A pioneira de toda uma geração. Foto: Tite
Uma jovem senhora de 45 anos
Uma breve história da Honda CG, o veículo mais vendido do Brasil
Em 1976 a moeda era Cruzeiro Novo, a inflação era de mais de 1.000% ao ano e saber o valor das coisas era um grande exercício de adivinhação. O dólar nesta época equivalia a cerca de 10 Cruzeiros Novos ou NCr$ 10,00, como se grafava. O regime político era a ditadura militar e o presidente o general Ernesto Geisel. Minha grande preocupação nesta época era como fazer para me tornar um piloto de Fórmula 1. A segunda era qual faculdade fazer
Honda CB 125S, com motor de 14,5 CV e câmbio de cinco marchas, uma lenda!
Lembro claramente quando vi a primeira Honda CG 125 em 1976. Já esperava o lançamento, mas na verdade imaginava que seria a CB 125S, com o motor quatro tempos de 125cc,, comando OHC, câmbio de cinco marchas com engate tradicional. O que veio foi a CG 125 com o motor 4T de 125cc, mas comando OHV e câmbio de quatro marchas com todas pra baixo. Foi quase uma decepção, porque a CB 125 S era mais esportiva e tinha desenho mais moderno, como uma espécie de miniatura da CB 750Four.
Da decepção inicial veio a surpresa totalmente aleatória. Um amigo comprou uma assim que chegou na concessionária Fórmula G. Mas o objetivo era usar em Ilhabela e foi lá que andei pela primeira vez. O câmbio estranho com as quatro marchas pra baixo nem foi o que mais chamou atenção, mas o motor, que tinha bastante força em baixa, porém era barulhento e vibrava muito.
Painel da primeira CG com a trava de capacete. Foto: Tite.
Pouca gente sabe, mas os motores 125cc quatro tempos daquela época tinham uma elevada potência específica. No caso da CG 125 o motor tinha 12,5 CV o que equivalia a 100 CV por litro. E a CB 125S tinha 14 cavalos! Isso só era possível porque naquela época não havia a preocupação com as emissões de poluentes que temos hoje em dia.
O sucesso foi imediato e fez contraponto com a Yamaha, produtora de motos com motores dois tempos. A insistência (ou teimosia) da Yamaha no motor dois tempos seria determinante no eterno papel de coadjuvante da marca no Brasil. Aliás, uma das bobagens postadas nas redes sociais atualmente é que a Honda detinha a patente dos motores quatro tempos, o que teria prejudicado a Yamaha. Uma besteira sem tamanho, porque a Honda também produzia motos com motor 2T e a Yamaha produzia motos com motores 4T no Japão. Na verdade a Yamaha não acreditou no potencial do mercado brasileiro e quando percebeu o erro já era tarde demais.
O resultado da aposta certeira da Honda é que hoje, 45 anos depois da primeira CG sair da linha de montagem de Manaus mais de 13 milhões vieram atrás, tornando-se o veículo mais vendido da história da indústria brasileira.
CG 150 Titan no curso Abtrans: a moto que ensinou os brasileiros a pilotar. Foto: Tite
A mãe de todos
Com Pelé como garoto propaganda a Honda apostou todas as fichas na produção de uma moto simples, econômica e com mecânica robusta. O sucesso da CG 125 foi imediato e deu frutos, com os lançamentos das irmãs ML 125 e Turuna 125, esta última com um estilo esportivo que agradou em cheio.
Por mais de quatro décadas o nome CG virou sinônimo de moto. Mais ainda, de primeira moto e sonho de consumo de uma geração de brasileiros. Difícil encontrar algum motociclista que não tenha dados os primeiros passos em uma CG, porque é a moto mais usada pelas moto-escolas de todo do Brasil.
Pelé foi o garoto propaganda da primeira CG 125.
E não foi a professora apenas de motociclistas comuns, muitos bons pilotos são filhos da Fórmula Honda 125, categoria criada no final dos anos 1970 e que levou mais de 50 motos para um grid de largada em Interlagos. Desta categoria saíram pilotos de projeção nacional. Hoje a Honda CG está nas pistas em uma categoria para formação de jovens pilotos.
Muita coisa mudou na CG. As primeiras unidades ainda tinham muitos componentes fornecidos pela indústria brasileira. Como não havia fábrica de motos, os fornecedores eram da indústria automobilística, o que gerou alguns problemas. Motores de motos vibram mais e os fornecedores não conseguiam produzir peças mais resistentes. Além disso, o mercado de motos cresceu exponencialmente nos anos 1990. Saltou de 90.000 motos produzidas por ano para 60.000 motos produzidas por mês! Os fornecedores tradicionais não deram conta desse crescimento.
