Domingo, 21 de Fevereiro de 2021

A clássica da vez: Honda NX 350 Sahara

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Moto ótima para viajar, econômica, confiável e confortável. (Fotos: Mário Bock)

Confesso, sem vergonha nenhuma, que sou um fã ardoroso da Honda NX 350 Sahara desde o primeiro contato, que foi no teste das versões pré-série antes do lançamento oficial. Aliás já era fã da XLX 350R, mas odiava aquele maldito pedal de partida destruidor de canelas.

Não lembro mais em qual publicação eu estava trabalhando em janeiro de 1990, mas lembro de uma cena engraçada com a imprensa reunida para os testes feitos no litoral de SP. Nós esperávamos algo mais além de uma XLX 350 com partida elétrica e carenagem. Por isso, quando o assessor da Honda tirou a capa da moto e descreveu a novidade eu soltei a pérola que virou lenda:

– Sahara, um deserto de tecnologia!

Trocadilhos à parte, a Sahara foi uma das motos que mais aproveitei na vida. Nunca tive uma só minha, mas era a moto que eu costumava pedir para a Honda quando eu queria viajar. Com ela fiz viagens pelo Nordeste com histórias curiosas.

Estava com a proa rumo Ilhéus, BA, encontrar minhas filhas que estavam de férias. Quando estava atravessando Cachoeiro do Itapemirim parei para abastecer e dentro da loja tinha um CD Rei que eu não conhecia – e acho que pouca gente conhece – produzido pelo Frejat com músicas do Roberto e Erasmo Carlos. Eu tinha instalado fones de ouvido no capacete e feito uma complexa gambiarra para alimentar um tocador de CD enquanto viajava. Tudo com muito profissionalismo.

Numa das faixas, “Parei na contra mão” a música começa com um som de carro se aproximando e dando uma freada brusca. Cada vez que começava a faixa eu levava um baita susto e me jogava pro acostamento achando que seria atropelado por um maluco. Quilômetros depois eu esquecia e me assustava de novo. Achei melhor não ouvir mais.

Tributo ao Roberto e Erasmo, vale a pena ouvir. Clique na imagem para ouvir algumas faixas.

O outro folclore nesta mesma viagem foi a minha chegada em Ilhéus. Assim que entrei na cidade dei de cara com uma faixa com a frase “O povo de Ilhéus saúda Geraldo Simões!”. Pronto, quase tive um treco! Como eles descobriram que eu estava chegando na cidade? E qual meu nível de importância no universo baiano para receber tamanha homenagem? Mais um pouco e vi outra faixa. Fiquei imaginando que alguém tivesse ligado na redação da revista Duas Rodas e sabia da minha viagem. Resolveram me prestar essa homenagem. Mas era tudo muito estranho.

Até que fui abastecer a moto e quando entreguei a folha do cheque o frentista comentou:

– Ôxe, você tem o mesmo nome do prefeito que acabou de ser eleito!

Voltei à minha insignificante existência!

Com uma Sahara eu também fiz o Enduro da Lua Cheia, em Criciúma, SC. Eu nunca tinha feito trilha à noite, mas a moto foi de uma valentia incrível. Equipada com pneus Pirelli Garacross, relação mais curta e luz auxiliar até que eu estava indo muito bem. Cheguei a ficar em terceiro lugar na categoria Pro até a metade da prova, quando apareceu um pequeno, mas profundo atoleiro. Seria fácil de superar se um animal de chifre não tivesse parado bem no meio! Precisei parar, a moto afundou até o tanque e a partida elétrica foi pro espaço. Deu um curto no punho direito e eu não tinha como desmontar aquilo no escuro. Precisei ser rebocado e perdi qualquer chance de classificação!

Recentemente perdi a chance de comprar uma Sahara 93 igual esta do teste. A moto era de coleção, com menos de 10.000 km rodados. Apareceu justamente numa época que eu estava sem grana, mas o valor era uma pechincha. Pecado, porque é uma das poucas motos dos anos 90 que eu teria na garagem. A evolução da Sahara foi a NX 400 Falcon, que nunca tive muita simpatia. Para atender as exigências de emissões a Falcon ficou bem próxima da Sahara. O visual mais moderno sem a carenagem e ganhou freio a disco na roda traseira. Mas sempre curti mais a velha, carismática e infalível Sahara.

Curta o teste publicado na edição 214 da Duas Rodas, com fotos do grande Mário Bock, ajuda do Jeferson Martins (empinador oficial de motos) e medições feitas por mim.  

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Endireitei a imagem porque na revista ela ficou invertida.

 Honda NX 350 Sahara

Uma moto, três usos

No campo, na cidade ou na estrada, a NX 350 Sahara 93 mostra versatilidade e um novo grafismo

O mais recente proprietário de uma Honda NX 350 Sahara, novinha, 93, corre para mostrar a moto para toda família.

– Olhem, comprei três motos! anuncia.

Ninguém entende quando olha para a garagem e vê apenas uma.

- Sim, são três explica uma estradeira para viajar nos fins de semana; uma fora-de-estrada para relaxar nas estradinhas de terra ao redor do sítio e uma urbana para ir e voltar do trabalho todos os dias.

A Honda NX 350 Sahara é isso mesmo: três em uma. Desde que foi lançada, em 1990, em substituição à XLX 350R, a Sahara mostrou-se uma interessante opção para quem quer uma moto versátil capaz de enfrentar várias situações, sem exigir uma pilotagem "profissional”. Motor elástico, suspensões de curso longo, economia de combustível e boa velocidade são as qualidades desse modelo, que tem ainda um importante item de conforto: partida elétrica.

Para 1993 a Honda não mexeu na parte mecânica. Em compensação trocou o visual sóbrio das versões anteriores por uma decoração moderna, agressiva e cores metálicas bem vivas. O resultado foi uma moto que chama atenção por onde passa, chegando a ser confundida com modelos importados ou de maior cilindrada.

