(Fala sério, avião é tudo igual, qualquer brevê serve...)
Imagine a seguinte situação: você está confortavelmente acomodado na poltrona de um avião comercial Airbus A 380, na classe executiva, pronto para decolar para Paris. Enquanto a aeronave está taxiando, o comandante inicia seu tradicional discurso.
- Sras e srs passageiros aqui é o comandante Fulano, gostaria de compartilhar com todos que este é meu primeiro vôo como comandante de um jato deste porte. Estou um pouco ansioso porque meu brevê é de avião monomotor agrícola, mas podem ficar sossegados porque no fim tudo voa e estamos juntos!
Pense outra cena: você está embarcado em uma balsa que faz travessia Ilhabela-São Sebastião e percebe que o comandante está com dificuldade para atracar. Até que ele admite:
- Desculpa aí, pessoal, mais minha Arrais é de veleiro... mas tudo é barco mesmo! Estamos juntos...
Se alguém achou as situações inverossímeis pode parar de se surpreender, porque é exatamente o que acontece com a habilitação para motociclistas. Hoje vivemos a ridícula e inimaginável situação de ver pessoas sem qualquer experiência prévia se habilitando para pilotar motos de 200 cavalos, capazes de chegar a mais de 300 km/h.
Mas tudo bem, porque esta pessoa, que pode inclusive ser um jovem de 18 anos e um dia, passou pela exigente formação de condutores, na qual outro profissional de extrema competência e conhecimento técnico usou uma moto 125 cc para mostrar com total ciência as complexas operações de ligar a moto, engatar a primeira marcha, frear apenas com o freio traseiro e parar com apenas o pé esquerdo no chão. Toda essa enorme carga de conhecimento técnico, somada às aulas teóricas, chegam a longas 30 horas de aula e habilita qualquer cidadão acima de 18 anos a pilotar todos os veículos motorizados de duas rodas, de scooter a uma super esportiva.
Normal, afinal é tudo moto e são todas iguais. E estamos juntos!
Não, não são todas iguais. Da mesma forma que só em novelas e filmes um piloto de monomotor consegue pousar com precisão um jato comercial, na vida real alguns absurdos podem se repetir. O primeiro deles está na cegueira que ataca especialmente os engenheiros e especialistas de trânsito quando o assunto é motocicleta e seus derivados. Não se pode aceitar que as aulas práticas para habilitação ao scooter seja feita em uma moto! É como tirar Arrais de veleiro e pilotar uma lancha só porque ambos são barcos!
Conheço muita gente que poderia deixar o carro na garagem e adotar um scooter, mas não o faz porque não quer aprender a pilotar uma moto com câmbio convencional, mas sim um motociclo com câmbio automático. Uma das maiores conquistas dos scooters modernos foi a adoção do câmbio automático por polia variável (CVT) que elimina as trocas de marcha e a embreagem tradicional. Basta acelerar e frear. Além disso, a pilotagem de scooter é completamente diferente da de moto. Na moto pilota-se montado, no scooter pilota-se sentado. Motos têm rodas de diâmetro acima de 17 polegadas. Scooters têm rodas menores de 14”. É tudo diferente. Tão diferente que nos países normais o scooter pode ser pilotado por pessoas habilitadas em automóveis. Não precisa fazer aula de moto-escola. Esta é uma reivindicação que deveria ser abraçada pela associação dos fabricantes de motos e scooters. Não faz o menor sentido habilitar um cidadão para um tipo de veículo para pilotar outro!
(Moto também é tudo igual, aos olhos da legislação brasileira)
Ah, mas vivemos no país do avesso. O lugar no mundo onde tudo acontece ao contrário.
Se alguém pretende dirigir uma carreta de 30 toneladas terá de fazer um teste prático e se submeter a um exame específico. O mesmo se repete se quiser dirigir um ônibus. Se para as autoridades de trânsito uma carreta é diferente de um ônibus e um carro, então por que veículos tão diferentes quanto uma esportiva de 200 cavalos, uma moto utilitária de 12 cavalos e um scooter de 9 cavalos são tratados como iguais?
Essa pergunta não tem resposta, por enquanto.