CG 160 Titan atual: nada a dever às motos produzidas em qualquer país do mundo. Foto: Tite
A solução adotada pela Honda foi a verticalização da produção. Atualmente a Honda fabrica praticamente 90% da CG e alguns dos poucos componentes que ainda não são feitos na planta de Manaus vem de algum fornecedor que tem a Honda como sócia investidora. Talvez só os pneus e a vela de ignição são de fornecedores externos, porém vizinhos à unidade de Manaus.
Moderna e eficiente
A evolução da CG 125 através do tempo foi surpreendente. O motor passou por várias atualizações para se adaptar às exigências ambientais. Veio a injeção eletrônica, o catalisador e na garupa dessas necessidades foi preciso um incremento na capacidade volumétrica (cilindrada) para compensar a perda de potência. Dos 124cc iniciais passou para 149 e hoje tem 162,7 cm3 e potência de 15 CV. Mais do que o aumento de volume, este motor atingiu um grau de eficiência difícil de ser encontrado. Todas as peças móveis são roletadas, o que reduz o atrito e aumenta a durabilidade. Feito para aguentar o ritmo alucinado dos quase 400.000 motofretistas que circulam em São Paulo e que elegeram a CG como veículo de trabalho.
Depois da precursora, chamada carinhosamente de CG “bolinha”, vieram a CG “quadrada” até o estilo atual, mais curvilíneo, com curvas suaves e laterais que lembram as irmãs maiores Twister e CB 500.
Suspensões e banco macios para rodar por horas seguidas. Foto: Caio Mattos.
Para celebrar os 45 anos de vida, a Honda lançou a geração mais nova da CG, agora com motor de 162,7 cm3, flex e convidou os jornalistas para um teste em São Paulo.
A mais nova
Descrever uma CG é um desafio porque é um dos produtos mais conhecidos do Brasil. Na linha 2022 toda família CG recebeu novidades no desenho e pequenos detalhes. Desde a simples Start 160 até a “luxuosa” Titan, todas tem freio combinado. Isso é uma forma de corrigir um erro histórico dos motociclistas brasileiros que não são acostumados a usar o freio dianteiro. Com o “combi brake” se o motociclista acionar apenas o pedal do freio traseiro parte do freio dianteiro também atua.
Só para exemplificar o que isso significa, uma CG 150 com freios convencionais a 45 km/h percorre 24 metros quando acionado apenas o freio traseiro. Na CG 160 com freio combinado essa distância cai para a metade quando se aciona apenas o freio traseiro.
Versão Fan, mais simples, mas a minha preferida. Foto: Caio Mattos.
Um dos aspectos que chama atenção em toda linha CG é o acabamento mesmo para uma moto simples. Sem exagero, qualquer modelo da CG poderia facilmente ser vendida na Europa sem deixar nada a desejar. Só não é mais exportada porque a produção precisa atender o mercado interno.
Outro item que mudou muito na CG é o conforto. Lembro claramente quando viajei com uma das primeiras CG 125 e cheguei “desmantelado”. E olha que tinha 40 anos a menos. Na CG atual o banco tem espuma tão bem calculada que até parece de gel. O conjunto de suspensão evoluiu e isso ajuda muito principalmente quem tem de passar até oito horas por dia trabalhando.
Evolução também no quadro, que passou de tubular para chapa estampada. Aqui a mudança foi puramente visando o processo de produção: estampar é muito mais rápido do que soldar um monte de canos. Como “efeito colateral” o quadro estampado deu flexibilidade e ajudou a reduzir as vibrações e melhorar o conforto. Na versão Cargo este chassi é reforçado para receber o baú.
Painel atual: sofisticação e muita informação. Foto: Caio Mattos.
Para mim, uma das grandes conquistas em termos de conforto foi a impressionante redução do nível de vibração e ruído. Quando ainda vemos alguma CG antiga rodando chega a assustar pelo ruído do escapamento. Nem dá pra acreditar que era original!
