sido aos 14 anos, numa coisa que eu mesmo fiz a partir de um patim Torlay e um pedaço de madeira. Recentemente alguém duvidou disso e eu refiz esse skate primitivo com um patim velho que ganhei de presente. Se tiver curiosidade de saber como ficou clique AQUI.
Depois de uma volta meio desajeitada pelo Ibirapuera fui conhecer a ladeira do Museu do Ipiranga. Na primeira descida alucinei de um jeito que peguei o vírus do skate. Comprei trucks, rodas, rolamentos, dezenas de peças e fui montando um skate para cada finalidade. Não sei fazer nenhuma manobra, não ando em pistas, nem em pump track, só em ladeiras, tipo surfe de marola.
Perto das minhas atividades anteriores (motovelocidade e escalada) o skate era muito barato: basta um litro de gasolina na moto. A maioria dos itens eu nem comprei, mas troquei com a turma do down hill por macacões de couro de moto. Em apenas seis meses de atividade já tinha emagrecido seis quilos e adotei um novo estilo de vida que girava em torno do skate. E foi no skate que me refugiei quando a maionese da minha vida desandou.
Aos 58 anos, pós operado, sem perspectivas de nada, usei o skate como fuga para os meus reais problemas. Enquanto isso Maria tentava lutar pelo que ainda tinha sobrado da nossa união. Mas eu não via essa luta. Na minha cabeça só pensava em libertá-la de uma vida sem graça ao lado de um velho castrado e comecei o movimento para a separação. Uma decisão de mão única porque em nenhum momento pensei em perguntar a opinião dela.
Na minha cabeça doente esta era a melhor solução para os dois. Quando na verdade era a melhor solução para mim. Pelo menos eu achava. Mais uma vez faltou diálogo e até ajuda de especialistas em mediação. Faltou investir em uma relação que já durava quase 20 anos. Preferi o caminho que adotei várias vezes na vida diante de alguma dificuldade: desistir.
De tanto eu insistir ela acabou cedendo e se mudou para uma casa bem perto, com a proposta inicial de continuarmos um casal, mas morando em casas separadas. Uma imagem que pode ser muito bonita em filmes e novelas, porque na vida como ela é deu muito errado. Faltou a combinação tácita e clara de objetivos: ela saiu de casa pensando que ainda éramos um casal; eu fiquei em casa com a certeza de que não seríamos mais um casal.
De um lado eu imaginava que estava tudo bem: levava uma vida e solteiro, sem me interessar por nenhuma mulher, dava as aulas de pilotagem, andava de skate todo santo dia. Do outro lado ela continuava cozinhando pra mim, cuidando no nosso jardim, contratando a faxineira, cuidando do “nosso” lar como se fôssemos ainda casados, mas com CEPs diferentes.
Estava claro que aquela situação não ia dar certo. E não deu mesmo.
(Continua...)
Como é morrer sem ser enterrado
Uma vez li que quanto mais cedo a pessoa começa a vida sexual, mais tarde ela abandona. Nunca entendi muito bem o que quis dizer, mas no livro “Memórias de minhas putas tristes”, de Gabriel Garcia Marquez, o personagem – anônimo – tem tanto medo de se apaixonar que passa a vida inteira se relacionando apenas com prostitutas. Até completar 90 anos e dar-se de presente uma noite com uma moça virgem, que... não, não vou dar spoiler. Pelo menos na visão do escritor é possível fazer sexo até quase o fim da vida, mesmo antes dos remédios!
O interessante deste livro de leitura rápida e fácil é que trabalha com um dos maiores medos dos homens, especialmente os latinos: a impotência. Não confundir com broxar, que é um “acidente” ocasional. A impotência que me refiro é a permanente, aquela que não tem volta. Ou, com muita sorte, volta com ajuda de remédios.
Foi para esta impotência que fui apresentado no período pós-operatório, logo depois de resolver a incontinência urinária. Chegava a hora de resolver a “questão da ereção”.
Passado o pós-operatório, recebi uma ligação do departamento de urologia da Universidade ligada ao hospital onde fui operado. O residente me explicou que eu deveria fazer consultas regulares para “trabalhar esta questão”, segundo palavras dele.
O ambiente em casa estava estranho. Eu não sabia como lidar com isso. Não procurei ajuda especializada e muito menos conversava com a minha mulher. É um assunto tabu. Difícil de abrir com qualquer pessoa. É uma ferida purulenta, incurável, mas interna, que ninguém vê. E quem tem não quer mostrar.
Na minha primeira consulta na Universidade fui atendido por uma médica jovem, de poucas palavras. Olhou meu prontuário médico, sabia todos os detalhes da cirurgia e encerrou a consulta com uma receita de Tadalafina 5mg diário e Citrato de Sildanefila 25 mg uma hora antes de transar. Só isso!
Com esta simples receita passei na farmácia, daquele jeito bem discreto como se estivesse comprando cocaína, e saí com a solução dos meus problemas. Na teoria.