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O motor é um quatro tempos, monocilíndrico, de exatos 339cc que desenvolve potência máxima de 31,5 cv a 7.500 rpm e torque máximo de 3,13 kgf.m a 6.500 rpm. Não são dados excepcionais, mas podem levar a Sahara a uma velocidade máxima de quase 140 km/h (137,7 km/h reais), com um consumo médio na cidade de 20,3 km/litro.

Boa na cidade

A maior qualidade desse motor é sua grande faixa de utilização. Pode-se acelerar em última marcha (6a) praticamente desde os 3.000 rpm até a faixa vermelha, aos 8.500 rpm. A retomada de velocidade de 60 km/h a 100 km/h é feita em 8,9 segundos, a melhor em sua categoria (que inclui a XLX 250R e a Yamaha DT 200). Justamente essa “elasticidade” é que faz da Sahara uma moto muito prática para uso urbano.

A posição de pilotagem proporciona muito conforto e maneabilidade, mesmo a pilotos com menos de 1,70m, que precisam apenas esticar um pouco as pontas dos pés para tocar o chão. Seu estilo "dacariano" também facilita as manobras, graças à boa altura (1.315 mm), que permite rodar pelos corredores de carros sem bater com o guidão nos espelhos retrovisores.

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A pavimentação das ruas brasileiras não é exatamente um tapete. Nesse aspecto a Sahara mostra outra face de sua versatilidade, talvez a melhor de todas. Com uma suspensão de longo curso (215 mm na dianteira e 200 mm na traseira) e os benefícios do mono amortecimento central (Pro-Link) na traseira, pilotar uma Sahara nas ruas esburacadas torna-se fácil. O motociclista praticamente só tem o trabalho de levantar um pouco do banco e "bumba!" superar o obstáculo.

Mesmo quem gosta de pilotar com esportividade, encontra na Sahara estabilidade suficiente para permitir curvas seguras em alta velocidade. Novamente o crédito recai sobre a suspensão progressiva e também aos pneus Pirelli MT 40 (3,00 x 21 na dianteira e 4,60 x 17 na traseira) com desenho para uso tanto em asfalto quanto na terra.

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Perfeita para uso urbano.

Boa na estrada

A Sahara tem um porte considerado intermediário para quem quiser pegar estrada. Ela fica situada entre as pequenas (como Honda NX 150 e XL 125, Yamaha DT e DT 180) e as grandes (Yamaha XT 600 Ténéré e Super Ténéré, importada).

A velocidade de cruzeiro pode ser mantida na faixa dos 100/120 km/h, mesmo rodando com garupa, por muito tempo, sem cansar o piloto. Só a espuma do banco ainda continua um pouco dura, obrigando paradas para relaxar certos músculos.

Sua vocação estradeira é reforçada pelo pequeno, mas útil, bagageiro. A carenagem oferece uma proteção parcial contra o vento, o frio e a chuva, melhorando o conforto em longas viagens. Mas acima de 140 (de velocímetro) a frente acusa uma oscilação mínima, suficiente para o piloto lembrar que trata-se de uma moto de uso misto e não uma superesportiva. A média de consumo na estrada é de 16,7 km/litro e pode chegar a 20 km/litro à velocidade constante de 100 km/h.

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Vamos de wheeling! 

Boa de terra

Nem precisa ser um especialista para imaginar a pouca adequação da Sahara às trilhas muito travadas". A grande carenagem e o pouco esterçamento do guidão dificultam as manobras em baixa velocidade, principalmente quando o piloto encontra cavas, ou nos corredores de galhos, entre as árvores. Os pneus também não gostam muito de lama, formando uma camada de barro que deixa a moto como se estivesse com pneus "slick" (liso).

No início de sua comercialização, em setembro de 1990, alguns enduristas até chegaram a usá-la em competições, mas com algumas adaptações como o pára-lama dianteiro da XLX 350R, afastado do pneu. Mais tarde, uma revenda Honda de São Paulo, SP, a Mesbla Motos, chegou a oferecer um modelo híbrido entre Sahara e XLX 350R, batizado de Reborn (renascida). Na transformação, a Sahara volta a ter o visual da XLX 350R, com a vantagem da partida elétrica. Mas é bom lembrar que a Sahara não tem pedal de partida, portanto, existe o risco de ficar atolado em fundo de vale, com a bateria descarregada, cercado de subidas por todos os lados.

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Suporta bem os desafios do fora-de-estrada.

Portanto, sua personalidade "dacariana" deve ser endereçada às estradas de terra, com algumas incursões de leve em terrenos arenosos. Nos estradões de terra ela tem um desempenho muito bom, permitindo desenvolver altas velocidades mesmo em curvas. A suspensão, um pouco macia para fora-de-estrada, absorve bem as irregularidades do tipo "costelas", mas chega a bater no fim do curso em saltos ou buracos mais exigentes.

Com seu preço tabelado em Cr$ 255 milhões (US$ 7.200 no câmbio comercial de 13 de maio), a Sahara ainda estava sendo comercializada com descontos que variavam de 8% a 10%. E ainda poderia ter seu preço reduzido com a nova alíquota (menor) do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).

Dentro das opções de mercado, a Honda NX 350 Sahara fica numa posição solitária. Acima dela está a Yamaha XT 600Z Ténéré, ou brevemente a XT 600E. Em todo caso, a diferença de preço é muito grande, chegando a 55% a mais no caso das Yamaha. Abaixo da Sahara está a Yamaha DT 200, com um preço 25% menor. Na prática, a maior concorrente da Sahara no mercado é uma moto da mesma família, a Honda XLX 250R, que oferece quase os mesmos números de desempenho, a um preço 13% menor.

Geraldo Simões

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Quarta-feira, 17 de Fevereiro de 2021

Mais um comparativo histórico: Ferrari vs Ducati, qual leva?

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Lado a lado: não foi fácil fazer a curva ao lado de uma Ferrari 355. (Fotos: Ricardo Bianco)

Aproveitando a entressafra de lançamentos de motos – e seguindo o conselho de encher este blog de matérias – aqui está mais um teste que ficou para a história por gerar polêmicas numa época que nem sequer tinha Orkut.