Depois da relação custo x benefício, o argumento de compra mais lembrado da família CG é a economia de combustível. De fato, acho que ninguém testou mais CG do que eu, já que tenho 40 anos como jornalista especializado. Sempre foi surpreendente o consumo, que ficou ainda melhor com a chegada da injeção eletrônica. Como eu mesmo tenho duas CG, uma 150 e outra 160, posso atestar que o consumo melhorou muito com o novo motor. Na Titan 150 eu fazia médias de consumo na faixa de 35 a 38 km/litro sem preocupação com economia. Já na Start 160 atual eu já consegui mais de 47 km/litro pilotando de forma suave, sem exceder os limites do bom senso.
Os modelos Titan, Cargo e Fan têm tanques com 16,1 litros de capacidade, já a Start tem tanque de 14,8 litros, o que projetam autonomias gigantes de mais de 600 km. Chega-se mesmo a esquecer da última vez que a moto foi abastecida.
Gráfico de vendas mostra que a CG é o veículo mais vendido do Brasil.
Um produto com tanto tempo de mercado e desenvolvimento é difícil achar uma crítica, mas tem. É estranho ver no século 21 uma moto que ainda conta com freios a tambor na roda dianteira. Até as bicicletas já usam freios a disco hidráulicos. Mas a explicação transcende a engenharia. Pode colocar na conta do Denatran e sua ridícula homologação das moto-escolas. Graças a um ensino totalmente precário e equivocado, os brasileiros não sabem usar os freios dianteiros. Mais ainda: no Nordeste os motociclistas têm tanto medo de acionar o freio dianteiro que alguns chegam a retirar a manete! Ninguém me contou, eu vi!!!
Quando a Honda retirou a CG 125 Fan do mercado, substituindo pela Titan com freio a disco, muitos motociclistas no Nordeste deixaram de comprar a moto. Sim, acredite, porque nas minhas andanças pelo Brasil para ministrar cursos cansei de ouvir que o freio dianteiro a disco da Titan fazia a moto “encapotar”, um verbo que só ouvi naquela região. Isso obrigou a Honda a voltar atrás e “relançar” uma versão com freio a tambor, batizada de Start. Graças ao freio combinado ainda corrigiu o transtorno do medo de usar o freio dianteiro.
Honda Turuna 125, um dos meus sonhos de consumo da época. Foto: Caio Mattos.
Para encerrar, as cores e preços. Lembrando que os valores são como base o Distrito Federal e não incluem despesas com frete ou seguro. As cores disponíveis para a CG 160 Start são prata metálico, vermelho e preto. Na CG 160 Cargo o branco, enquanto na CG 160 Fan as opções são o azul perolizado, vermelho e preto. Já a CG 160 Titan pode ser escolhida entre opções cinza metálico, vermelho perolizado e amarelo perolizado.
Os preços públicos sugeridos são os seguintes: CG 160 Start: R$ 10.520,00; CG 160 Fan: R$ 11.760,00; CG 160 Cargo: R$11.900,00; CG 160 Titan: R$ 13.040,00
A garantia é de três anos, sem limite de quilometragem, além de sete trocas de óleo gratuitas.
A lenda da CG vermelha
Nos anos 1980 era difícil criar pautas depois que as motos entraram na lista de supérfluos da câmara de comércio e as importações foram proibidas. Com uma indústria nacional ainda muito incipiente os jornalistas tinham de apelar para a criatividade.
E um dos testes mais criativos surgiu na Duas Rodas, da cabeça do Gabriel Marazzi. Muita gente suspeitava que às vezes duas motos iguaizinhas poderiam ter rendimentos diferentes. Atribuía-se essas diferenças ao ainda embrionário controle de qualidade das fábricas.
Para comprovar – ou não – essa teoria, Gabriel pegou duas Honda CG 125 exatamente iguais, com a mesma quilometragem, apenas com cores diferentes: uma azul e uma vermelha.
Levou as duas para a pista de teste e a CG vermelha foi melhor em todas as medições. Nada demais, mas esse teste causaria uma revolução na história da CG. Ficou a certeza que o rendimento melhor era por causa da cor! Foi assim que nasceu a CG “encarnada”. Essa crença foi tão além que em alguns Estados do Brasil, especialmente no Norte-Nordeste, a CG usada vermelha tem maior valor de revenda do que uma igual, mas de cor diferente. E quando a Honda tirou a CG vermelha de linha – uma decisão infeliz – as vendas caíram tanto que tiveram de voltar correndo com a cor vermelha na linha de produção.
Até hoje existe essa crença cega na supremacia da CG encarnada!