Comecei tomando a Tadalafila 5mg todos os dias, mas ainda sem clima para propor uma experiência empírica com a mulher. Depois de alguns dias comecei a sentir uma leve taquicardia quando fazia algum esforço.
Também voltei a dar aulas de pilotagem de moto, mas ainda não aguentava ficar muito tempo montado na moto, nem em pé. Tinha de me posicionar meio e lado, revezando as bochechas da bunda pra não apoiar o períneo porque doía muito. Ou sustentar meu peso apenas nas pedaleiras, sem repousar a bunda no banco. Tipo piloto de motocross.
A taquicardia aumentou de intensidade e decidi voltar à urologista da universidade. Com muita demora consegui a consulta e ela argumentou que os remédios não causavam taquicardia e nem alteravam o funcionamento do coração, apesar de serem vasodilatadores. E ainda explicou:
- Você é novo, pode recuperar a função erétil sem dificuldade. Se sentir dificuldade para ter relação pode aumentar o Citrato de Sildanefila pra 50 mg ou tomar dois de 25.
OK, se a médica falou, quem sou eu pra contrariar. E chegou o tenso momento de testar a função erétil.
Até esse momento (desculpe-me se não lembro as datas, nem a cronologia exata) nós ainda dormíamos na mesma cama, no mesmo quarto. Uma noite pintou um clima e fomos para a experiência. Um desastre. Eu achava que a incontinência urinária estava controlada, mas na verdade ela estava se fingindo de morta.
Os exercícios para o assoalho pélvico conseguiram controlar a incontinência urinária à noite, durante o sono. Mas eu tinha vários episódios de escape de urina conforme os movimentos que fazia. Ao me levantar do sofá, por exemplo, ou dando uma remada mais forte no skate, ou até mesmo bocejando.
Algumas vezes era só uma gota, outras era um derramamento grande que chegava a aparecer pela calça. Pensa num constrangimento. Uma vez, ao me levantar em um restaurante, notei que minha calça estava molhada. Uma vergonha que não desejo a ninguém.
Mas o que rolou na primeira tentativa de fazer amor foi algo maior do que o desastre do Exxon Valdez. Quando eu fiz as entrevistas pré-operatórias o médico avisou que eu não teria mais ejaculação. É o tal “orgasmo seco”, mas preservaria a sensação de prazer. Mas eu não estava preparado para o que aconteceu. No momento do orgasmo em vez de líquido seminal saiu xixi que nem uma explosão de Coca-Cola chacoalhada. Como eu ainda não tinha ereção para penetração eu gozei fora. De repente a cama ficou toda molhada. Molhada e quente. Uma situação tão triste, constrangedora, humilhante e impactante que demoraria meses para tentar de novo.
Mesmo depois dessa experiência ainda tentamos mais duas vezes com o mesmo resultado desastroso. Um chafariz de xixi e o silêncio depois. Achei que essa situação já estava ruim demais pra continuar insistindo, mas a sensação de prazer ao gozar era a mesma de antes, pelo menos uma boa notícia: poderia continuar gozando - literalmente - a vida. Mas percebi que Maria também não se sentia à vontade para tentar novamente. Eu queria fazer amor mais para satisfazê-la, porque eu mesmo tinha perdido muito a vontade (a perda da libido está associada à prostatectomia radical). E ela, por sua vez, evitava porque não queria me constranger mais. Um momento que deveria ser acompanhado de muita conversa, ajuda e pesquisa. Mas embarcamos no silêncio.
Não tocamos mais no assunto, mas comecei a me fechar como uma concha. Sem perceber fui me distanciando e meu comportamento começou a mudar. Ficava irritado com facilidade, dificuldade de concentração, um vazio existencial como se vivesse no limbo. É o tal morrer sem ser enterrado que os poetas usam como metáfora para uma existência medíocre.
Parei com os remédios, o tempo foi passando, a situação em casa foi se deteriorando com a falta de diálogo sobre o tema e, aos poucos fui me conformando com a ideia de ser um eunuco. Às vésperas de completar 60 anos, casado há 19, com o fantasma da impotência rondando, comecei a pirar. Não que eu fosse um exemplo de equilíbrio emocional, mas começava a pensar seriamente na possibilidade de viver sem sexo pro resto da vida. E até mesmo se valia a pena continuar vivendo.
Por outro lado eu pensava “se tem gente que perde um braço, uma perna, a visão ou a audição e continua vivendo, por que eu morreria se ficar sem pau?”.
Por outras vezes pensava em castigo divino, por ter feito tanta cagada, causado tanto sofrimento graças a uma vida sexual desregrada e promíscua. Deus olhou lá de cima e pensou “vou mostrar pra esse salame que sexo não é a coisa mais importante da vida”. E plim, tirou o sexo de mim!
Olhava para Maria, doze anos mais nova do que eu, linda, cheia de vigor, tendo de conviver com um homem impotente. Comecei a pensar em separação para libertá-la deste destino. Como seria possível manter um casamento sem sexo? Mas foi um pensamento de mão única, porque homens e mulheres pensam diferente. Quando toquei no assunto “separação” pela primeira vez ela recusou peremptoriamente. A mulher protege a união com mais garra que o homem. Eu não sabia na época, mas ela acreditava no “até que a morte nos separe” e queria continuar comigo, de qualquer forma. Eu pensava em separação. Ela pensava em manutenção. É isso que difere homens de mulheres.