Mas já houve um tempo em que a habilitação de motos era por categoria também no Brasil. Era A1, até 125 cc; A2 de 126 a 180 cc e A3 acima de 180 cc (não tenho certeza da divisão porque faz mais de 30 anos). Mas nos anos 80 as motos eram bem diferentes e uma 750cc era só um pouco mais forte que uma 500 cc, por exemplo. Além disso, como tudo no Brasil, havia uma ingênua picaretagem. Naquela época haviam duas motos de 180 cc que na verdade eram 125 cc “aumentadas” para 180 cc. As moto-escolas usavam esta moto para habilitar na categoria A3.
Minha sugestão às autoridades de trânsito é voltar a habilitação por categorias. No entanto com diferenças importantes. A primeira delas seria permitir ao habilitado em automóvel pilotar também scooters e ciclomotores até 125 cc (a popular “cilindrada”). A partir daí criar a categoria A1 para motocicletas de 126 a 300 cc; A2 para motocicletas de 301 a 600cc e A3 para motos acima de 601 cc.
Mas essa divisão de nada adiantará se as aulas e exames forem feitos nos mesmos espaços para as três categorias. Seria necessário criar espaços e uma rotina de aprendizado específico para cada categoria. Inclusive adotar um critério mais rigoroso no exame físico e psicotécnico aos candidatos que pretendem pilotar motos acima de 601 cc.
Ainda na linha das “sugestões” ao Denatran, Ministério Público e seus derivados, está mais do que na hora de alterar o atual sistema de seguro obrigatório. É inadmissível que um motorista/motociclista que passa 20 anos sem nenhuma ocorrência seja submetido a mesma taxa de seguro do que um pseudo-marginal que se acidenta 20 vezes por ano! E mais: acabar com o seguro atrelado a um veículo, mas sim a uma pessoa física. Carros e motos não rodam sozinhos, precisa de alguém para conduzi-los e é a este alguém que deve ser imputado a responsabilidade pelos acidentes. Portanto nada mais natural que o seguro seja concedido a pessoas e não a coisas inanimadas motorizadas.
Mesmo que um cidadão tenha mais de um veículo, ninguém consegue dirigir dois ao mesmo tempo. Sempre terá uma pessoa no comando e é este indivíduo que deve ser responsável pelo seguro obrigatório. Mas quem consegue mexer neste verdadeiro sumidouro de dinheiro chamado DPVAT?
Ficam, então, registradas as sugestões para um trânsito mais justo.
(Se tiver com o documento em ordem este carro fumacento pode rodar)
Eu tenho um sonho
O pastor e ativista político americano Martin Luther King Jr era um poeta. Suas frases e discursos são até hoje repetidas e usadas como referência em várias situações. O mais famoso de seus discursos começava dizendo “Eu tenho um sonho” e prosseguia relatando como seria o ideal de um país sem a perseguição racial que os Estados Unidos promoviam nos anos 50.
Pois eu também tenho um sonho. Sonho com o dia em que minha cidade será administrada por pessoas que pensam no interesse maior da coletividade e não no poder. Pessoas contratadas pela competência técnica e não por um concurso que mede a capacidade de decorar a tabela periódica e os afluentes do rio Amazonas. Sonho com o enxugamento na administração pública e contratação de profissionais efetivamente competentes e não parasitas que vêem no emprego público uma forma de trabalhar pouco e sempre.
Sonho com a transparência da administração pública e a extinção eterna da corrupção. Com a certeza de que cada centavo compulsivamente doado à administração sob os eufemismos de imposto, taxa, contribuição compulsória etc chegue efetivamente à população.
Mas acima de tudo, sonho com o dia que o gerenciamento do trânsito seja feito por pessoas especialistas, juristas, gerenciadores com a mais rara qualidade humana: a sensatez. Neste país ao contrário uma folha de papel, ou a falta dela, tem mais peso do que qualquer item de segurança do veículo. Se um motorista, ou motociclista, distraído ou esquecido mesmo, deixar de pagar uma taxa pode ter o veículo apreendido, guinchado e retido em um pátio, mesmo em perfeitas condições de uso, com todos os itens de segurança e impecável. Enquanto um carro, ou moto, com documentação em ordem, mas caindo aos pedaços pode rodar livremente. A arrecadação tem mais importância para o Estado do que a segurança do cidadão.