CG Today ("quadrada"): comparada com a Ninja 1100. Foto: Tite
Comparativo absurdo
Ainda na linha da falta de assunto, o diretor da Duas Rodas, Josias Silveira, teve outro insight: comparar a Honda CG 125 com a Sport Touring Kawasaki Ninja ZX-11. Uma aberração, claro, mas no mundo corporativo manda quem pode e obedece quem tem juízo, neste caso, o ajuizado era eu mesmo! Sim sobrou pra mim fazer o teste “comparativo”.
Confesso que fui morrendo de vergonha, mas fiz todo o teste conforme o rigor da época, com medições e todo aparato instrumental. A muito custo escrevi o texto, tentando manter o estilo mais profissional e isento possível, afinal era uma moto de 12,5 CV contra uma de 150 CV.
Dentro do teste fiz questão de colocar nosso motoboy, CGzeiro de vocação, para passar um dia inteiro trabalhando com a Ninja 1100 para depois relatar como foi. Ele adorou a experiência, mas na hora de abastecer quis voltar pra CG.
Quando a revista foi à banca me deu vontade de desaparecer do mundo. Aguentei zoação de quase todos os jornalistas do planeta. Fui ridicularizado de toda forma, até passar uns dois meses e recebermos o relatório de vendas da distribuidora e... surpresa: foi uma das edições mais vendidas da década! Confesso que na época fiquei com cara de tacho, mas o sábio Josias explicou do jeito sempre meigo: “porra, todo mundo tem uma CG na garagem, mas sonha com uma Ninja, agora ele sabe qual a diferença entre as duas. Graças a você!!!”.
Quanto aos comentários maldosos das revistas concorrentes daquela época a História se encarregou de dar a resposta: todas fecharam e só a Duas Rodas continua todos os meses na banca até hoje.
Minha CG Titan 150 carregada com dois skates!
Minhas CGs
Sempre quis ter uma CG desde que foi lançada. Depois meu sonho era a Turuna 125, mas nesta época eu já tinha uma Honda CB 400Four que me etendia perfeitamente. Só que a vontade de ter uma CG nunca passou. Tanto que tive três: duas Titan 150 e hoje rodo pela cidade com uma Start 160.
Os pontos altos da minha CG Start atual é o nível elevado de acabamento, o banco macio, as suspensões que até parecem de moto trail e, cereja do bolo, a inacreditável economia de gasolina. Nas medições que faço sem rigor técnico já consegui 51 km/litro!!! E passei a viajar com ela para percursos pequenos, deixando minha Triumph Bonneville SE na garagem morrendo de ciúmes. Em uma dessas viagens consegui chegar a impressionantes 135 km/h (no velocímetro). Em outra levei minha filha na garupa que sentiu mais confortável do que na Bonneville (banco muito duro, pai!).
Minha CG 160 Start, durante a semana me transporte, no fim de semana ensina novos motociclistas na ABTRANS. Foto: Tite
Uma vez enrevistei um casal de japoneses que estavam dando a volta ao mundo em duas Honda 70cc. Quando perguntei a razão de usarem uma moto tão pequena a explicação foi surpreendente: "queremos ver a paisagem, numa moto grande não dá".
Cada dia gosto mais da CG e agora que descobri o evento PNT-TT estou prestes a montar a Fórmula Honda 125 para competir nas corridas clássicas. Aguarde!
"Minha" Honda 125 réplica da RC 110 de 1962. Foto: Carlos Patrício
Evento clássico PNT reuniu carros e motos de coleção com pegas na pista
Realizado desde 2011 o evento Pé na Tábua, mais conhecido como PNT, saiu do seu palco principal, o kartódromo de Barra Bonita, SP, para o autódromo particular na Fazenda Dimep, do empresário e entusiasta do automobilismo, Dimas de Melo Pimenta. É um evento criado por e para entusiastas, mas o dono da batuta que rege toda a estrutura é o apaixonado Tiago Songa que decidiu, anos atrás, colocar os veículos clássicos para rodar na pista e não apenas expostos imóveis. Afinal são automóveis.
– Em um encontro tradicional de clássicos os veículos ficam parados e os entusiastas circulam por eles. No PNT são os veículos que circulam – explica Tiago.
A exemplo do tradicional evento clássico de Goodwood, na Inglaterra, a ideia era incentivar também a restauração de veículos clássicos de corrida. Com direito a uma corrida oficial, com pódio e troféus. Rapidamente a modalidade se espalhou que nem catapora em jardim da infância. Tanto que, em 2014, decidiu chamar o amigo e também apaixonado por clássicos, Jairo Portilho, para incluir as motos no evento, que recebeu o sobrenome TT, inspirado nas tradicionais Tourist Trophy inglesas. E é aí que eu entro nesta história.