Hoje vejo que foi um engano desastroso. Primeiro porque é possível sim recuperar a função sexual. E depois porque é possível sim um casal manter o relacionamento sem sexo, se os dois forem criativos e bem assessorados por especialistas (sexólogos). Depois muitos anos, quando enfim procurei ajuda, a terapeuta olhou pra mim e disse: se o sexo só proporcionasse prazer para a mulher com penetração não existiriam lésbicas no mundo.
Constatação que veio tarde demais.
Vamos fugir
Lendo assim parece que foi tudo muito rápido. Mas não foi e não quero te encher o saco com tantos detalhes. A incontinência urinária estava quase controlada. Ainda escapava um pouco de urina quando eu fazia alguns movimentos. Nesta época ainda não sabia nada sobre fisioterapia específica para essa situação e aconteceu uma coincidência de datas que acabaria com meu atendimento gratuito na Universidade.
Para ter direito ao programa eu deveria comparecer a todas as consultas, uma vez por mês. Porém comecei a atender o mercado corporativo na área de segurança de trabalho. A Abtrans (minha empresa de segurança de trânsito) nasceu para atender pessoa física, mas a necessidade de reduzir afastamento de trabalho por acidente de percurso nos levou a atender algumas empresas. Em todo o Brasil. Por isso tive de faltar em duas consultas seguidas, o que me custou a exclusão do programa.
Sem apoio da Universidade, sem coragem para conversar em casa, sem perspectiva de melhoras, minha, ou melhor, nossa relação começou a ruir. Aos poucos fui evitando contato físico até tomar a pior e mais equivocada de todas as decisões: mudei de quarto. Até este dia, por 19 anos dormimos juntos, grudados e de conchinha. Quando eu me deitava repetia como um mantra “este é o momento mais gostoso do meu dia”. Dormir com ela zerava qualquer aborrecimento, doença, tristeza, dor, qualquer mazela. Era como abraçar a cura. E eu abri mão dela.
Começava aí uma sucessão de erros que precisam ser conhecidos de todos que passam por isso para que não se repitam. Minha principal recomendação para casais nesta situação: a recuperação é dos DOIS! Não tentem resolver isso sozinhos. Homens não gostam de falar, nem de ouvir. Mulheres adoram falar, mas também ouvir. Conversem. Não deixem o silêncio criar barreiras porque uma hora essa represa de sentimentos vai transbordar. E Brumadinho taí pra mostrar o que acontece quando rompe uma barragem.
Conformado com uma existência assexuada voltei pra minha rotina de skate pela manhã. À tarde passeava com os cachorros, fazia prospecção para o curso Abtrans e um ou outro trabalho jornalístico – muito mal remunerado, ou mesmo gratuito. Aos poucos fui perdendo a vontade de fazer as atividades que gostava, como escalar, velejar, viajar de moto, correr de kart, pedalar e... comecei a engordar!
Continuávamos levando uma vida de casal. Fazíamos TODAS as refeições juntos. Aliás essa era a parte da rotina que mantivemos todo tempo até a separação. Maria é uma excelente cozinheira. Sabe fazer qualquer prato e, se não souber, aprende e faz. Tanto doce quanto salgado. Qualquer outro homem que vivesse com ela alcançaria a obesidade mórbida em pouco tempo. Menos eu, que sempre fui um magro renitente.
Sempre fui magro. Tão magro que minha vó portuguesa só aceitava me levar à praia se eu ficasse de camiseta. Passei a infância ouvindo meu pai falar que eu tinha ameba. Acho que por isso eu me mantive magro mesmo comendo mais que lima nova.
A nossa vida como casal foi ótima. Apaixonei-me por ela desde o primeiro momento que a vi. E foi preciso de toda uma linha de acontecimentos para que eu a visse. A história desse encontro eu já contei no meu blog e você pode ler clicando AQUI. Foi uma história de amor de filme mesmo e sempre vou levar isso comigo. Nunca faltou amor em nossa relação. Mas faltou conversa, porque eu não gosto de falar.
Neste texto onde conto a história do nosso encontro tem a seguinte passagem:
“Normalmente sou um cara quieto. E tímido, acredite! Sempre fui quieto e, segundo minha mãe, quando era criança eu só falava com ela. Minha primeira professora dizia que levou seis meses para ouvir minha voz. Gosto de ficar quieto e nada é mais torturante do que "criar assunto". Acho que foi isso que fez de mim um escritor, sou melhor escrevendo do que falando.
Em apenas duas situações eu falo muito: quando estou doente ou nervoso”.
Hoje não sou mais assim. A atividade de ensinar me obrigou a virar a chave e me tornei um verborrágico incontrolável. Mas quando mais precisava falar eu me calei. E por não ter dito nada, já não posso dizer mais nada além de “desculpe”.
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