Eu tinha acabado de chegar na Revista da Moto!, ou simplesmente MOTO!, ao lado do Roberto Agresti, com quem eu já tinha trabalhado muitos anos antes na revista MOTOSHOW. Cheguei na edição 25, em 1996 com a missão de aliviar um pouco o sufoco do Roberto que escrevia a revista praticamente sozinho, apenas com seu sócio, o diretor de arte Marcos Moretti, o fotógrafo Ricardo Bianco, o fiel escudeiro Felipe Passarela e o auxílio luxuoso do pianista Julio Carone.

Na revista Duas Rodas eu tinha um status de piloto de teste e editor super respeitado no mercado. A linha editorial da Duas Rodas sempre foi mais voltada para mercado e prestação de serviço, que, confesso, não me agradava muito. Já a MOTO! seguia para uma linha mais jovial com competições e pautas atrativas como o já relatado teste 24 Horas (saiba mais clicando AQUI).

Perante o mercado, a Duas Rodas gozava de uma espécie de proteção por parte dos fabricantes de motos, não só pelo pioneirismo, mas porque os editores sempre adotaram a política de boa vizinhança com os fabricantes. Já a redação jovem e casca-grossa da MOTO! peitava os fabricantes e investia na emoção a qualquer preço. Essa postura não agradava muito os fabricantes, mas era a alegria dos comerciantes e importadores, que entregavam as mais exclusivas motos em nossas suspeitas mãos.

Lembro de ter pego várias motos importadas com exclusividade com a missão de fotografar e devolver sem deixar qualquer vestígio de uso porque estas motos já estavam vendidas! O dono nem fazia ideia que eu já tinha rodado com elas. É como dar uma rapidinha com a noiva virgem um pouco antes de ir pro altar.

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Eu não podia deitar demais a moto senão batia na Ferrari!

Numa dessas “rapidinhas” quase morri do coração quando peguei uma Honda VFR 800 absolutamente nova em uma loja chique na elegante avenida Europa. O dono da loja ativou a moto na minha frente e fez um milhão de recomendações pra não marcar o disco de freio, nem os pneus, não riscar o tanque com o zíper do macacão, não isso, não aquilo... a lista de “não-pode” era enorme.

Finalmente subi na moto, pedi pro fotógrafo Ricardo Bianco esperar no carro, já pronto porque teríamos pouco tempo. Saí da loja, entrei na avenida, acelerei e quase mandei a moto pro espaço! O pneu traseiro ainda com cera derrapou de uma vez, sem avisar, a moto ficou atravessada no meio da Av. Europa, indo em direção ao carro do fotógrafo. Meu coração quase saltou pela boca, meu cérebro apenas registrava “não encoste no freio”, minha alma já tinha fugido e quando percebi a moto estava perfeitamente alinhada, em pé e inteira. Pelo espelho eu vi o dono da loja com as duas mãos na cabeça e o enorme risco preto que o pneu deixou no asfalto. Até hoje ele pensa que foi de propósito. E até hoje eu tenho certeza que Deus olhou lá de cima, ficou com pena de mim e endireitou a moto.

Esta introdução é para entender o tamanho da pressão que foi testar uma Ferrai e uma Ducati, ambas emprestadas, com milhões de recomendações. Os donos só não sabiam que estávamos com a proa rumo ao sul de SP, mais precisamente para Interlagos. Sim, a pista!

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Foram várias tentativas pra me tirar de dentro dessa Ferrari!

O dono da Ducati 916 envelopou quase toda a moto com Magipack pra não marcar o tanque, a rabeta, as laterais, tudo. Depois das fotos dinâmicas nós tiramos o plástico e fizemos as fotos de detalhe. Eu já tinha pilotado a Ducati 916 em Interlagos e conhecia bem a moto. Mas nunca tinha pilotado uma Ferrari. Quando já estávamos quase acabando o homem deixou eu dar uma voltinha. Foi a voltinha mais longa da minha vida, porque eu não queria que terminasse nunca. Não lembro mais dos detalhes, mas uma coisa ficou marcado: o câmbio duro pra caramba e pensei “é, tinha que ser Fiat”.

Curta este teste realizado em agosto de 1998, com produção de Andrea Gonzalez, fotos de Ricardo Bianco e redigido por mim.

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Máquinas

Colocamos frente a frente a Ducati 916 e a Ferrari 355, duas feras italianas

Coloque 386 cv sobre 1.350 kg de um lado, 150 cv sobre 177 kg do outro. Misture tudo com um forte sotaque italiano e jogue na pista de Interlagos. Adrenalina em dose dupla! Essas duas máquinas são os mais expressivos objetos do desejo no consciente de qualquer ser humano com velocidade nas veias. A Ferrari, bela, amarela, italiana, como toda máquina feita para correr, tem perfil aerodinâmico e estilo assinado pelos estúdios Pinifarina. Olhe bem as fotos e pode suspirar à vontade. Mesmo nós, confessos amantes de motos, temos o direito e a liberdade de cometer o singelo pecado de apreciar os veículos de quatro rodas. No caso da Ferrari, é quase uma obrigação.

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A dupla mostarda e catchup!

Para fazer frente a uma Ferrari, qual seria a moto que mais expressa a filosofia motociclística italiana? Uma Ducati 916, a mesma que foi abençoada com a marca Senna, rei inconteste da velocidade. E antes que você desdenhe a cor amarela da Ferrari, um esclarecimento importante: a cor oficial da Ferrari é amarelo; o vermelho veio depois, em função de um regulamento da Fórmula 1, nos anos 50, que obrigava os carros a usarem a cor oficial de seus países. Tem mais: ela já foi verde também. Mas observe bem o logotipo e verá um cavallino rampante sobre o fundo amarelo.

Para uma “quadrúpede", até que a Ferrari, com motor V-8 de 3.496 cm faz bonito: com quase 400 cavalos a Ferrari leva apenas 4,5 segundos para chegar a 100 km/h e alguns outros poucos para alcançar a velocidade máxima de 295 km/h. O modelo que levamos para este encontro de potências é a Spider, conversível, o que a faz ficar ainda mais parecida com uma moto.