Jairo (à esquerda) e Tiago: entusiastas que regem o evento. Foto: Tite
Para esta edição de 2021 Jairo decidiu me convidar para participar como piloto, a bordo de uma de suas quatro motos. Para mim seria reservada a honra de pilotar uma réplica da Honda RC 110, de 1962, feita a partir de uma Honda CG 125 de 1976. Curiosamente eu vi esta moto nascer quando fui visitar o Jairo cerca de três anos antes.
O convite veio 45 antes do evento e eu aceitei imediatamente. O evento foi de 9 a 12 de outubro, porém não poderia participar de todos os dias, apenas da data da corrida que foi numa segunda-feira, imprensada no meio do feriado de 12 de outubro. Nestes 45 dias tive a missão de emagrecer cerca de 5 kg para conseguir vestir de volta meu macacão de couro.
O pega com o Leonardo Freitas (29) durou até a bandeirada. Foto: Carlos Patrício.
Volta clássica
Fazia exatos 22 anos da minha aposentadoria como piloto de moto, em 1999, embolsando o vice-campeonato brasileiro da categoria 125 Especial, na qual competi com uma Honda RS 125 dois tempos. Naquela corrida derradeira eu tinha 39 anos e 59 quilos. Nesta segunda-feira de outubro estava com 62 anos e consegui chegar no necessário 69 kg pra vestir o equipamento de couro sem estourar o zíper.
Sem poder treinar cheguei e fui direto para as cinco voltas do warm-up. Já conhecia o circuito, mas a pista fora recapeada e estava mais veloz. Só tive tempo de calibrar os pneus, ajustar a posição das pedaleiras e larguei em último. Foram sete voltas de pura diversão. Nenhum dos participantes tinha experiência como pilotos “de verdade”, mas são colecionadores que gostam de curtir a emoção de acelerar uma clássica restaurada por suas próprias mãos.
Pilotar motos pequenas é muito mais difícil do que se pensa! Foto: Carlos Patrício.
Por isso não foi difícil assumir a ponta na quarta das sete voltas e vencer, sempre com o Leonardo Freitas colado na minha traseira. Segundo o locutor – o próprio Tiago Songa – foi a prova mais emocionante do dia porque teve disputa até a bandeirada. Pra mim foi uma diversão e certeza de que fui inoculado pelo vírus da restauração.
Fórmula de sucesso
No total foram cerca de 70 motos divididas em quatro categorias: até 125cc dois tempos, Fórmula Honda 125, Fórmula Honda 400 (conhecida como Cachorrão), e até 350cc dois tempos, onde correram as maravilhosas e lendárias Yamaha TZ 350 e TD 350.
Jairo na Yamaha TZ 350, engasgou na largada e chegou em segundo. Foto: Tite
Nos boxes pude voltar no tempo ao ver peças de coleção muito bem restauradas como Yamaha RD 50cc, Honda CB 125S, Suzuki A50II, Suzuki GT 550 e até uma raríssima Harley-Davidson Motovi 125 dois tempos! Mas a principal aposta do organizador está nas duas categorias monomarcas da Honda: as fórmulas 125 e 400. Criadas em 1976 e 1981, respectivamente, estas duas categorias foram responsáveis pela formação de toda uma geração de pilotos de motovelocidade.
Como são motos mecanicamente simples e fáceis de encontrar é certo que as duas categorias crescerão exponencialmente nos próximos eventos. E o “barato” é montar réplicas idênticas das motos que competiram, como a do piloto José Cohen, montada e pilotada pelo Jairo Portilho, e a réplica da moto do Adilson Cajuru Magalhães, restaurada e pilotada pelo empresário Alexandre Simões Zaninotto.
Fórmula Honda 400 réplica da moto usada por José Cohen. Foto: Tite
Da minha parte já pensei em vários projetos, continuarei o regime alimentar para reduzir um pouco mais o “air-bag” abdominal e melhorar um pouco a Hondinha 125. Certamente estarei no próximo e levarei mais colegas pra categoria.
Kombi todo mundo
Dentro da programação estavam duas categorias de carros VW: Kombi e SP2, dois clássicos que fazem a cabeça de qualquer colecionador do mundo. Os SP2 desfilaram, mas também competiram! Todos restaurados no maior rigor possível e obviamente as disputas foram no ambiente cavalheiro, afinal eram peças de coleção disputando frenagens!