Só para não ficar nos exemplos brasileiros (que já sabemos ser ao revés do mundo), pesquisando outros países constatei que nos Estados Unidos, se o cidadão esqueceu de pagar alguma taxa e o policial o flagrar, pode pagar diretamente ao oficial, que no carro tem uma dessas máquinas portáteis que transmitem dados por telefonia celular, igual à de qualquer botequim. Eu mesmo fui multado, em 1999, e paguei a multa pelo cartão de crédito diretamente ao policial (ultrapassei em faixa contínua).
Na Inglaterra, se o cidadão for pego com a documentação irregular, tem três dias de prazo para se apresentar diante de um delegado de trânsito com os papéis em ordem. E ai do sujeito se não aparecer. Em nenhum destes países o veículo é retido, porque nestes lugares esquisitos o Estado entende que a propriedade do veículo não pode ser questionada ou retirada se estiver pago! No Brasil o direito à propriedade está garantida pela Constituição, desde que as taxas da propriedade estejam em dia! A propriedade é tua, mas o direito ao uso é pode ser confiscado pelo Estado.
Ah, mas ao adquirir a propriedade, por um valor muito acima ao do mercado mundial, é sempre justificado pelo comércio como resultado do excesso de tributação. Cerca de 35% do preço dos carros, motos e caminhões já são resultado de impostos em cascatas. Mesmo assim se não pagar as taxas anuais o cidadão perde o direito de usar o veículo. É a farra do poder público sobre o direito à propriedade. Concordo que os veículos com mais de cinco anos de uso sejam fiscalizados, mas em carros semi-novos, com menos de 10.000 km rodados esta fiscalização de emissões de poluentes tem o desagradável e poluído cheiro de propina oficial, tipo: “passa cinquentinha aqui que eu libero seu carro zero quilômetro pra rodar pela cidade”. Durma-se com uma esculhambação dessas!
Outro sonho é ver juristas, especialistas em direitos civis, questionarem se esse DPVAT é legal. Na minha ingenuidade política e fiscal acho que deveria ser atrelado à pessoa física e não a um bem inanimado. Veículos não saem sozinhos por aí, precisam ser dirigidos e quem dirige que é responsável pelos acidentes. Portanto, nada mais natural que o seguro obrigatório fosse atrelado a um CPF ou prontuário de CNH. Veja a situação de quem tem mais de um veículo, por exemplo, ninguém dirige dois carros ao mesmo tempo. Qual o sentido de um veículo parado ser submetido ao pagamento de seguro compulsório? Ele pode sair sozinho e atropelar alguém?
Parece que tudo no Brasil é feito para tirar o máximo possível de dinheiro do contribuinte. Se alguém tem um carro, uma moto e um scooter, por exemplo, precisa pagar seguro obrigatório de três veículos, mas só usa um de cada vez. Não tem o menor sentido! É o mesmo princípio do sistema Sem Parar dos pedágios já questionado antes. Não faz sentido ser fixado a um número de placa, mas deve ser direito de um motorista! Mas o Estado precisa garantir o retorno do investimento feito pelas empresas privadas que administram os pedágios. Uma pessoa paga três taxas de administração para ter direito aos transponder, mesmo que só use um carro de cada vez. E mesmo que usasse dois, ambos pagariam o pedágio do mesmo jeito!
(Mas se este carro zero km estiver sem o licenciamento ou sem a inspeção veicular será recolhido ao pátio...)
Recentemente uma estudante de jornalismo gaúcha provou (ou tentou provar) que a cobrança de pedágio é ilegal por se constituir bitributação. Como no preço da gasolina já está incluído o imposto destinado ao DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte, que cuida da conservação de estradas), o pedágio seria uma cobrança ilegal. Todo mundo sabe, mas parece que esquece ou prefere não lembrar, mas o IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor) é um bonito nome para um velho imposto: a TRU, Taxa Rodoviária Única, lembra disso? A TRU não foi extinta, ela mudou o nome para IPVA! Ou seja, se o IPVA é a ex-TRU rebatizada, então já é uma taxa rodoviária e não poderia existir o pedágio! Para oficializar o escandaloso caso de bitributação, com a volta do pedágio, mudaram o nome do imposto, simples! Portanto, a estudante de jornalismo pode argumentar que se trata de uma tri-tributação! É pouco, para um país que é penta!