 

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Dentro desse cofre tem uma jóia V-8 de quase 400 CV!

A Ducati, com motor de dois cilindros em V a 90°, ou em L, de 916 cm faz de 0 a 100 km/h em 2,9 segundos e chega à velocidade máxima de 270 km/h. É o que poderíamos chamar de a Ferrari das motos, não apenas pela ascendência italiana, mas pelo estilo esportivo. Ela também é fornecida apenas em duas versões de cores: vermelho e amarelo.

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Pena que nosso blog não tem som, porque esse V-8 é uma sinfonia!

Pilotando um mito

Ter à frente duas máquinas como a Ferrari e a Ducati é um daqueles raros momentos que tentamos prolongar por uma breve eternidade. Ao assumir o posto de comando da Ferrari 355 vem a primeira surpresa. Como acontece com a maioria dos esportivos, as pernas ficam deslocadas para a direita, e os pés comandam pedais de alumínio; o freio de mão fica do lado esquerdo e não no centro, como nos carros “normais” e a alavanca de câmbio trabalha dentro de uma guia para não se correr o risco de errar uma marcha. São seis marchas à frente, mais a ré.

Não existe luxo no interior. Os bancos são revestidos de couro e o ar-condicionado garante tempo bom, quando a capota está levantada, claro. Lugar só para duas pessoas e um pequeno espaço atrás dos bancos pode abrigar duas pequenas malas.

Nenhum nome traduz melhor o espaço onde o motor vai colocado: ele é conhecido como cofre. Dá para entender porque a configuração V-8 é considerada a mais equilibrada para carros esportivos, incluindo a Fórmula 1. É o formato que melhor consegue reunir alto desempenho com espaço contido e elimina boa parte das vibrações.

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Neste dia realizei um sonho de infância, mas foi bem rapidinho!

Motor acionado e revela um som grosso. O fanatismo de um ferrarista chega a ponto de muitos gravarem o som de uma Ferrari só para curtir esse prazer sonoro, como se fosse uma sinfonia clássica.

Ao analisar a estrutura, salta à vista as rodas de liga leve, aro 18. Isso mesmo, as rodas da Ferrari têm diâmetro maior do que as rodas da Ducati, com aro 17 polegadas. Enquanto a Ducati calça pneus radiais 120/70-ZR17 na dianteira e 190/50-ZR17 na traseira, a Ferrari veste sapatões 225/40-ZR18 na dianteira e 265/40-ZR18 na traseira. Estes pneus são um dos principais responsáveis pela excelente estabilidade da F 355 e que garantem maior velocidade nas curvas, em comparação com a Ducati.

A exemplo do comparativo anterior, da Honda CBR 600F3 contra o BMW M3 (MOTO! 29), a moto levou vantagem nas situações onde o menor peso e reduzida área frontal são fundamentais. Ou seja, na aceleração, retomada de velocidade e frenagem. Por outro lado, o carro foi melhor na velocidade final e na velocidade em curva, em função dos quatro pontos de contato com o solo, que são os largos pneus.

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Ah, aí sim eu me sinto em casa. Já tinha pilotado a 916 em Interlagos.

Pilotando outro mito

A Ducati 916 é a própria síntese da Itália motociclistica. O motor, considerado antiquado, se revelou tão eficiente nas provas do Mundial de Superbike que duas marcas japonesas trataram de copiar o mesmo estilo. Primeiro foi a Suzuki, que “clonou" a Ducati ao criar a TL 1000S (MOTO! 29) com motor de dois cilindros em V. Depois foi a vez da Honda criar a VTR 1000 (MOTO! nº 32), também com motor V-2.

A vantagem do motor V-2 para essas esportivas é torná-las muito finas, com reduzida área frontal, o que melhora não apenas o coeficiente de penetração aerodinâmica, como também deixa a moto mais fácil de inclinar nas curvas. Além disso, a configuração V para o motor é a melhor receita para transferir potência à roda. Quando falam da tecnologia antiga da Ducati, é uma referência ao comando de válvulas desmodrômico, uma solução que dispensa as molas e confere mais precisão na abertura e fechamento das válvulas. De fato, é antiga, mas funciona muito bem até hoje. Seus efeitos colaterais são o aumento na vibração e no nível de ruído mecânico.

O quadro da Ducati 916 também adota uma solução diferente das modernas esportivas, com treliça tubular de cromo molibdênio e o motor “pendurado”. É outro sucesso que provocou alguns clones como a Yamaha TRX 850. A estabilidade proporcionada por esta solução é assombrosa, elevando os limites para parâmetros inimagináveis.

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Obra de arte sobe duas rodas.

Assombrosos também são os preços envolvidos. Para comprar essa Ferrari 355, aqui no Brasil, será preciso R$ 350 mil. No caso da Ducati, o valor é mais modesto, quer dizer, comparando com o carro. Ela custa "apenas" R$ 36 mil, quase 10% da concorrente de quatro rodas,

M!

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* Tem uma informação errada na ficha da Ducati. Onde está o item "Válvulas por cilindro" o correto é QUATRO e não oito como foi publicado. O revisor cochilou.

publicado por motite às 21:10
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Segunda-feira, 15 de Fevereiro de 2021

Vai ser dada a largada: quem é mais rápida CBX 750 ou RD 350?

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A Honda CBX 750F contra a Yamaha RD 350LC, qual leva?

Vai ser dada a largada: quem é mais rápida CBX 750 ou RD 350?

Imagine-se no finalzinho dos anos 1980, no calor dos seus vinte e poucos anos e maluco por moto, mas morando no Brasil! Tivemos uma condição rara no mercado de motos mundial: de uma hora pra outra os portos fecharam para a importação de “supérfluos” e, entre eles, estavam carros e motos.