Corrida de Kombi? Sim, temos! Foto: Carlos Patrício.
Já com as Kombi foi diferente. Com o saboroso trocadilho que batizou a categoria, a King Kombi tem preparação livre. Tão livre que Dimas de Mello Pimenta III preparou nada menos que uma Kombi com motor de Opala seis cilindros, pneus slicks e até aerofólio. Uma aberração! Também largaram Kombi com motor Porsche, com motor Subaru e algumas totalmente originais. Chegou a assustar ver as peruas entrando nas curvas fechadas, rodas ao ar, mas tudo sob controle. Um desafio às forças da gravidade, felizmente sem nenhum registro de capotamento.
O clima não poderia ser mais festivo, com barracas de camping, muito churrasco, presença de famílias inteiras (incluindo os pets), bem no espírito das corridas dos anos 1970. Sem regulamentos rígidos, muita poça de óleo, parafusos e porcas em fuga pela pista, com o saboroso toque de amadorismo que o evento exige.
Nunca vi tanto SP2 juntos. Foto: Tite
Obviamente a referência ao Festival Goodwood é exagerada, mas tudo tem um começo. Um dos mais animados era justamente o anfitrião, Dimas, que já iniciou as obras para aumentar o autódromo (passar de 2 para 5 quilômetros de extensão) e mais boxes, justamente para começar a receber carros e motos de corrida mais potentes. Outro entusiasta que já apareceu no evento é Nelson Piquet. Dono de uma respeitável coleção de carros e motos, ele é um dos incentivadores da modalidade.
Já eu, não consigo parar de pensar no próximo!
TZ 350 impecável. Foto: Tite
Pegas em todas as categorias. (Foto: Tite)
Parece que voltamos no tempo. Foto: Tite
Replica da moto de Kenny Roberts. Foto: Tite
Superbonder nas obturações e manda bala! (Ilustração: Walter Junior)
Por que os motores vibram? Saiba a origem e como reduzir esse efeito indesejável.
Começa com um formigamento nas mãos, depois são as solas dos pés que passam a ficar insensíveis. De repente, parece que o mundo todo está tremendo. Este efeito indesejável é a consequência natural do funcionamento do motor. As vibrações variam de acordo com o tipo de ciclo do motor (dois ou quatro tempos), o número de cilindros (quanto mais cilindros, menor a vibração), a capacidade volumétrica (a cilindrada) e o investimento de cada fábrica no sentido de atenuá-las. Eliminar de vez é impossível.
O pé da biela é onde se encaixa o pistão, no círculo menor.
Existem dois tipos de movimento atuando dentro de um motor: o alternado e o rotatório. A única exceção feita a estes dois tipos é a biela, um caso particular porque uma parte move alternadamente (seu pé) junto com o pistão, enquanto outra (a cabeça) move rotatoriamente junto com o virabrequim. A biela tem três partes, sendo chamada de cabeça a parte que se prende ao virabrequim; pé é a parte que se prende ao pistão e a haste, que é a ligação entre o pé e a cabeça. Muita gente costuma trocar o pé pela cabeça.
Como surgem
Os movimentos do motor criam forças*, divididas basicamente em três: força inercial, provocada pelo movimento alternado, e pseudo-força centrífuga, provocada pelo movimento rotatório. A terceira força é criada pela variação de pressão dentro da câmara de combustão.
Motor de um cilindro: muita vibração!
Todas estas forças se descarregam sobre o bloco do motor, quadro e mancais de apoio, sendo que a centrifuga e a força motriz têm uma elasticidade que fazem o motor efetuar pequenos deslocamentos, que se repetem ciclicamente conforme o regime de rotação. Tais deslocamentos pequenos, rápidos e contínuos são definidos exatamente como vibração.
Para eliminar a vibração no virabrequim é tecnicamente simples: basta criar uma rotação igual e contrária para obter uma resultante nula. Para isso basta colocar contrapesos correspondentes a cada mancal do virabrequim, divididos em massas e que somadas têm a mesma massa dos componentes em rotação. Muitas motos usam esse recurso, caso das CB 400/450.
Por isso é que os preparadores gastam seus neurônios tentando aliviar o peso das peças móveis. Isto diminui a força inercial e aumenta o regime de rotações, elevando a potência.
Motor boxer de seis cilindros da Honda Gold Wing 1800: vibração praticamente nula.