O Brasil está sendo doado às empresas privadas. DPVAT e rodovias são administradas por empresas privadas. Se a verba que a União deixou de investir na conservação das estradas fosse usada para saúde pública, ensino, segurança, vá lá, seria aceitável esta “privatização” das rodovias. Mas a verba que o Estado deixou de usar nas estradas caiu neste sumidouro de dinheiro chamado erário e sabe-se lá onde foi parar!
A inspeção veicular também é gerenciada por uma morosa e descaradamente despreparada empresa privada chamada Controlar que nem sequer dispõe de um telefone 0800 para atender seus “clientes”. Mesmo que o cidadão pague a taxa obrigatória, em dinheiro, à vista, no site da empresa, a liberação para fazer a inspeção demora três dias úteis. Se o veículo estiver apreendido são mais três dias pagando a taxa de “hospedagem”. Ah sim, o seu veículo zero quilômetro apreendido por falta do pagamento de uma taxa de R$ 53,00 será rebocado em um guincho de uma empresa privada, ficará no pátio de uma empresa privada e os preços são totalmente fora da realidade. Da nossa realidade, claro.
Eu sonho com o dia em que a palavra do cidadão tiver mais peso do que o reconhecimento da assinatura por um sujeito que nunca te viu na vida. Sonho com o fim desta instituição anacrônica, resquício da monarquia, chamada cartório. Se nunca mais soubéssemos de um caso de falsificação de documento eu seria o primeiro a sair nas ruas empunhando a bandeira pró-cartório. Mas este monumento à burocracia continua emperrando nossas vidas e os carros roubados continuam sendo esquentados, os terrenos continuam sendo grilados e contratos são falsificados diariamente.
Mas eu sonho mesmo com o dia que o Brasil voltará a ser um país normal e o peso do Estado deixará de ser um pesadelo na nossa vida!
(Tá Tutto em cima: obrigado a todos pelo incentivo)
Sou de uma geração que passou por profundas transformações políticas, econômicas, culturais e de costume. Quem atravessou o Brasil nos anos 60 aprendeu e ficar na moita. Não podíamos declarar abertamente posições políticas, muito menos ostentar luxo e conforto, pois vivíamos o engodo do socialismo marxista como solução para as diferenças sociais. Enquanto isso, os americanos faziam justamente o contrário: quanto mais exibissem sucesso e riqueza do capitalismo livre mais respeitados eram no clube de golf.
Hoje vejo que as novas gerações superaram este preconceito besta contra o sucesso. Não o sucesso efêmero e estéril das celebridades instantâneas, mas aquele alicerçado na competência e inteligência gerencial. Sou um bom exemplo da timidez empresarial, porque meus amigos vivem me cobrando a falta de divulgação do meu negócio (o curso SpeedMaster de Pilotagem) e levo verdadeiras broncas quando me encontram. Pior: como ex-publicitário eu deveria ser um verdadeiro out-door ambulante, mas nem isso sai com naturalidade.
Felizmente o sucesso veio no ritmo certo, sem atropelos, bem cuidado, espontâneo e de forma, admito, quase viral. Neste domingo será realizado mais um curso SpeedMaster em Piracicaba e já está lotado. O próximos cursos, dias 2 (básico) e 3 (avançado) de julho estão lotados. E começo a receber as inscrições para o curso do dia 30 de julho.
Agradeço realmente a todos que contribuíram para este sucesso. Admito sem falsa modéstia que os 35 anos dedicados ao motociclismo tiveram grande participação neste êxito. Também confesso que ainda me assusto quando recebo cinco ou seis ligações no mesmo dia solicitando informações e já começo a investir em melhor atendimento, um site de verdade, sistema de cartões de crédito/débito, mais publicidade etc.
Obrigado mesmo! Seria indelicado citar todo mundo que ajudou porque posso esquecer de pessoas importantes e levar mais broncas, mas meus special thanks para o José Cohen, à Honda, Pirelli, Tutto, Shoei, ao circuito ECPA, toda a turma do Motonline e Motonauta e um mondo de gente. Prometo não decepcioná-los e curtir a felicidade deste sucesso, que seja cada vez maior e duradouro.