Hoje sabemos que essa medida foi uma forma de incentivar a industrialização, sobretudo de veículos, que derrapava diante da concorrência com veículos importados. Num primeiro momento a reserva de mercado deu certo e tivemos no Brasil um crescimento natural do mercado de motos, com a produção de modelos quase simultaneamente com os mercados estrangeiros.

Assim, tivemos a chegada da Honda CBX 750F, nossa maior moto nacional, a mitológica sete-galo, e a concorrente natural a Yamaha RD 350LC, a mais esportiva das motos produzidas em série na época. Imediatamente criou-se uma mística em volta desses nomes, com legião de fãs dos dois lados. Assim como no futebol, quem gostasse de uma teria quase que obrigatoriamente odiar a outra. A rivalidade entre CBX 750F e RD 350LC foi motivo de discussões acaloradas, chegando mesmo às vias de fato, e obviamente pipocaram por todo Brasil rachas e mais rachas para provar qual era a mais rápida.

Mais uma vez, quis o destino que bem nessa época eu ser um piloto de teste da mais conceituada publicação, a Revista Duas Rodas. Além de mim, outro grande testador de moto, engenheiro e piloto Gabriel Marazzi, que dispensa apresentações. Pra jogar mais lenha na fogueira da insensatez, nós abraçamos a “rivalidade” e eu me mostrava publicamente como fã da RD 350, inclusive tive três modelos, enquanto o Gabriel puxava pro lado da CBX 750X que também teve a honra de ter uma na garagem.

Os leitores se identificavam e alimentavam essa briga, mas sou obrigado a confessar, décadas depois, que tanto eu quanto o Gabriel gostávamos das duas com a mesma intensidade. Quando eu queria viajar pegava a CBX 750, mas quando queria treinar em Interlagos pegava a RD 350. E hoje eu gosto das duas da mesma forma.

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O teste

Por isso, quando surgiu a pauta do teste comparativo somente de arrancadas isso caiu como uma bomba na redação. A ideia era genial e finalmente jogaria por terra aquela velha discussão: qual larga melhor? Iniciamos as tratativas para conseguir as motos, o local, os instrumentos e um terceiro piloto para não rolar a suspeição de favorecimento. O piloto convidado foi José Cohen, super experiente e amigo pessoal de toda a equipe.

A Yamaha forneceu uma RD 350LC nova, (dessa vez sem problemas). E decidimos usar a Honda CBX 750F que já estava em nossas mãos para o teste de 10.000 km. Depois percebemos que isso foi um erro, porque essa CBX já tinha passado por todo sofrimento infringido por seres humanos de macacão de couro. Estava no fim dos 10.000 Km (aliás a desmontagem foi na mesma edição deste teste de arrancada). 

A primeira sessão de testes foi no velho Retão de Interlagos. Ele tem um pequeno declive, mas a ideia era comparar uma com a outra e não levamos em conta fatores externos. A metodologia era simples: cada piloto faria duas arrancadas com cada moto e seriam levados em conta os melhores resultados de cada um.

Nessa época não tínhamos ainda os aparelhos de fotocélula, então os testes foram feitos com cronômetros e velocímetros aferidos. (Se quiser saber como eram feitos os testes de motos nos anos 80, clique AQUI). Quando terminamos a primeira bateria de testes de 0 a 100 metros a CBX cobrou o preço pelo esforço começou a patinar embreagem. A Yamaha conseguiu uma pequena vantagem e não dava para cravar que tinha sido efeito da embreagem claudicante da CBX. Eu lembro claramente que na minha primeira arrancada achei estranho a CBX ficar pra trás, porque eu já tinha feito medições das duas motos separadas e a CBX foi melhor em todas as situações.

Com a presença dos representantes da Honda e Yamaha ficou decidido que seriam preservados os resultados dessa medição de 0 a 100 metros, mas que teríamos de marcar outro teste depois de trocar os discos de embreagem da CBX.

Assim foi feito com um requinte: no Retão de Interlagos os números não poderiam ser homologados porque era inclinado. Conseguimos convencer a Polícia Rodoviária de SP e a Dersa a fecharem duas pistas da rodovia dos Imigrantes, no trecho mais plano. Lá nós fizemos as medições de 0 a 400 metros e de 0 a 100 km/h. A CBX 750F foi melhor em todas as medições!

Até hoje ainda tem gente que jura de pés juntos que a RD “pula da frente”. Papo de leigo ou de apaixonado, porque cronômetros e fotocélulas não mentem. Nunca vi uma RD 350LC original largar melhor que os quatro cilindros em linha da CBX 750F. O motivo dessa vantagem é muito simples: o motor 4T tem mais torque e em rotação menor, além da curva de potência mais suave. O motor já entrega boa parte da potência a partir de 2.500 RPM, enquanto o motor 2T da Yamaha só começa a “gritar” depois da abertura do YPVS. Tecnicamente não tem como esse motor 2T ser mais rápido na aceleração, mesmo com menos peso a favor.

Do ponto de vista técnico essa é a realidade. Mas, tal como o exemplo do futebol, cada um defende seu time com todo fervor, certo ou não!

Aproveite o teste, escrito por Gabriel Marazzi, fotografado por Mário Bock, auditado pelas duas fábricas e acelerado por mim!

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Segure-se, elas vão arrancar!

Para saber qual tem melhor arrancada, DUAS RODAS, colocou lado a lado a Honda CBX 750F e a Yamaha RD 350LC num teste de 0 a 100 metros; 0 a 400 metros e 0 a 100 km/h.

Qual tem melhor arrancada? Essa é a pergunta que todos estão fazendo depois do lançamento da Honda CBX 750F e da Yamaha RD 350LC. A Honda, com seu motor de quatro tempos e 82 CV a 9.500 rpm, ou a Yamaha, de dois tempos e 55 CV a 9.000 rpm? Números e cálculos são insuficientes para se saber o resultado de um racha entre as duas motocicletas. O método mais eficaz para sanar essa dúvida é colocar as duas lado a lado em uma pista de provas. E foi o que Duas Rodas fez com as versões nacionalizadas das duas mais potentes motocicletas lançadas no Brasil.