Todo cilindro tem sua fase ativa, a cada duas voltas do virabrequim (motor quatro tempos) ou a cada volta (motor dois tempos). Durante a fase ativa, a combustão gera um impulso sobre o pistão, de forte intensidade e breve duração. Por causa da pequena inclinação da biela, este impulso se descarrega em parte sobre o virabrequim e parte na parede do cilindro, criando a tendência de o motor girar sobre si mesmo, em torno do eixo do virabrequim.
Ai entram em cena peças importantes: os apoios do motor ao quadro (alguns com coxins de borracha) que impedem motor de dar cambalhotas por todo lado. Mas não conseguem impedir totalmente que parte destes movimentos estranhos se transmita ao veículo. Existem formas de minimizar este fenômeno (além do uso de coxins de borracha, é claro) dividir a cilindrada em vários cilindros, reduzindo assim a intensidade dos impulsos. Ou colocá-los de forma opostas, como no motor boxer da BMW. O movimento de um pistão ajuda a equilibrar o outro, em um vai-vem eficiente.
Motor seis cilindros em linha da Honda CBX 1050: baixa vibração e muito conforto.
Combate à vibração
Uma vez que não é possível acabar com a vibração, é preciso reduzir seus efeitos. A solução mais simples seria aumentar o número de cilindros. Em segundo lugar, acrescentar um ou até dois eixos balanceiros. No primeiro caso, a força inercial de um cilindro é anulada pelo outro correspondente. Diminuindo-se a cilindrada de cada cilindro, diminui-se também os pesos em movimento alternado, o que reduz as vibrações. Por isso, um motor Four (de quatro cilindros) vibra menos que um de apenas um cilindro.
No caso dos eixos balanceiros, coloca- se dentro do motor um "falso virabrequim", um eixo rotativo que gira no sentido contrário ao virabrequim "verdadeiro". Desta forma o balanceiro vai criar forças opostas às criadas pelo virabrequim. Com isso são balanceadas as vibrações primárias (de alta freqüência), as mais prejudiciais. Mas, não são eliminadas as vibrações secundárias (de baixa freqüência). Para se obter um equilíbrio maior seriam necessários dois eixos balanceadores ligados entre si, uma solução utilizada no velho motor da Honda 400/450.
Em alguns motores modernos os comandos de válvula também têm eixos balanceiros para eliminar ainda mais as vibrações. A solução mais confortável para o motociclista é isolar a transmissão das vibrações do motor para o quadro, utilizando mancais elásticos. Estes mancais elásticos são peças de metal e borracha que ficam entre o bloco do motor e os pontos de fixação no quadro.
Contrapeso separado do virabrequim: solução complexa, mas eficiente.
Uma boa manutenção periódica do motor também contribui para reduzir as vibrações. Quando o motor começa a apresentar perda de potência, de compressão ou for vítima de um travamento, o melhor remédio é fazer uma retífica, trocando de anéis pistão e juntas para deixar o motor "justo". As folgas nas bielas são as maiores contribuintes para aumentar a vibração de um motor.
Constantemente as fábricas investem em pesquisa e desenvolvimento em tudo que produz vibração (combustão, balanceamento de componentes, mancais, etc), sem levar em conta o que é viável ou não industrialmente. Depois é que se analisa a relação custo-beneficio para aplicar o desenvolvimento às motos de produção.
Num passado distante, tanto a Kasinski quanto a Sundown apresentaram modelos de 125 e 150 cc equipados com balanceiros. A tentativa é aliviar o sufoco de quem passa o dia inteiro montado em uma moto de um cilindro. Sobretudo aqui no Brasil, onde a maioria dos motociclistas só conhece o acelerador na posição tudo aberto!
Motor de três cilindros: baixa vibração com volume compacto.