(Zero Bala: "meu negócio é limpo!")
Rolling Stolen, a primeira revista dedicada aos manos que trabalham com mercado paralelo de veículos
Exclusivo: entrevistamos Zero Bala, o mano que puxa as bike mais iradas do mercado.
Encontrei Zero Bala às escuras. Para entrevistá-lo seus assessores me obrigaram a vendar os olhos, tapar o nariz e cobrir os ouvidos. Nem precisava, porque fui transportado em uma Captiva blindada com vidros tão escuros que ao meio-dia pensei estar em pleno eclipse total do sol. Sim, a Captiva era roubada, mas com documento em ordem (!).
Zero Bala mora em uma casa confortável, com três quartos, uma suíte, ampla sala de estar com sofá vermelho, tapete felpudo pink, com um móvel niquelado em tom bege. Certamente ele é daltônico! Ninguém pode ter tanto mal gosto...
Ele me recebeu na cozinha, para um cafezinho, e a geladeira amarela sobre um piso violeta confirmou minhas suspeitas: não conhece cor ou transformou sua casa em um catálogo de Panthone.
Sobre a toalha de mesa grená ele estica a foto de uma moto esportiva. Trata-se de uma BMW R 1000SS, a esportiva mais cobiçada do momento. “Peguei de um palyboy que tava saindo de Interlagos. Não é da hora?”. Acenei que sim, mas comentei que achava estranho puxar uma BMW, porque normalmente os profissionais do setor não gostam da marca bávara. Ele respondeu:
- Pode crer, essa motoca é barva mesmo! Já puxei 290 km/h com ela na marginal!
- Não, Sr. Bala, eu quis dizer bávara, da Alemanha!
- Isso aí, precisa ter as manha pra pilotar, porque é barva mesmo!
- Esquece...
Percebi que a conversa seria longa e dei início a entrevista:
Rolling Stolen – Sr Bala, como começou nesta, hã... profissão?
Zero Bala – Ah, foi logo cedo. Quando eu tinha uns 9 anos via a molecada tudo de bicicleta bacana, dessas montibaique de playboy e eu só de Barra Forte emprestada. Saquei que não era justo e decidi ir à luta...
Rolling Stolen – Foi trabalhar?
ZB – Qué isso, ficou doido? Tá maluco? Trabalhar é pra trouxa, assaltei um caminhão de gás pra comprar meu primeiro instrumento de trabalho: um três-oitão da hora! Aí fiquei só esperando os pleiba saírem na rua com as bike pra pegar uma. Vi que o negócio era fácil e montei um pequeno negócio de magrela bacana, só coisa fina. Nada de Caloi e Sundown, só magrela de responsa.
Rolling Stolen – E a partir daí, quando surgiu o interesse pelas motos?
ZB – Ah, maluco, quando vi a primeira Mobi (n.d.r.: Mobylette) fiquei doido. Sem essa pagação de ficar pedalando, só acelerar e cair na vida. Encostei o cano no mano e só falei: desce da motoca e sai fora, sem olhar pra trás! Moleza...
Rolling Stolen – Naturalmente foi evoluindo nos negócios!
ZB – Claro, véio, assim como tu eu também comecei por baixo e fui pegando as manha pra partir pras grandes. Naquela época as motocas bike eram as Ninja, tá ligado? Aquelas Honda Ninja...
Rolling Stolen – Kawasaki Ninja, o Sr quer dizer...
ZB – Ah, mano, essas nave são tudo parecida. Pra mim era tudo Ninja, hoje já sei algumas diferenças.
Rolling Stolen – Mas o Sr roubava as motos só pra curtir?
ZB – opa, calma lá, véio, não se usa estes termos pesados aqui na comunidade, tá ligado? Eu não roubo, só tomo emprestado mediante educada solicitação. Que nem o Collor fez com a nossa grana: ele pegou só emprestado.
Rolling Stolen – OK, desculpe, que uso o Sr faz das motos?
ZB – Ah, depende da motoca. As bike mesmo a gente usa pra curtir, mas tem as de fuga, tipo Hornet e XT 660 que a gente usa pra trabalho. São as motocas que melhor fogem da poliça. Mas pra alguns serviços menores a gente usa as Twister ou Fazer mesmo.