A missão é medir o tempo que as motos levam para, a partir da imobilidade cobrir as distâncias de 100 metros e quatrocentos metros e, também, para atingir a velocidade de 100 km/h. Existem dois padrões internacionais para avaliação da aceleração de veículos, os americanos usam o quarto de milha (cerca de 400 metros) para provas de arrancada e os europeus utilizam a velocidade de 100 km/h para comparar acelerações.

No autódromo de Interlagos, foram marcados cem e quatrocentos metros no asfalto para as medições. Os pilotos que participaram deste teste foram Gabriel Marazzi, Geraldo Simões e José Cohen, cada um efetuando duas medidas em cada categoria e com cada uma das motocicletas. O fato de se utilizar mais de um piloto, para este tipo de prova, é que na aceleração conta muito o jeito de usar a embreagem e o acelerador, que pode variar de piloto para piloto e até mesmo, de uma moto para outra.

Para o resultado definitivo foram aproveitadas as melhores marcas de cada moto.

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José Cohen foi o piloto convidado.

Dura prova para embreagem

No primeiro teste em Interlagos, após terminar a bateria de medições de zero a cem metros, a embreagem da Honda CBX não agüentou os esforços e os discos começaram a patinar, obrigando o adiamento do restante do teste. Até o fim dessas medições, feitas com uma moto de cada vez, o melhor tempo ficou com a Yamaha, que percorreu os cem metros em 4,90 segundos, contra o melhor tempo da Honda de 5,07 segundos. Porém, essa foi a única vez que a RD levou vantagem sobre a CBX, já que lado a lado ela não chegou a sair na frente nenhuma vez, e nem no quarto de milha ou no zero a cem por hora.

A melhor marca dos quatrocentos metros foi a da CBX, de 11,98 segundos, contra 12,05 segundos da RD. Esses sete centésimos de segundo de diferença provam que as duas motocicletas são praticamente iguais na aceleração, uma vez que possuem relações peso/potência muito parecidas. 

Na prova de zero-cem quilômetros por hora a CBX também levou vantagem em todas as passagens, com o melhor tempo de 5,53 s, contra o melhor tempo da RD, de 6,13 segundos. Essas marcas para os 100 Km/h, apesar de terem sido medidas nos mesmos critérios das medições normais de Duas Rodas, podem não corresponder exatamente àquelas publicadas nos respectivos testes das motocicletas, uma vez que as motos não são as mesmas, assim como as condições de teste e o local onde foi realizado.

Gabriel Marazzi

 

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Contra todas as lendas, a CBX sempre foi mais rápida de arrancada do que a RD.

Agradecimentos

A realização desse teste usando a Rodovia dos Imigrantes só foi possível graças à colaboração da Polícia Rodoviária Estadual e do DERSA. Queremos agradecer em especial ao Coronel Rolin, Capitão Josni, Tenente Barros, Cabo Galloni e Soldado Ermírio pelo empenho em ajudar e pela gentileza em permitir nosso trabalho.

Advertências – A foto da fumaça saindo dos pneus foi produzida colocando-se óleo no asfalto e girando o pneu em falso, segurando amoto com o freio dianteiro. Tem efeito apenas estético. A arrancada mesmo é feita sem que haja derrapagem, o que implicaria em tempo perdido. Não aconselhamos que os leitores façam derrapagens usando óleo: é perigoso por não permitir muita firmeza da moto, e provoca excessivo desgaste dos pneus, tanto que, após a bateria de fotos, o pneu traseiro da CBX e o da RD ficaram inutilizados.

Bastidores – Abrindo uma exceção, Duas Rodas permitiu que os assessores de imprensa da Honda, Ricardo Ghigonetto, e da Yamaha, Marcus Zamponi, acompanhassem esse teste. Dois momentos: o desconsolo do Ricardo quando quebrou a embreagem da CBX, versus sorrisos de Zampa; e o silêncio de solidariedade entre ambos, no final do teste, após verificarem o estado dos pneus.

 

publicado por motite às 12:01
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Quarta-feira, 10 de Fevereiro de 2021

A moto de um bilhão de Cruzeiros: conheça a Yamaha GTS 1000

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Prepare-se para conhecer uma moto revolucionária! (Fotos: Mário Bock)

A moto de um bilhão: conheça a Yamaha GTS 1000

Antes de conhecer a moto vou contar a melhor parte: os bastidores deste teste. Começando pela figura central, o querido, admirável e inesquecível Edgard Soares! Ele, junto com Felipe Carmona e Luís Latorre formavam a “Esquina do Veneno”, nos anos 1960, no centro de São Paulo, na esquina das ruas General Osório e Barão de Limeira.

Essa região concentrava as lojas de motos destes três personagens que eram concorrentes e rivais nas pistas, mas – diz a lenda – amigos e se respeitavam. Nos anos 1970 eu estudava do Colégio Objetivo na Avenida Paulista 900. Aquela escola formou ótimos profissionais, como minha irmã e meu irmão, mas também foi celeiros de renomados vagabundos, com vocação para os motores como eu e meu primo Irineu! O barato do Irineu era carro. O meu era moto. Hoje nosso barato é remédio pra pressão e coração.

Nos intervalos das aulas nós fugíamos por uma abertura lateral que dava num parapeito de uns 30 cm no que seria equivalente ao 6º andar de um prédio (um dia essa fuga vai merecer uma história exclusiva). Tudo para caminhar a pé até o centro e ver as motos. Nessa época eu já tinha moto, uma Yamaha 125 AS3, mas meu pai não deixava eu ir pra Av. Paulista com ela. Mal sabia ele que eu viajava pra Santos!!!

Lembro claramente do dia que vi uma Ducati 450 Desmo pela primeira vez e quase desmaiei. Mas o choque aumentou quando olhei pro lado e estava uma Ducati 750 Desmo!!! Acho que babei tanto que o Latorre me expulsou da loja como se fosse um cachorro vira-lata (eu, claro).