Como ajudar
Ao contrário do que se pensa, a vibração é mais sentida quando o motor está "caindo” de rotação e não subindo. Para medir se uma moto apresenta um nível alto de vibração, coloque-a no cavalete central (ou lateral) e ligue o motor. Acelere até a rotação de potência máxima e solte o acelerador. Quando a rotação estiver perto do torque máximo, será o momento de maior vibração. Repare como a imagem refletida nos espelhos fica tão embaralhada que mal da pra ver alguma coisa. Se a moto não tem conta-giros, sem problema, basta acelerar e soltar para sentir a vibração. Alguns cuidados podem reduzir os efeitos e desconfortos provocados pela vibração. Uma simples tira de borracha (de câmara de pneu) entre a placa e o suporte já serve para reduzir a transferência da vibração, que normalmente faz a placa quebrar ao meio. Outra solução simples é adotar as proteções de borracha nas pedaleiras das motos fora de estrada ou até mesmo uma manopla de espuma mais macia. Parece óbvio, mas as manoplas gastas aumentam barbaramente a sensação de vibração. Já existem até manoplas de espuma bem macias. Neste caso, o uso de um bom e novo par de luvas também colabora bastante. Quando for lavar a moto em casa, aproveite para verificar aquelas borrachas que ficam entre o tanque de gasolina e o quadro. Algumas delas ressecam, endurecem e não conseguem absorver as vibrações. Trocá-las e fácil e custa pouco. Ultimamente até as motos mais simples – como Sundown Web 100, Honda Biz 125 ou Suzuki Burgman 125 – contam com ponteiras de metal na extremidade do guidão. Estas ponteiras também têm a finalidade de eliminar parte da vibração sentida nas mãos. Por isso não se deve retirá-las, nem trocar por peças de plástico, mais leves. Nas motos fora-de-estrada elas devem ser mantidas mesmo se for usado o protetor de mão.
Parafusos em fuga
Os parafusos e porcas da sua moto estão se despedindo por conta da vibração? Na linha de montagem as motos são montadas com uma carga específica de torque em cada porca ou parafuso. Nas manutenções é vital que os mecânicos reapertem tudo com auxílio de uma ferramenta chamada torquímetro que serve justamente para colocar a carga certa de força em cada item. Quem não tem essa ferramenta aperta no “olhímetro” e isso pode fazer alguns deles pularem fora. Quando envolve itens de segurança essa preocupação com o torque correto pode salvar vidas. Nos outros casos pode representar apenas um prejuízo financeiro.
Porca parlock: bucha de náilon trava os movimentos.
Algumas dicas espertas para evitar espalhar pedaços de moto pelas ruas.
– Se gosta de fazer manutenção em casa adquira um torquímetro e baixe o Manual de Oficina da sua moto para saber o torque em cada item.
– Dê preferência para as porcas “parlock” em peças que se movimentam, ou estão sujeitas a muita vibração como as manetes de freio e embreagem ou a placa.
– Hoje existem adesivos de porcas e parafusos, mas atenção: são oferecidas várias opções de aderência. Nos casos mais extremos nunca mais vai conseguir soltar a porca ou parafuso. Escolha o adesivo recomendado para cada componente.
– Verifique periodicamente os coxins e borrachas da moto. O uso constante do querosene na lavagem ataca as borrachas que se rompem e perdem a capacidade de absorver as vibrações.
– Mantenha balanceamento das rodas sempre que reparar um furo nos pneus.
*(Nota do Redator) Este texto foi escrito e publicado em dezembro de 2005. Hoje convencionou-se chamar de pseudo-forças todas que não são ligadas à geração de energia. Por isso, termos como “força centrífuga”, foram rebatizados, no caso, por aceleração centrífuga, ou simplesmente centrífuga. Se a fórmula da força é massa vezes o quadrado da aceleração, um virabrequim, por exemplo, tem uma massa e aceleração variável. Seria lógico entender que o movimento dele resultaria em uma força. Mas não é mais. Para manter o texto original deixei com a nomenclatura da época, mas se te incomodar demais pode trocar apenas por “pseudo-forças”.
O equilíbrio entre escrever “certo” e escrever “fácil” sempre atormenta a vida de qualquer jornalista especializado. Na época da revista Duas Rodas tínhamos o Josias, matemático e profundo conhecedor de mecânico, o Gabriel Marazzi, engenheiro acostumado às nomenclaturas e eu, jornalista que gostava de motos! Para escrever um artigo técnico na época pré-Google, tínhamos de entrevistar engenheiros e todo tipo de técnico. Que despejavam toneladas de termos técnicos que só os diplomados na FEI entendiam e cabia a mim transformar isso em algo digerível para leitores comuns.
Neste processo de “traduzir” os textos, muitas vezes tivemos de passar ao largo da nomenclatura técnica para usar termos do conhecimento popular. A própria palavra “cilindrada” não existe tecnicamente, cujo nome correto é capacidade volumétrica. Mas ninguém pergunta: “qual a capacidade volumétrica dessa moto?”. Então, nesse processo de popularizar expressões sempre aparece (e sempre aparece mesmo) um PENTELHO que fez engenharia naval, civil, elétrica, pra dizer “ain, o jornalista escreveu força, que burro, mimimimi”. A esta gente eu aviso: deixa de ser mala, senão vou procurar seus textos pra achar um monte de erros de português!!!
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