(Zero Bala no churrasco que organizou na lage)
Rolling Stolen – Que tipo de serviço?
ZB – Aqueles manés que saem do banco cheio da grana, a gente se mistura com os boys e espera o mané sair pra dar o enquadro. Depois a gente passa a grana prum mano que tá numa Hornet ou XT 660 pra vazar com a grana. Enquanto a poliça procura um motoboy de moto pequena a gente já deu linha com as bike maior.
Rolling Stolen – Como é a tática pra pegar as motos grandes, as esportivas.
ZB – As bikes? Essas dá trabalho, mas é maomenos o seguinte. A gente bota um moleque de rádio nas pontes na entrada e saída de São Paulo. Na Ayrton Senna, Anhanguera, Bandeirantes principalmente. Sábado e domingo de manhã os playboy vão tudo pra estrada pagar de piloto, tudo de equipo zero, capacete da hora, macacão, tudo zero bala! Aí a gente tem os manos que ficam de Hornet rodando ali pelas imediações, ligado no rádio. Quando o moleque dá a letra da motoca já diz se tá sozinho, se tem mais trouxa junto. Aí é só encostar e apontar o canhão. Já desço na moral: “se tiver alarme nessa porra volto pra te fazer, playboy filhodaputa!”. Haha, os caras se cagam todo e entregam até a cueca (risos).
Rolling Stolen – E se o cara acelerar? Uma 1000 esportiva anda mais que a Hornet!
ZB – He He, pode andar mais que a Hornet, mas não anda mais que um pipoco de 9 mm, tá ligado. Se o cara ama a vida pára na hora. Eu oriento meus bródis pra não fazer ninguém, mas as vezes acontece. Na adrena o neguinho fica sangue nos zóio e perde a cabeça mesmo, atira primeiro pra evitar fuga e finalizar o mané.
Rolling Stolen – Vc já fez alguém?
ZB – Eu não, meu papo é outro. Hoje em dia não gosto de cano. Sou mais profissa, tá ligado, só na inteligência.
Rolling Stolen – Como funciona?
ZB – Fico sacando o playboy alguns dias. Estudo o trajeto, onde mora, onde trabalha etc. Se vacilar no farol, eu encosto e pulo da garupa gritando “perdeu, perdeu, desce filho da puta”. O cara tá tão adrenado que pula rapidinho, deixando a bike até ligada. Só depois vai se ligar que nem apontei arma nenhuma! Meu companheiro fica esperto porque se alguém tentar reagir já apresenta o canhão. Mas eu mesmo nunca fiz ninguém, sou da paz, tá ligado?
Rolling Stolen – E pra onde vão estas motos?
ZB – Então, se liga, véio, já expliquei: algumas a gente fica pra zuar na comunidade, tá ligado? Pegar a mina e zuar mesmo. Outras a gente pica e leva pros manos do comércio que vendem as peças na loja ou pela internet. E outras vão pros playboy correr em Interlagos. O cara nem sabe, mas pode comprar a moto que era dele mesmo, tá ligado?
Rolling Stolen – E os equipamentos?
ZB – Tá falando das coisas dos playboy? Alguma coisa a gente fica, né! Capacete, casaco da hora, mochila, essas coisas. Macacão a gente vende na internet. Dá pra vender tudo na Internet, nesses mercados livres que tem. Tá cheio de capacete, bota, macacão, tudo. A gente deixa o playboy de cueca na estrada (risos). Ae, avisa seus amigos pra não sair de cueca furada na estrada porque pode passar vergonha na delegacia (risos). E nada de pegar a calcinha da patroa (muitos risos). Já pensou, mano, o cara vai fazer o B.O. de calcinha enfiadinha no rabo (morre de rir). Dois metros de macho e de calcinha...
Rolling Stolen – E sempre dá certo?
ZB – Não, né mano! As vez o playboy escapa. Se o cara é braço consegue vazar. Mas tem companheiro que fica puto e vai atrás até deitar o playboy. Acontece de não dar certo, como qualquer trabalho, né?
Rolling Stolen – Quando você começou, como sua família reagiu?