Saía do Latorre e ia no Edgard Soares ver as Yamaha RD 250, RD 350 e continuar a babação. Também era enxotado da loja que nem um vira-lata sarnento. O mesmo se repetia no Carmona. Mas na semana seguinte eu estava lá babando de novo. Assim, criei a imagem de que estes três comerciantes eram as pessoas mais ranzinzas do planeta.

Se quiser saber mais sobre Edgard Soares clique na foto acima.

Quis o destino que eu me tornasse jornalista, acabasse na redação da revista Duas Rodas e tive a honra gloriosa de conhecer o Edgard Soares, mas já como jornalista de uma importante revista, e não um pentelhinho que ficava fuçando nas motos. Lembro do dia que fui na loja do “seu” Edgard, ainda com medo de ser enxotado a vassouradas. No começo ele ficou distante, mas aos poucos foi amolecendo até que se revelou o ser humano de uma paixão pelas motos e pela vida que dificilmente alguém seria capaz de superar.

A glória mesmo foi quando fui viajar para Campos do Jordão com ele e a turma do Alberto Pelegrini. Quando me viu numa Yamaha V-Max 1200 ele se virou para os outros e falou:

- Porca miséria, vamos ter de esperar esse cara!

Porque a V-Max era horrível nas curvas e precisava abastecer a cada 100 km. Não deu outra: eles sumiram na estrada! Na volta choveu. Seu Edgard (com bem mais de 70 anos) montou na BMW K1 vermelha e desapareceu na nossa frente. Deixou todo mundo pra trás, passou num radar a uns 180 km/h e quando foi parado numa barreira policial, tirou o capacete e o capitão deu uma bronca no resto do pelotão:

- Vocês estão enganados, como esse vovôzinho pode pilotar essa moto nessa velocidade?

O Edgard acendeu um cigarro fez cara de vovô safenado e saiu de fininho. Depois ele se arrependeu. Um dia ele me confessou:

- Sabe, Gerardinho, eu preferia pagar a murta só pra poder enquadrar e pregar na parede!

Depois dessa viagem nos tornamos amigos. Quando ele importava alguma moto diferente e exclusiva ele me ligava e falava com o saudoso sotaque paulistano:

- Gerardinho, corre aqui que chegou uma moto nova que ninguém tem. Já tá vendida, mas você pode dar umas vorta pro Mário Bock fazer os retrato. Só não vai me cair com essa mota que eu le mato!!!

Assim, eu fui o primeiro jornalista brasileiro a ter acesso a várias motos exclusivas. Incluindo essa Yamaha GTS 1000 que você conhecerá em breve. Quando cheguei na loja ele ativou a moto e ficou explicando os detalhes técnicos. Os olhos dele brilhavam quando falava de moto.

Imagina meu nervosismo de sair com uma moto de 100 cavalos, UM BILHÃO de Cruzeiros, com pneus novinhos, cheios de cera, para fotografar o mais perto possível e devolver sem nenhum arranhão!

Um dia eu contei que ele me expulsava da loja quando eu era adolescente. Ele riu e confessou algo que jamais esperava:

- Agora você é que nem meu sobrinho! Os outro jornalista vem pedir moto pra testar, mas eu já avisei pros seus chefes: as minha mota só pode andar o Gerardinho!

Ele nos deixou em 2006, aos 78 anos. Que saudades desse cara!

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Não tem garfo, nem faca, nem colher! 

Yamaha GTS 1000, nova revolução japonesa

Diferente de tudo que já apareceu aqui no Brasil. Assim é a Yamaha GTS 1000, avaliada com exclusividade por DUAS RODAS, que está revolucionando o conceito de ciclística com a suspensão dianteira monobraço e quadro Omega (lê-se ômega). Muito confortável, estável e de estilo refinado, a GTS é a mais esportiva das motos classificadas como Gran Turismo. É também grande, pesada (276 kg em ordem de marcha) e cara: 30 mil dólares (Cr$ 1,2 bilhão em maio) aqui no Brasil.

A Yamaha levou pelo menos cinco anos desenvolvendo esse projeto e no período apresentou ao mundo a moto-conceito Morpho, totalmente revolucionária, mas que nunca saiu comercialmente em linha. Na verdade o conceito de suspensão dianteira monobraço não é tão novo. Há 10 anos a equipe francesa Elf já utilizava um sistema semelhante na sua 500cc no Mundial de Velocidade e há cerca de dois anos a italiana Bimota lançou no mercado a Tesi, também com suspensão dianteira monobraço, mas feita quase artesanalmente. Portanto, a Yamaha GTS 1000 é praticamente absoluta na categoria das “concept bike" (moto conceito) disponíveis no mercado.

genesis_quadro.png

Quadro revolucionário em forma de omega.

E a Yamaha não deixou por menos. Além de inovar no quadro e na suspensão dianteira, equipou a GTS 1000 com sistema de freio ABS (antitravamento) nas duas rodas, injeção eletrônica de combustível e catalisador no escapamento. Sem falar no motor do conceito Gênesis, com cabeçote de cinco válvulas por cilindro, outra inovação criada pela Yamaha.

Como é

Nos últimos 10 anos as fábricas de moto se esforçaram para desenvolver motores cada vez mais velozes e potentes. Nessa busca por desempenho nem sempre a figura humana – representada pelo piloto – foi respeitada. O resultado está nas motos superesportivas, mas quase "inguiáveis”. O trabalho realizado pela Yamaha nessa GTS freou um pouco essa busca apenas pelas velocidades meteóricas, em benefício da pilotagem, das formas e da ergonomia.

Por isso mesmo ela não é um torpedo. O motor é o mesmo da Yamaha FZR 1000 Exup, com quatro cilindros em linha, inclinado a 45º, refrigeração líquida, quatro tempos e cabeçote de cinco válvulas. Porém ele foi amansado, desenvolvendo "apenas” 100 cv a 9.000 rpm, enquanto a FZR desenvolve 145 cv a 10.000 rpm. A velocidade máxima também é mais “humana” chegando a 231 km/h, contra 275 km/h da FZR.

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Ela ficou apenas três anos no mercado. Hoje é peça de coleção.

O melhor mesmo é passear com a GTS e curtir o que ela tem de mais moderno.

A principal vantagem da suspensão monobraço com um único amortecedor é separar a função esterçante da função amortecedora. Num sistema convencional, a suspensão dianteira vira junto com a roda, enquanto na GTS a suspensão fica parada, e a roda é esterçada.

Na prática essa solução se traduz em uma frente que não afunda nas frenagens. Mesmo "alicatando" o freio dianteiro (único disco de 330 mm com três pistões duplos), a frente se mantém nivelada. Outra vantagem é "aliviar" a força imposta à roda dianteira para mudar de trajetória. Em um teste de slalon (zigue-zague) o guidão fica tão leve que a frente quase vira sozinha apenas com o balançar do corpo. Para uma moto de 276 kg, essa maneabilidade é fantástica.

genesis_suspdiant.jpg

Para tirar a roda dianteira basta soltar quatro parafusos. O disco fica no centro da roda.

Macia e silenciosa

A posição de pilotagem da GTS fica intermediária entre as esportivas e estradeiras. O corpo fica levemente inclinado à frente, com parte do peso sobre os punhos. O banco tem espuma macia e o piloto acomoda perfeitamente as pernas nas curvas do tanque de gasolina. Para os pilotos mais altos não baterem os joelhos, existe uma proteção de borracha presa à carenagem. A carenagem protege bem o piloto, permitindo longas viagens sem o inconveniente do vento empurrando a cabeça para trás.

O tanque de gasolina não é aparente. Ele fica coberto pela carroceria e tem capacidade para 20 litros. Na parte superior existe um pequeno porta-luvas e logo abaixo a tampa do bocal do tanque, que tem pequeno diâmetro, exclusivo para abastecimento em bombas que servem gasolina de alta octanagem. No Brasil alguns postos já dispõem dessa bomba, caso contrário os (poucos) proprietários deverão recorrer ao funil.

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Bocal de gasolina e porta-luvas.

Motor de arranque acionado (partida elétrica, é claro) e o escapamento solta um ronco macio, acompanhado de um vapor (proveniente do catalisador). A carenagem integral abafa boa parte do ruído do motor, o que torna a moto extremamente silenciosa e agradável de pilotar. Até os 6.000 rpm o ronco continua suave, só aumentando de tonalidade a partir de 6.500, quando a potência liberada já chega a 90 cv e o motor despeja seu torque máximo de 10,8 kgf.m. Dos 6.500 rpm aos 9.000 rpm a potência aumenta pouco (10 cv), mas o motor “berra" quando se aproxima da faixa vermelha, a 10.500 rpm.

Essa distribuição uniforme da potência e a grande faixa de aproveitamento tornam a GTS 1000 uma moto com personalidade "civilizada", proporcionando muito prazer de pilotar, tanto para quem quiser brincar em estradas sinuosas, quanto para os passeadores de fim de semana. Seu caráter turístico fica destacado pelas duas proteções de borracha colocadas sobre a rabeta do banco, já projetado para receber a bagagem.

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O nome Edgard Soares colado às pressas no quadro!

O conforto é fantástico, inclusive com garupa A suspensão traseira monoamortecida tem múltiplas regulagens para adequar a moto às várias situações. Essas regulagens são feitas da mesma forma, tanto no amortecedor dianteiro quanto no traseiro, girando um disco no reservatório do gás. A carga das molas pode ser regulada com sistema de contra porca, resultando em múltiplas combinações.

Para não dizer que tudo é perfeito, o painel de instrumentos tem um desenho feio, que chega a ser antiquado, apesar de completo, com velocímetro no centro, conta-giros à direita e medidor do combustível à esquerda. O conjunto de luzes-espia é que estraga o visual, além de ser de difícil visualização. Os espelhos retrovisores também merecem um "puxão de orelha", sendo muito úteis para o motociclista verificar se os próprios braços ainda estão no lugar, mas um pouco limitados para ver quem vem atrás.

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Painel completo, mas feio!

A Yamaha GTS 1000 avaliada por DUAS RODAS foi a primeira unidade importada pela loja Edgard Soares, de São Paulo, SP. Assim que chegou, ela já foi vendida.

Uma evolução nas ruas

Não é só por exclusivismo que a Yamaha resolveu investir na suspensão dianteira mo nobraço. Ela tem reais vantagens práticas e funcionais. A primeira vantagem prática que salta aos olhos é permitir a retirada da roda dianteira soltando apenas os quatro parafusos encobertos pela calota. Com os raios da roda deslocados para direita, o disco de freio pode ser superdimensionado (300 mm) e colocado quase no centro. Essa posição permite utilizar um único disco e obter uma frenagem completamente equilibrada, sem torções. Para completar, o freio conta com o sistema ABS (antitravamento).

Outra vantagem dessa suspensão é eliminar os movimentos indesejáveis da suspensão convencional. Numa moto "normal" o movimento da suspensão dianteira afundando e levantando altera as medidas de trail e distancia entre eixos. Como a suspensão da GTS tem um mínimo de afundamento, essas alterações são quase imperceptíveis. Tanto que ela tem um entre eixos pequeno, o que melhorou muito na maneabilidade e na estabilidade em curvas de baixa e média velocidades.

Também o conforto foi beneficiado porque o amortecedor ficou isolado do sistema de direção. Com isso, os golpes sofridos pela suspensão dianteira não são totalmente transferidos para o guidão. O resultado é um

"refinamento” na pilotagem, sem trancos nem oscilações no guidão.

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Capa da edição 214 da Duas Rodas.

O outro aspecto inovador é o quadro Omega. Essa denominação não saiu da cabeça de algum projetista, mas vem do formato do quadro, que lembra a letra grega Ω (omega). Suas vantagens estão na redução do centro da gravidade, que melhora a estabilidade, e uma distribuição de peso mais equilibrada para o conjunto. A conseqüência desse conceito é uma moto com estabilidade para nenhuma Ninja botar defeito.

Geraldo Simões

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publicado por motite às 20:55
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