ZB – Que pergunta escrota! Ae, papo de família não tem aqui. Meu pai nem sei quem é. Minha mãe não reclamava porque eu trazia as coisas pra casa. Todo mundo não diz que ser mãe é podis crer no paraíso?
Rolling Stolen – Padecer!
ZB – É isso aí mesmo!
Rolling Stolen – É verdade que uma CG roubada é vendida a 200 reais?
ZB – Ae, esse papo de CG não é minha praia. Meu negócio é bike. Mas é por aí. O problema são os nóia, tá ligado? Os nóia do pó e do crack pegam qualquer coisa e vendem por qualquer grana pra comprar pedra. Esses caras tão fodendo nosso mercado (com o perdão da palavra). São eles que atiram e matam sem dó. O cara quando tá noiado não quer ouvir conversa triste, quer a moto e pronto. Se o mané começa com choro “pow, é minha moto de trabalho”, essas merdas, o nóia prega fogo mesmo! Eu sou contra a violência porque suja a imagem da catigoria, tá ligado? Mas a culpa é de quem vai lá nas bocas e compra um motor zero pra colocar na moto. Só tem comércio de peça roubada porque tem quem compra. Que nem essas merda de pó e crack. Não conseguem acabar porque se o doutorzinho acabar com o tráfico ele também fica sem o braite pra dar pras vagabundas dele, tá ligado? O playboy reclama que roubaram a motoca dele, mas depois vai nas bocas pegar cinco pinos de pó pra se conformar. É o tal circo virtuoso!
Rolling Stolen – Círculo vicioso!
ZB – É isso aí mesmo!
Rolling Stolen – E qual dica que você daria pra não ter a moto roubada?
ZB – Que mané dica, cê tá louco? Eu quero mais é que os otário percam suas motos. Não vou dar dica nenhuma. Só entrega logo a bike senão toma pipoco.
Rolling Stolen – O Sr comentou sobre um esquema mais “limpo” de trabalho, como funciona.
ZB – Ae, maluco, não vai publicar hein? Se os outros descobrem podem copiar. É o seguinte: eu visto uma beca bem bacana, tipo casaco de responsa, calça social, sapato brilhante e fico numa loja grande, no sábado, só ligado. Quando saco que alguém vai fazer cadastro colo e decoro o endereço. O vendedor é burro e fala que a bike vai chegar em tantos dias. Espero o prazo e fico pela região. O cara é trouxa e tá louco pra mostrar a bike pros amigos. Aí é só esperar o otário sair de casa pra pegar uma bike zero bala. Por isso meu apelido é Zero Bala, só pego moto zerada e sem dar nenhum tiro! Zero Bala: moto nova e sem bala, hahahaha, muito boa! Sacou o trocadinho?
Rolling Stolen – Trocadilho!
ZB – É isso aí mesmo!
Rolling Stolen – E como você se informa sobre as bikes? Qual a sua preferida?
ZB – Ah, maluco, eu vejo na internet, leio nas revistas. Eu gosto muito das marcas mais da hora, como Honda, Yamaha, Suzuki e Kawasaki. As Srad são os mais fáceis de passar pra frente. Agora tem essas novas Kawasaki Ninja. Tem até 250, pra quem quiser começar na profissão de ladrão (risos). Mas eu não tenho nenhuma preferida. É como se diz “cavalo dado não se escova os dentes”...
Rolling Stolen – Olha... não se olha...
ZB – Olha o que?
Rolling Stolen – Nada, deixa pra lá. E você já foi preso?
ZB – Já me pegaram, mas a gente tem os esquemas. Como eu só tenho 155 (n.d.r: furto, subtração, sem emprego de arma) nem puxei cana. E eu só vou na certeza de que o otário não é da poliça. Fazer bike de poliça é sujeira pesada. Aí os caras vem pra cima e detona tudo. Tem esses nóias que saem pra fazer qualquer bike, sem estudar, sem inteligência e acabam pegando um poliça. Aí ou tombam mesmo, com um pipoco no meio das idéias, ou alguém acaba dedurando e o neguinho termina furado do mesmo jeito. Quando me pegaram dei um trocadilho pros gambé...
Rolling Stolen – Trocadinho!
ZB – Porra, que saco, mano, uma hora é trocadilho, outro hora é trocadinho, qualé? Quer me zuar?
Rolling Stolen – OK, deixa pra lá. E que conselho você daria pra quem começar na profissão?
ZB – Seje inteligente. Estude o otário e comece por baixo, pegando Twister, Fazer, essa Kawasaki nova Ninja 250, ou aquela 650 Ninja carenada. Depois parte pras bike da hora mesmo. Não fica de bandeira com a motoca e se for pra uso mesmo, pra zuar na comunidade, trate de esquentar logo a cabrita. A gente tem os mano de responsa que pina chassi e faz a documentação com papel lá do Detran mesmo, tudo limpo, na maior responsa. Se for pra picar já corre pro mano e entrega logo a bike. O melhor horário é depois das cinco da tarde, porque tá maior muvuca no trânsito e não tem comando da poliça. Das cinco da tarde até as oito horas da noite é sussa. Os gambé já tão tudo indo pra casa e a cidade fica liberada! E presta atenção nessas câmeras de filmar que tem em tudo que é esquina. Não adianta pegar uma moto e depois sua cara tá lá na TV pra todo mundo ver. Se liga, e se tiver aquelas câmeras por perto espera até ficar longe!
Rolling Stolen – Ok, Sr Bala, muito obrigado pela entrevista, vou só fazer umas fotos e... ué, alguém viu a máquina fotográfica que estava aqui?
ZB – Vacilão...
* Esta obra é ficção (ah vá!) qualquer semelhança com pessoas ou fatos da vida real terá sido um tremendo azar. Aos adevogados de plantão, promotores, juízes, policiais, delegados etc que se sentirem ofendidos, saibam que é ofendido que me senti nas duas vezes que fui assaltado a mão armada. Portanto, não encham meu saco, apenas trabalhem... (Geraldo Simões)
(Esse mano Zero Bala é um poeta)
Ae, se liga no RAP que fiz pra homenagear meus bródi de Brasiília. De Brasília, Chevette, Passat, é nóis tudo. Em breve vou incluir a versão cantada, tá ligado?
Rap da Vergonha (Zero Bala)
Mais uma vez
Vou aperrear vocês
Não agüento mais
Esse país não me d paz
Ligo rádio, abro o jornal
E que tudo aqui vai mal
Navalha, sanguessuga, mensaleiros
E a polícia só prende os motoqueiros
Mas os pol¡ticos da capital federal
Viajam livres, de Porto Alegre a Natal
O ministro gordo e fanfarrão
Cai fora, foge, queima o chão
Que nem o Silas Rondó
Fugiu e livrou o fiofó
Tenho insônia, rolo na cama
Porque meu país foi doado a Gautama
Nunca vi obra mais incomum
Uma ponte liga nada a lugar nenhum
Fincada no meio do nada
Com meu dinheiro custeada
Ó meu Cristo Redentor
Olhai por nós, Senhor
Proteja-nos dessa quadrilha
Que mais parece uma matilha
De chacais sedentos de dinheiro
Seja dólar, real ou cruzeiro
Suborno, presente ou propina
Basta pagar e o político assina
Nesse religioso Brasil falsificado
Até o combustível é batizado
E quem olha por cima de tudo
um gordo sapo barbudo
Inepto, ignorante e incompetente
Mesmo assim reeleito pra presidente
Será que o culpado de tudo, de novo
É esse conceito abstrato: o povo?
Nas palavras do Marx: “massa de manobra”
Que serve pra fazer a superfaturada obra
Gente consciente que rala e trabalha
E dessa vida só leva a mortalha
Quero ver essa gente de saco cheio
Sair nas ruas e protestar sem arreio
Botar a raiva pra fora do peito
Contra presidente, ministro e prefeito
Ó meu Cristo Redentor
Olhai por nós, Senhor
Livre-nos dessa doença nacional
De roubar de forma incondicional
Tanto faz, rico, miserável ou pobre
Todo mundo fica sem o suado cobre
Seja pelo assaltante de mão leve
Ou pelo imposto que todo mundo deve
Tanta maracutaia desde os tempos do cruzeiro
Mas policia só prende, só prende: motoqueiro!
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